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Roxy Dinner Show nasce com a ambição de se tornar destino turístico no Rio

Celebrando a diversidade brasileira ao estilo Broadway, a nova empreitada de Alexandre Accioly se soma à já agitada agenda cultural da cidade

Por Marcela Capobianco
20 set 2024, 06h02
Hora do show: 50 bailarinos vão retratar as cinco regiões brasileiras no musical Aquele Abraço
Hora do show: 50 bailarinos e cantores vão retratar as cinco regiões brasileiras no musical Aquele Abraço (Daniela Dacorso/Divulgação)
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O ano era 1999, e Alexandre Accioly presenciou uma cena que entrou para a história da MPB. No palco do novo Credicard Hall, em São Paulo, João Gilberto (1931-2019) acomodava-se em seu inseparável banquinho, ao lado de Caetano Veloso. Eis que de repente, abraçado ao violão, o mestre da bossa nova se pôs a tecer duras críticas à qualidade do som da casa. “Horroroso”, disse. Executado o clássico O Pato, ele ainda emendou: “O pato aqui sou eu”. Fez-se um climão do qual até hoje Accioly se lembra muito bem. Tanto que, ao escolher os arquitetos responsáveis pela transformação do antigo Cine Roxy na casa de espetáculos Roxy Dinner Show, em Copacabana, deixou claro logo de saída: queria uma acústica que passasse sem ressalvas pelo implacável crivo de João Gilberto.

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E assim Ana Lúcia Jucá e Sérgio Dias, responsáveis pelo projeto da casa que celebrará o Brasil com um jantar musical ao estilo Broadway, trouxeram o que havia de mais moderno na praça — a técnica box in box, na qual uma segunda estrutura de aço, preenchida com diversos materiais isolantes, foi montada rente às paredes originais do edifício histórico onde ficava o maior cinema do Brasil, fechado em 2021. “Na prática, é como um estúdio gigante, que impede a entrada de ruídos de fora e mantém um som límpido dentro da sala”, explica Paulo Bodas, o gestor da obra.

arte Roxy

O empreendimento que brota na paisagem carioca, previsto para abrir as portas em 17 de outubro, mescla o novo e o velho com a ambição de entrar na rota turística como um destino incontornável, a poucos passos das areias de Copacabana. A reforma na construção inaugurada como cinema em 1938 foi fazendo ressurgir belas estruturas, como a cúpula art déco, por décadas escondida sobre um teto falso, que se impõe com seus 36 metros de diâmetro.

A obra, que envolveu mais de 200 operários e levou quase dois anos, transcorreu cercada de cuidados, já que o edifício abriga uma série de elementos tombados pelo patrimônio da cidade — caso do letreiro da fachada e das escadarias de mármore. “Descascamos todas as paredes até chegar à cor inicial e restauramos pedaços do piso original de mármore, enquanto imprevistos iam surgindo no meio do caminho”, conta Accioly, que viu o investimento de 45 milhões de reais saltar para 65 milhões no último ano. É aposta alta. “O Roxy Dinner Show não vai apenas resgatar o glamour de Copacabana, mas ressuscitar o bairro inteiro, que hoje só tem botequim, assalto e pessoas dormindo nas ruas”, acredita o empresário, sócio da casa de shows Qualistage, na Barra, da rede de academias Bodytech e agora também à frente da revitalização do Jardim de Alah, que deverá ganhar áreas de lazer, restaurantes e lojas em 2025.

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Moulin Rouge: espetáculo do cabaré parisiense serviu de inspiração para a produção brasileira
Moulin Rouge: espetáculo do cabaré parisiense serviu de inspiração para a produção brasileira (Matt Crockett/Divulgação)

O roteiro da programação no antigo Cine Roxy já está bem alinhavado. Com capacidade para 700 espectadores sentados e ingressos a partir de 580 reais, os jantares vão da entrada à sobremesa, seguidos da apresentação do musical Aquele Abraço, que percorre uma trilha com MPB, bossa nova, samba e ritmos regionais.

