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Por Lelo Forti, mixologista
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O jeitinho brasileiro que não tem mais graça

A famosa “carteirada” está mais na moda do que nunca. O “poder” dos gabinetes institucionais invade nosso cotidiano

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Atualizado em 29 out 2020, 14h43 - Publicado em 29 out 2020, 14h41

Todo mundo é Vip. Esse termo, Very Important Person, talvez seja a palavra da língua inglesa mais usada e a mais conhecida do brasileiro ultimamente. Nunca se usou tanto, nunca se exigiu tanto, tempos bem atuais. Não sei o que acontece, mas muita gente acredita ser melhor, diferenciado, ou realmente importante ao ponto de furar uma simples fila do banheiro, ou passar na frente na fila de espera de uma mesa de bar. Isso está corriqueiro e salve se quem ousar afrontar ou não permitir este tipo de desrespeito. Atitudes assim estão se espalhando pela noitada (de dia também), no Brasil. Com a explosão das mídias sociais, está bem corriqueiro encontrar vídeos barraqueiros de “celebridades” fazendo algum escândalo porque recebeu um simples “não pode” de algum gerente ou garçom de bar.

Recentemente tivemos um caso bem típico desta situação desrespeitosa e muito constrangedora. Um importante e conhecido empresário paulista, armou uma confusão tremenda num restaurante chique paulistano. O motivo: queria entrar após o horário de fechamento da casa imposto pelas normas sanitárias vigentes na cidade. Quando soube que o restaurante estava fechando em poucos minutos, ele usou do seu “poder” para ofender funcionários, humilhar trabalhadores que estão ali, cumprindo ordens e respeitando a Lei. Por incrível que possa parecer, este tipo de atitudes é bem comum no nosso dia a dia.

Esse jeitinho tipicamente brasileiro tem incomodado profissionais que querem fazer um trabalho de qualidade, hospitaleiro e diferenciado. Essa questão me fez refletir sobre uma frase que existe no comércio desde que me conheço por gente: “o cliente sempre tem razão”. Eu cresci ouvindo essa frase bíblica do comércio desde os tempos que assistia meu pai cortando carne no pequeno açougue da família. Cuidar do cliente e fazer todas as suas vontades para que tivesse a melhor experiência possível e pudesse retornar. Algo que, nos anos 80, conhecíamos como “nosso freguês”. “Tratar o cliente com carinho e gerar a melhor experiência é fundamental, mas, o cliente, precisa fazer sua parte para que o todo aconteça, ou seja, cumprir normas e regras vigentes no estabelecimento escolhido. Simples assim.

O termo “freguês”, já em desuso, deu espaço para uma nova clientela, com novos hábitos e muitas manias. O Rio de Janeiro é Vip. Não sei o que acontece, mas explicar que você não pode atender, ou que não é mais possível satisfazer algum desejo ou vontade, é, muitas vezes, o mesmo que ofender o cliente. Para muitos, pedir que use máscaras sanitárias na fila do banheiro em tempos de pandemia parece ofensivo. Muitas pessoas simplesmente ignoram regras simples. Parece que todos os protocolos e cuidados estão de alguma maneira, deixando as pessoas loucas e enfurecidas. São poucos os esclarecidos. Nenhum comerciante quer deixar de atender ou vender, ainda mais num ano que seu negócio ficou fechado por meses e que, sofre com a reabertura desajustada e desorganizada do poder publico. Acontece que, para ser ter um local bacana, cheio de carinho e hospitalidade, a equipe chegou horas antes da abertura, preparou tudo, montou, limpou e deixou tudo organizado. Com a chegada do Covid, os protocolos ganharam ainda mais espaço para cuidados sanitários, tudo para que, os clientes possam ser atendidos com conforto, carinho e segurança.

Antes de ser um profissional de bar, também sou um cliente no dia a dia do comércio local. Quando saio para algum local, a primeira coisa que observo é: as regras impostas no ambiente. Vamos para um exemplo bem prático e cotidiano: não posso levar meus cachorros a um restaurante com somente espaço interno, e que, bem provavelmente, não aceite Pets. O desavisado da situação fui eu, que não me certifiquei que o local de escolha não aceitava animais. A “culpa” não é do segurança, da hostess, do maitrê ou do gerente. Simplesmente existe uma norma na casa que proíbe animais e eu não posso querer dar um “jeitinho”, afinal, além de errado, vou desrespeitar quem estiver presente no local. Isso não me dá o direito de ofender, ameaçar ou querer briga com os funcionários que ali estão para me atender, certo? Infelizmente, este tipo de situação acontece com uma freqüência que você se surpreenderia. Lembra aquele desembargador santista que ofendeu um guarda municipal na praia? Que deu uma “carteirada” e um telefonema para o “superior” do agente que estava ali, cumprindo seu papel e a lei? Pois é, esse tipo de situação acontece corriqueiramente em bares e restaurantes pela cidade. Quanto mais instrução, mais se acredita que pode mudar as regras, normalmente, com atitudes bem mal educadas.  Situações assim são bem desagradáveis e desnecessárias, e frases como: “Eu e vou processar você. Vou processar esta espelunca”, são bem comuns, pra não citar outras mais ofensivas e desagradáveis.

