IBGE: crescimento da depressão é realidade no Brasil
Novos dados de pesquisa nacional indicam um país cada vez mais doente
Dados recém-divulgados da Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) 2019, do IBGE, apontam conclusões que nós, profissionais de saúde mental já observamos de perto nas clínicas e consultórios: um crescimento significativo do número de casos de depressão no Brasil. Segundo a pesquisa, 16,3 milhões de pessoas com mais de 18 anos sofrem da doença, um aumento de 34,2%, de 2013 para 2019. Em alguns Estados, como Rondônia, o incremento foi de 70%. Na Paraíba já são mais de 220 mil diagnosticados. No Espírito Santo, 350 mil. São índices alarmantes.
A PNS traz outras informações interessantes: as regiões urbanas registram a maior prevalência de casos de depressão (10,7%), enquanto nas áreas rurais o índice é de 7,6%. Estados do Sul e Sudeste têm 15,2% e 11,5%, respectivamente, de adultos com diagnóstico confirmado de depressão. Em seguida aparecem Centro-Oeste (10,4%), Nordeste (6,9%) e Norte (5%). Quando analisados os dados por sexo, as mulheres são as que mais sofrem de depressão: 14,7%, frente a 5,1% dos homens. Os idosos entre 60 e 64 anos representam a faixa etária com maior incidência: 13,2%.
Ano passado a OMS já havia apontado o Brasil como o país com mais deprimidos da América Latina, com 5,8% da população padecendo da doença, frente aos 4,4% nos demais países do continente. A situação é grave se considerarmos o descaso do atendimento em saúde pública com as doenças mentais no Brasil, que recebem destinação pífia do orçamento da pasta. Os novos números apresentados agora pela PNS são ainda mais preocupantes se levarmos em conta que a pesquisa é anterior à pandemia, quando casos de depressão e ansiedade cresceram significativamente.
No entanto, a Organização Mundial de Saúde (OMS) está atenta não apenas à ascensão dos transtornos mentais no Brasil e no mundo, mas também quanto à crônica defasagem no atendimento aos pacientes. Pesquisa realizada em 130 países, entre junho e agosto deste ano, mostrou que a pandemia atingiu ou interrompeu o atendimento em saúde mental em até 93% dos países, 67% confirmou o impacto no atendimento psicoterapêutico e mais de 60% reportou interrupção nos serviços de atendimento à saúde mental à população mais vulnerável, incluindo crianças e adolescentes (72%) e idosos (70%). A OMS destacou o problema crônico de falta de investimento nas nações na área de saúde mental: antes da pandemia, os países gastavam menos de 2% do orçamento da saúde no tratamento das doenças mentais.
Para nós, que estamos no dia a dia do atendimento aos pacientes, fica a expectativa que os novos dados apresentados pelo IBGE sirvam de guia para a formulação de políticas públicas eficientes na prevenção e tratamento dos transtornos mentais. Qualquer atitude oposta à isso significaria uma população cada vez mais doente, fragilizada e vulnerável.
Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp; professora da Escola Médica de Pós-Graduação da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.