Os pratos terão a assinatura do premiado Danilo Parah, que comanda o Rudä e o Mäska, em Ipanema — e o plano é que, a cada estação, um badalado cozinheiro desenvolva o cardápio. Um gigantesco painel de LED esconde o backstage, erguido do zero e com altura equivalente a um prédio de cinco andares. De lá, saem bailarinos e cantores que estrelam o espetáculo. No telão, imagens de pontos turísticos do país exaltando suas tradições.

Um time de peso está por trás do show — a direção artística é de Abel Gomes, que bolou a cerimônia de abertura e encerramento da Olimpíada do Rio e as últimas festas de réveillon de Copacabana; Pretinho da Serrinha se encarrega da direção musical; e Priscilla Mota e Rodrigo Negri, famosos pela atuação no Carnaval carioca, lideram as coreografias. “Foram quatro dias de audições com centenas de artistas. Selecionamos os cinquenta mais versáteis, que cantam e dançam”, conta Abel. “O espetáculo traz 55 músicas, e cada número é como se fosse uma comissão de frente de escola de samba.”

Nos bastidores: Alexandre Accioly (à dir.) investiu 65 milhões de reais, e Abel Gomes assina a direção artística
Nos bastidores: Alexandre Accioly (à dir.) investiu 65 milhões de reais, e Abel Gomes assina a direção artística (Daniela Dacorso/Divulgação)

A novidade na rota turística do Rio reaviva um tipo de entretenimento que marcou época na cidade nas décadas de 1970 e 1980, sorvendo inspiração das icônicas performances da Plataforma, do Scala e do Oba-Oba, do qual Accioly foi sócio. Adequa-se, porém, a estes mais avançados tempos, em que a exibição gratuita da nudez feminina não é tolerada. “Quem vem ao Rio e quer conhecer mais da nossa cultura e história não tem opção para se divertir à noite. Agora vai passar a ter”, diz Accio­ly, que teve como referência para o projeto o gênero de espetáculo oferecido pelo Cirque du Soleil, em Las Vegas, e visto nos famosos cabarés parisienses Moulin Rouge e Crazy Horse.

Quando começou a ventilar a notícia de que a casa seria inaugurada no bairro, nem todo mundo aprovou — uma ala dos moradores torceu o nariz, temendo a perda de um patrimônio que fez parte da vida de muita gente. “Não tenho dúvida de que vão mudar de ideia”, aposta Accioly, que convenceu a família Severiano Ribeiro, dona do imóvel, a alugar o prédio por vinte anos em vez de transformá-lo em uma loja de artigos esportivos. A previsão é que o retorno do parrudo investimento venha em quatro, cinco anos, contando que o espaço também poderá ser usado para shows, congressos e eventos corporativos durante o dia.

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Antes e depois: a plateia na construção original do cinema, fundado em 1938 (acima), e no projeto do Roxy Dinner Show
Antes e depois: a plateia na construção original do cinema, fundado em 1938 (acima), e no projeto do Roxy Dinner Show (imagens/Reprodução)

A inauguração do novo Roxy se dá justamente num momento em que os ventos cariocas sopram a favor. O maior afluxo de turistas estrangeiros vem aliado a uma efervescência na praia da cultura, embalada por um calendário lotado de shows, peças e eventos, como o G20, em novembro, quando líderes do mundo inteiro desembarcarão no Rio.