Não defendo o mau atendimento, o garçom mal humorado ou desatento, eles existem e aos montes. A reflexão é a conduta, muitas vezes autoritária de pessoas que usam de seu “poder” profissional para obter alguma vantagem, que normalmente é infringir regras. Você pode não concordar, mas ameaçar um profissional que esta servindo você, simplesmente porque ele não satisfez algum capricho seu é, no mínimo, constrangedor, autoritário e muito desrespeitoso. Se você reservou mesa para duas pessoas às 20 horas e obedecer à regra do horário, pode ter certeza que seu cantinho estará te esperando. Agora, chegar atrasado e ainda acompanhando de mais pessoas será constrangedor para você e os profissionais da casa estarão numa saia justa, afinal, você descumpriu o combinado. É evidente que imprevistos acontecem. Você está preso no transito, ou um casal de amigos se animou e resolveu acompanhar vocês. Tudo dentro da normalidade do nosso dia a dia, porem, basta você não esquecer e avisar ao seu bar ou restaurante essas mudanças. Isso mostra que você está preocupado com o conforto de seus convidados e respeita o local que você escolheu para se divertir.

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Temos que abandonar hábitos como: “vamos lá que conheço o gerente e ele dá um jeito”. Imagina se todos os clientes que um gerente ou barman conhecem resolvem aparecer, sem avisar? Eles que se virem pra acomodar todo mundo né, afinal eu “venho sempre aqui”, “sou amigo do dono”, práticas bem comuns também.

Um exemplo bem prático e oportuno. Faça uma reunião em sua casa. Convide dois casais de amigos. Marque o encontro para umas 21 horas. Acredito que você trabalhara horas antes pra deixar tudo arrumado para que seus convidados tenham uma noite incrível, assim como acontece diariamente em um bar, já descrito acima. Tudo arrumado, bebida no gelo, comida pronta, som agradável, ambiente iluminado. Resta agora os convidados chegarem. Tudo pronto.

Seus primeiros convidados chegam 21h30min, e, sem avisar, trouxeram uma amiga que acabara de chegar de viagem. É constrangedor né? Mas tudo bem, você vai receber ela de braços abertos, afinal é amiga do casal que você gosta. Lá pelas 22 horas o outro casal aparece, desta vez, acompanhado de dois amigos que apareceram sem avisar.

O que você sente nesta situação é o mesmo que todo profissional do bar, com o agravante que temos que, de alguma forma resolver a situação, mesmo quando a solução for, por vezes, não  atender pois a casa já está lotada e a fila de espera passa de um hora.

Lembra daquele vídeo que viralizou nas redes sociais de uma mulher embriagada que, se dizendo magistrada, disparou muitas pérolas e um quiosque aqui da zona sul carioca? “vou mandar fechar esta espelunca”. Vocês não sabem com quem vocês mexeram”. Esses e tantos outros absurdos infelizmente acontecem. Na maioria das vezes, o estopim de uma discussão acontece porque o cliente quis algo como: não respeitar fila de espera (muito comum). Colocar o dobro de pessoas ou mais num espaço para um casal (corriqueiro), furar fila do banheiro unissex porque é mulher (pasmem, acontece), reservar mesa para às vinte horas e chegar um hora depois e querer a mesa ainda disponível.

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Mesa pra dois

Se você perceber, reservas de mesas estão cada vez mais raras em bares. Alguns restaurantes tradicionais ainda trabalham com esse serviço, principalmente em datas comemorativas como Dia das Mães e Dia dos Namorados. Reservas de mesas em bares estão em extinção. A nova ordem pós pandemia tornou-se um hábito já bem europeu por aqui. Saia de casa cedo. Tendência em outros países, já se observa essa situação lentamente por aqui. Sair cedo para se divertir tem vários benefícios. Os bares estão com espaço melhor para te receber e você terá uma experiência ainda mais agradável, uma vez que a noite está apenas começando. Depois das 22 horas, o movimento é muito intenso e isso impacta diretamente no atendimento e no serviço. A quem curta curtir a noite com intensidade, sem perder aquele dia ensolarado de praia. Situação bem comum pro carioca. Já são muitos os adeptos do sair cedo, curtir, beber bons drinks, papear, azarar e na manhã seguinte, desfrutar de um mergulho no mar, dar aquela suada na academia, correr pela orla, subir alguma trilha, sem ressaca e, principalmente, sem remorsos.

   A quem diga também que, um bar, no começo da noite não tem o clima ideal e que o agito é necessário para que a noitada aconteça. É uma situação verdadeira, dependendo do que você esteja buscando, afinal, sentar no balcão de um bar e conversar despretensiosamente com o bartender, e descobrir um universo de sabores é algo muito prazeroso, e quanto mais cedo isso acontecer, mais atenção o profissional de bar vai te dar e mais experiências você ira viver. Se nunca experimentou isso, te convido a vivenciar este momento. Com certeza você terá outra visão de um bar depois disso. Você poderá se surpreender com os conhecimentos que vai adquirir nesse encontro. É bem simples: escolha um bar, chegue cedo e sente no balcão. Pode ser sozinho, acompanhado ou esperando alguém. Garanto a você que a experiência vivida será muito mais acolhedora, simpática e hospitaleira do que se você sentasse naquela mesa no fundo do salão. Experimente. Vai mudar sua vida e sua forma de vivenciar os prazeres (des)conhecidos de um bar, mas lembre se: quando tocar o sino anunciando a saideira, não hesite, seu tempo de permanência e sua experiência estão acabado. Amanha é outro dia. Não insista.

Cheers.

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