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Carioca em Israel: ‘Só se pode andar até 100 metros nas ruas’

Coreógrafo se mudou há três anos para Ramat Gan, conta que há, no país, uma mistura de sensações em relação à pandemia de coronavírus

Por Marcela Capobianco
Atualizado em 2 abr 2020, 21h25 - Publicado em 2 abr 2020, 21h22

“Falar sobre datas com precisão, nesse momento, é bastante difícil, já que o isolamento tem um lado que considero cruel: perdemos a percepção do tempo e dos dias. Mas, grosso modo, a vida em Israel começou a mudar há cerca de três semanas, quando a população percebeu o que estava acontecendo no mundo.

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Eu trabalho com dança folclórica judaica e esse foi um dos motivos para vir morar em Israel, há três anos. No Brasil, trabalhava com TI durante o dia e, após o expediente, era coreógrafo na Hebraica Rio e coordenador de um dos maiores festivais de dança israeli da América Latina, o Hava Netze Bemachol, que significa Vamos Dançar. Quando vim para cá, a dança deixou de ser um hobby e uma paixão e se tornou, de fato, a minha profissão. Passo – ou passava – grande parte do meu dia em uma escola de dança onde dou aulas para alunos que são, em sua maioria, crianças e pessoas da terceira idade, ou seja, o grupo que, inicialmente, se afirmava como o de maior risco diante da Covid-19. Além dessas pessoas, também ensino idosos com algum tipo de deficiência física, que dançam sentados, mas que se doam igualmente a cada passo aprendido. É um oficio que, além de muito prazeroso para mim, é de extrema importância, pois sabemos como essa interatividade ajuda os mais velhos a se sentirem ativos e como as atividades em grupo são determinantes para o bem-estar deles.

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Agora, tudo mudou. Todas as atividades estão paradas e há uma mistura de sensações no ar: a preocupação com quem depende dessas atividades para ter uma vida digna e mais ativa; o isolamento obrigatório, que sabemos ser fundamental; o desespero em ser contaminado pelo vírus e, de alguma forma, infectar outras pessoas; além da incapacidade de lidar com a possível perda de alguém que amamos e que sequer estamos conseguindo ficar por perto. També há, é claro, o medo de perder empregos. Embora aqui, em Israel, o governo vá arcar com 70% dos salários de mais de 900 mil funcionários que forem colocados em férias não remuneradas ou que sejam demitidos – desde que sigam alguns protocolos, é claro -, há o medo do amanhã, do mês seguinte, do ano que vem. Não sabemos como a economia vai reagir e como nossos idosos sairão dessa epidemia. A única certeza é de que o mundo vai mudar, e muito.

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André Schor: vida em Israel foi completamente modificada com a pandemia (André Schor/Arquivo pessoal)

Outra situação que percebo aqui, que parece ser diferente de outros locais, é em relação ao fechamento do comércio. Em Israel, tem acontecido de forma gradativa. Os locais estão fechando aos poucos, para que não seja feito um encerramento total do país de uma hora para a outra. Entretanto, o presidente Reuven Rivlin, assim como o primeiro Ministro Benjamim Netanyahu, já deixou claro que, se em algum momento for necessário, todas as portas vão se fechar. Outra percepção que tenho é de que a imensa maioria das pessoas tem cumprido as determinações de isolamento e não aglomeração. Apenas poucos estão agindo como se nada estivesse acontecendo. Mas mesmo estes não têm muito o que fazer, pois não há trens em circulação, pouco transporte público nas ruas, raríssimos taxistas trabalhando. A polícia também está de olho no ir e vir: só se pode andar até 100 metros nas ruas, apenas para comprar algo importante ou fazer algo realmente necessário.

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Mas embora esse período esteja sendo muito triste, solitário e cheio de incertezas, há um lado bom nesta pandemia: o isolamento está nos dando a oportunidade de nos tornarmos melhores em relação a nós mesmos e ao mundo. Estamos tendo, com essa reclusão, a possibilidade de reaprender muitas coisas. Já reparou como estamos mais atentos às necessidades dos outros e pensando em como podemos ajudar mais pessoas que têm menos que nós? Também temos mais tempo para ler, estudar e nos aprimorarmos no que gostamos – o que, consequentemente, nos deixará mais atualizados e críticos. E o que dizer sobre as novas formas que encontramos para nos relacionarmos? Quando eu poderia pensar, até um mês atrás, que estaria dando aulas de dança por vídeo? Ou que estaria me divertindo mesmo sem encontrar e tocar em quem amo?

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Quanto ao futuro, ainda é cedo para dizer ou imaginar qualquer situação. Se tudo correr bem, estarei no final do ano no Brasil com minha família para realizar o 50° Hava Netze Bemachol, onde vamos reunir grupos de dança israeli de todo o mundo para fazer um grande encontro judaico com a presença de várias gerações. No mais, só espero o dia em que possa voltar a fazer tudo que fazia antes, mas certamente com mais afeto, mais atento ao outro e com mais cuidado com o mundo que me cerca.

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*André Luiz Schor, que vive em Israel desde fevereiro de 2017 e anualmente participa de festivais de dança no Brasil, é coreografo e Diretor Artístico do Hava Netze Bemachol, festival de dança israeli que acontece há 50 anos na Hebraica Rio. Em depoimento a Marcela Capobianco

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