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Padeiros artesanais do Rio investem em seus próprios fermentos naturais

Conhecidos como levain, em francês, ou sourdough, em inglês, alguns são trazidos de longe e com anos de história. Outros são feitos do zero e dão trabalho

Por Carolina Barbosa
Atualizado em 13 fev 2020, 11h33 - Publicado em 5 fev 2020, 13h13

Deu no New York Times que a Tartine Bakery era a melhor padaria dos Estados Unidos. Sob o comando do americano Chad Robertson, o endereço de São Francisco virou uma espécie de meca dos pães de fermentação natural, técnica que remonta a mais de 6 000 anos atrás e voltou embalada na onda moderna da alimentação saudável. Não à toa, o livro de Robertson, Tartine Bread, virou a bíblia dos padeiros artesanais, que sorvem inspiração de lá para suas fornadas. Foi assim com o publicitário Rafa Brito Pereira, que fundou em 2016 a The Slow Bakery, em Botafogo.

A busca pelo bom fermento natural — ou levain, em francês, e ainda sourdough, em inglês — consumiu seis meses, período em que Rafa testou vários caminhos para um processo que parece tão simples: unir água a farinha e deixar a mistura sob a ação de microrganismos que a tornam fermento. Um dia, um amigo indiano radicado no Brasil lhe trouxe da Califórnia um pote com a tal massinha grudenta, que já fermentava ali havia anos. Rafa gostou e passou a usá-la em mais de quinze receitas. “A procedência da farinha é muito importante, mas é o levain que define o sabor do pão. Ele é a assinatura da padaria”, resume o fundador da Slow Bakery.

O levain que dá vida às fornadas da premiada padaria ficou tão famoso pelo gosto que imprime aos pães que muitos amigos, clientes e até chefs, como o xará Rafa Costa e Silva, do Lasai, começaram a pedir “amostra grátis”. Rafa, da Slow Bakery, calcula que aproximadamente 700 estabelecimentos, alguns até fora do Brasil, já utilizam o fermento distribuído por ele. Isso não significa que o mesmo pão será achado em todos esses lugares. O fermento natural é uma cultura viva, que vai se transformando de acordo com uma série de fatores, como a temperatura, os microrganismos presentes em cada ambiente, a quantidade de água usada para alimentá-lo e o tipo de farinha adicionada no dia a dia. Ou seja, o levain requer atenção permanente. “Eu brinco dizendo que é meu terceiro filho”, conta Marta Carvalho, à frente da Martoca Padeira, encontrada uma vez por mês na itinerante Junta Local e no Instagram.

A advogada partiu do zero e passou três meses em testes até chegar ao fermento ideal. Antes disso, viu muita receita minguar. “Os pães cresciam pouco, ficavam quase como uma panqueca”, lembra, sem saudade. “O levain precisa ser bem alimentado, estar sempre vivo, pronto para a batalha”, recomenda. Mantido em baixa temperatura, ele deixa o pão com acidez mais pronunciada. “Parece simples, mas fazer pão é uma verdadeira alquimia”, define Marta.

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Rafa Brito, da premiada The Slow Bakery: fermento
made in Califórnia (Tomás Rangel/Veja Rio)

Se bem cuidado, um mesmo fermento natural pode ser cultivado por séculos. “Quando ganhei o meu, disseram-me que ele já havia sido usado em pães servidos ao Charles de Gaulle, antes da II Guerra. Não sei se é verdade, mas cuido dele como de um Tamagotchi”, afirma Michael Leumann, sócio da Alvéole, aberta em outubro no Shopping Downtown, na Barra. Ele trouxe a matriz de leveduras da França, em um potinho guardado no nécessaire.

A descoberta da fermentação natural se deu de forma acidental, quando, no Egito antigo, uma mistura de farinha com água que descansava começou a borbulhar — e a crescer. No século XIX, porém, as leveduras selvagens foram suplantadas por fermentos industrializados, mais rápidos e práticos. Só no fim do século XX, impulsionado pela busca por alimentos mais saudáveis e naturais, o preparo artesanal voltou com força, para alegria de quem alcança todas as nuances de uma baguete. “O levain tira do trigo notas aromáticas e gustativas excepcionais”, explica Luiz Américo Camargo, autor do livro Pão Nosso. Que o pão nosso de cada dia siga evoluindo pelas mãos dos alquimistas de plantão.

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