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Alunos do Ensino Médio avaliam prejuízo no aprendizado às vésperas do Enem

Rede pública retoma atividades 100% presenciais prometendo aulas de reforço, apoio psicológico e busca ativa para conter evasão escolar

Por Ianka Menezes*
10 nov 2021, 17h53
Foto mostra estudantes do ensino médio com uniforme branco em uma sala de aula com um professor à frente de um quadro branco
Ensino Médio: estudantes relatam desmotivação e insegurança na volta às salas de aula (Danielle Paiva/Arquivo pessoal)
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Dificuldades no aprendizado, desmotivação e medo de não dar conta do conteúdo perdido são as principais queixas de alunos do Ensino Médio, que retornaram às atividades 100% presenciais em 25 de outubro. Após idas e vindas no formato das aulas (por apostilas, depois remotas e híbridas), o governo do estado determinou o retorno ao presencial de todos os 725 000 alunos da rede pública. Ainda se adaptando na volta às aulas, estudantes de diferentes escolas afirmam que se sentem confusos e perdidos, às vésperas do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem).

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Desanimada em relação aos estudos, Danielle Paiva, 18 anos, aluna do 3º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Pedro Álvares Cabral, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense, relata ter crises de choro e ansiedade, por medo de não aprender as matérias e de não ter capacidade de realizar o sonho de cursar medicina. Ela desistiu de fazer o Enem este ano, que será nos dias 21 e 28 de novembro: “Eu decidi adiar o sonho de cursar medicina porque estou com desempenho ruim em português, que é a base da redação”.

As dificuldades de aprendizagem e emocionais se estendem aos colegas de classe. Danielle afirma que houve uma queda no desempenho de toda a turma durante a pandemia. “É evidente uma mudança comportamental na turma. As pessoas estão mais tímidas e fechadas, tenho colegas que desenvolveram transtornos psicológicos. O que tem nos ajudado são os professores, que estão sempre nos aconselhando. Alguns não vão passar provas, apenas trabalhos”, declara.

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Foto mostra fila de estudantes de camisa branca no pátio de uma escola, pintado nas cores azul claro e escuro
Pátio do Colégio Estadual Pedro Álvares Cabral, em São João de Meriti, na Baixada Fluminense (Danielle Paiva/Arquivo pessoal)

Por sua vez, Armando Ryan, 18, aluno do 1º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Visconde de Cairu, também em São João de Meriti, afirma que não consegue entender física e química. O aluno faz parte dos 6 milhões de estudantes que estão fora da série prevista, de acordo com dados do Unicef, e tem medo de ser reprovado novamente: “Eu tenho me esforçado, mas estudar durante a pandemia foi um desafio. Eu não tinha computador, internet e nem memória no celular para baixar o aplicativo do governo”.

O que o motiva a não abandonar os estudos é o sonho de ser um militar de sucesso. No entanto, Armando diz que constantemente tem a sensação de perder tempo, devido às dificuldades de compreensão agravadas pela pandemia: “O que me preocupa é a possibilidade de chegar nas provas que vou fazer para ser militar e não saber responder nada. Isso é desmotivador”.

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Já o estudante Miguel Waltz, 17, aluno do 3º ano do Ensino Médio do Colégio Estadual Antônio Prado Júnior, que fica na Praça da Bandeira, Zona Norte, saiu do colégio particular e ingressou no ensino público em 2021, depois que os pais ficaram desempregados na pandemia. O estudante teve dificuldade em se comunicar com a escola para tirar dúvidas durante o ensino híbrido e remoto. Outra queixa foi a falta de suporte para utilizar o aplicativo da Secretaria de Educação:

 “As aulas por aplicativo foram muito estressantes, pois nem todos os professores sabiam utilizar a plataforma e muitos passavam tarefas fora do horário das aulas. Eu ficava muito tenso pensando nas entregas que tinha que fazer enquanto estudava”, conta o estudante, que está otimista com o retorno às atividades presenciais. “Espero que as coisas melhorem com o retorno às aulas presenciais, mas acho que a volta poderia ter sido mais organizada. Nos avisaram com uma semana de antecedência, os professores estão reclamando porque tiveram que adaptar as aulas rapidamente”, completa.

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O professor de História Erick Carvalho, da Escola Estadual Evangelina, de Duque de Caxias, ressalta que essas transições, atreladas às consequências da Covid – morte de familiares, parentes desempregados, mudança de escolas –, tornaram o ambiente escolar desafiador, pois os professores precisam facilitar o aprendizado e estimular os alunos a não desistir dos estudos. Outro ponto é o ajuste frequente nos critérios de avaliação e no planejamento educacional, documento feito para ser seguido em longo prazo. 

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“Essas mudanças não consideraram as pessoas que são diretamente afetadas: alunos e professores. O governo não consulta os professores, não leva em consideração todo o planejamento de aula que fazemos”, afirma.

Nesse cenário, cerca de 80 000 alunos frequentaram menos de 75% das aulas presenciais ou remotas, de acordo a Secretaria de Estado de Educação. Outro levantamento, do Datafolha, aponta que a taxa de evasão escolar saltou de 4,8% em 2019 para 10,8% em 2020. 

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Em entrevista à reportagem, o secretário estadual de Educação, Alexandre Valle, afirmou que as escolas realizam um processo de busca ativa para recuperar esses jovens, e que serão oferecidas aulas de reforço de modo presencial, remoto e por meio de emissoras de TV e de rádio, para tentar a nivelar o aprendizado:

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“As diretoras e outros funcionários buscam esses alunos por meio de telefonemas, e-mails, redes sociais e indo até suas casas. Estamos em negociação com TV Educação, TV Bandeirantes, TV Alerj e com a Rádio Roquette-Pinto. Essas aulas, de 45 minutos, também contarão com dicas para o Enem”.

Ao ser questionado sobre a distribuição dos 750 000 chips de internet que deveriam ser entregues aos alunos em 2020, o secretário disse não saber o que aconteceu, pois só assumiu a secretaria em junho. Vale lembrar que o acesso à internet a professores e alunos carentes de escolas públicas é um direito social com base na lei nº 14.172.

Outra promessa da secretaria foi a de laboratórios de informática em colégios públicos, os quais deveriam ter sido inaugurados em outubro de 2020, mas até hoje não foram implementados. Valle disse que está sendo realizado um estudo para seguir com a iniciativa. Sobre as dificuldades emocionais e psicológicas relatadas pelos estudantes, prometeu “um diagnóstico para identificar esses alunos e elaborar ações para atendê-los”.

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Foto mostra corredor de uma escola com as cores azuis com vários estudantes e um totem de alcool em gél
Juntos e misturados: escola é importante espaço de socialização, trocas, convivência e respeito (Danielle Paiva/Arquivo pessoal)

Professora do Departamento de Educação da PUC-Rio especializada em psicologia educacional, a psicóloga Maria Elisa Almeida Bacal explica que o Ensino Médio é uma fase na qual o indivíduo está construindo valores abstratos, e a escola se apresenta como um espaço de socialização, de trocas, de convivência e respeito ao outro. 

“Neste momento, é preciso ir além dessa pressão de passar tudo que foi perdido e pensar em como atender esses alunos e entender como eles estão se sentindo. A escola, mais do que nunca, precisa ser um ambiente no qual os alunos se sintam pertencentes, seguros e ouvidos. É importante reforçar o ambiente escolar como um lugar de segurança que motiva os alunos a acreditarem em seu potencial e capacidade”, diz a professora.

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* Ianka Menezes, estudante de jornalismo da PUC-Rio, sob supervisão de professores da universidade e revisão final de Veja Rio.

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