Apetite sem fim para novidades à mesa
Apostando alto na gastronomia carioca, o restaurateur Marcelo Torres, dono do grupo BestFork, acaba de inaugurar um megaprojeto — e já pensa em mais
Fundado em 1959 na cobertura do edifício Seagram, o Four Seasons foi durante décadas um dos restaurantes mais icônicos de Nova York. Pois o que era ponto de encontro de executivos de Wall Street, diretores de Hollywood e celebridades de todos os calibres acabou sucumbindo, e o endereço encerrou as atividades em 2019, após sessenta glamourosos anos. Em seu último dia de funcionamento, lá estava Marcelo Torres, viajante incansável e comensal assíduo em estreladas mesas mundo afora. Todas essas referências, em alguma medida, entram em cena em seu dia a dia carioca, uma rotina embalada pelo comando do grupo BestFork. Dono de oito casas no Rio, onde atende 100 000 pessoas por mês, o restaurateur revela confiança inabalável no setor, que se expande na cidade. Sem investidores na retaguarda, ele assumiu uma área de 3 500 metros quadrados no New York City Center, na Barra, para dar forma ao projeto Nolita Roastery, um “parque de diversões gastronômico”, como define, que recebeu 25 milhões de reais de investimento (dos quais reservou uma parte para a construção de uma piscina de mármore semelhante à que ficava entre as mesas do Four Seasons). “Em todos os restaurantes que inauguro, as pessoas esperam algo que as surpreenda”, diz.
De hashi em punho na mesa do japonês Yusha, no shopping Village Mall, para o qual acaba de escalar o chef Eduardo Nakahara, sumidade nacional do sushi, Marcelo não esconde a ambição em doses elevadas. “Vamos buscar uma estrela Michelin”, garante, antes de dirigir ao shopping vizinho para justamente mostrar seu mega Nolita. O novo estabelecimento tem como ponto de partida o café, onde tubos serpenteiam sobre a cabeça dos clientes, levando grãos da estação de torrefação às moendas nos balcões, tendo ao fundo uma estufa com pés verdadeiros de café. Entre as cinco operações ali, há ainda a confeitaria farta em doces extravagantes, uma fábrica de chocolates e o restaurante de 400 lugares com a tal piscina e cardápio que mescla sabores das casas do grupo — de cortes nobres aos pescados fresquíssimos. Ele sorveu inspiração no Starbucks Reserve Roastery de Milão, outra Disney da boa comida, dando uma “tropicalização” à ideia e uma adaptada ao bairro, onde ficam cinco de seus endereços. “Eu entendi a Barra. É um público mais alegre, solto e divertido do que o da Zona Sul”, avalia.
Afeito à criação de experiências gastronômicas, o empresário exibe no bar do Nolita Oven, também no Village Mall, um belo maquinário turco de torrefação ao lado de uma rara Victoria Arduino Venus — número 12 de 100 unidades da máquina de expresso produzidas no mundo (a primeira pertenceu ao papa Bento XVI). Além dos peixes sempre expostos no gelo nos salões do Giuseppe Grill, Giuseppe Mar e Yusha — muitos, aliás, pescados por ele, que sai a bordo do próprio barco todas às quintas —, abriu a fábrica de massas como atração do Giuseppe Square, no BarraShopping. Nas paredes de seus restaurantes, gosta de espalhar sua coleção de quadros que retratam touros, assinados por nomes como Rubens Gerchman, Daniel Senise, Anna Bella Geiger, Ziraldo e Chico Caruso. Apesar de acabar por fazer de seus espaços áreas instagramáveis, com cenários propícios à postagem, Marcelo não se interessa pela efervescência virtual. “Sou low tech, leio muito, cultivo uma obsessão por organização e processos e adoro quebra-cabeças”, conta.
Na trajetória desse carioca formado em direito, as peças começaram a se encaixar mesmo nos anos 1990, quando ainda trabalhava na Multiplan, onde ficou por mais de uma década. Foi aí que resolveu estrear na gastronomia, inaugurando o primeiro restaurante. Na paisagem do Centro, o Giuseppe logo se firmou com sua ampla adega de mármore, gravuras florentinas do século XVIII arrematadas na Sotheby’s e produtos italianos em profusão, tudo arejado por um jardim ao fundo, árvores e luz natural. Seu então chefe na Multiplan, José Isaac Peres, dono dos shoppings onde seus empreendimentos hoje se espalham, lhe deu um bom empurrão. “Ele me ensinou a ficar confortável em momentos de desconforto”, resume. E foi assim quando o Giuseppe de Ipanema fechou as portas, depois de breve estrada. “Quando me perguntavam o porquê, eu respondia: ‘Porque você não foi’ ”, lembra. O Laguiole, que marcou época no Museu de Arte Moderna (MAM) e de onde emergiram talentos como Pedro de Artagão, Ricardo Lapeyre e Elia Schramm, também apagou as luzes na pandemia, mantendo-se como bufê. “Era uma Ferrari com pilotos jovens. Vou reabrir e fazer um reality para ver quem assume o volante”, brinca o inquieto restaurateur, que planeja a reabertura para 2025. Preparem os talheres.