Nesta maravilha de cenário, importantes espaços estão sendo reabilitados, como o Teatro Carlos Gomes, já na ativa após ampla reforma, e mais de vinte endereços culturais da prefeitura ganharam banho de loja, incluindo o Teatro Ziembinski, na Tijuca, o Cine Santa Teresa e o Museu da História e da Cultura Afro-Brasileira, na Gamboa. “A revitalização valoriza os artistas e o público. Eles se sentem acolhidos e bem recebidos em locais limpos e confortáveis”, ressalta o secretário municipal de Cultura, Marcelo Calero, cuja pasta investiu mais de 75 milhões de reais em 2024. “Nossa rede se tornou robusta e capilarizada, permitindo o incentivo à produção artística em todas as regiões da cidade”, acrescenta. Ainda para este ano, aguarda-se a reabertura de um modernizado Teatro João Caetano, mantido pela Funarj, que está com sistema de refrigeração tinindo, além de contar com placas de energia solar e estrutura elétrica recauchutada.

Boa fase: mais de vinte equipamentos culturais, como o Teatro Carlos Gomes, voltaram à ativa
Boa fase: mais de vinte equipamentos culturais, como o Teatro Carlos Gomes, voltaram à ativa (Ana Branco/Agência O Globo)

A cultura se entrelaça com a história do Rio. O ano de 1808, quando aqui aportaram dom João VI, Carlota Joaquina e toda a corte, que fugiam então das tropas napoleônicas, acabou sendo decisivo. O Teatro São João (depois rebatizado de João Caetano) foi inaugurado em 1813 — não por acaso, uma cópia fidedigna do São Carlos, de Lisboa.

Passados mais de dois séculos, mesmo depois da transferência da capital para Brasília e das crises econômicas que se abateram sobre o Rio, a forte tradição cultural segue viva. “O Rio é a imagem que o Brasil projeta para o mundo, por isso todos os grandes eventos acontecem aqui”, lembra Christian Lynch, professor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Uerj e pesquisador da Fundação Casa de Rui Barbosa. “Países como Holanda, África do Sul e Chile têm mais de uma capital. O Rio, renegado politicamente desde a década de 1960, deveria ser reconhecido oficialmente como o centro cultural do país”, aproveita para sugerir.

Plateias cheias: público vem lotando festivais e teatros, como o Riachuelo (acima)
Plateias cheias: público vem lotando festivais e teatros, como o Riachuelo (acima) (Fabrício Meliande/Divulgação; Bel Gandolfow/Divulgação)

O mais recente Mapeamento da Indústria Criativa realizado pela Firjan mostra que, em 2020, o Rio foi o estado em que o setor cultural mais contribuiu para o PIB (4,6%), seguido de São Paulo (4,4%) e Distrito Federal (3%). “É um estado diverso, que sempre atraiu pessoas de todos os cantos do país, criando um ambiente propício para a produção artística. Mas se esse mercado não for apoiado por políticas públicas, não se sustenta”, alerta Luciana Guilherme, professora do mestrado em economia criativa e inovação da ESPM.

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Grandes eventos que recentemente receberam um empurrão das esferas pública e privada reforçam a ideia de que este é um tipo de investimento capaz de desencadear um profícuo ciclo virtuoso. O Carnaval deste ano movimentou 5 bilhões de reais, e o show de Madonna, que juntou 1,6 milhão de pessoas na Praia de Copacabana, em maio, trouxe quase 300 milhões de reais à cidade. “As associações de bares e restaurantes relataram que esse foi o melhor fim de semana do ano em termos de venda. A logística é complexa, mas recompensadora”, avalia Luiz Guilherme Niemeyer, sócio da Bonus Track, produtora do celebrado espetáculo da diva pop.

Há muitos sinais de que o povo quer arte. E vem tendo. De janeiro a setembro, com o Rock in Rio, a cidade não passou um mês sem um grande festival de música. A cena teatral também anda tão vigorosa que é possível encontrar peças em cartaz em qualquer dia da semana. Na Grande Sala da Cidade das Artes, A Noviça Rebelde, dirigida por Charles Möeller e Claudio Botelho, ganhou sessões duplas aos sábados e domingos. “No cenário pós-pandemia, notei uma mudança de paradigma: agora são as marcas que nos procuram para apoiar os projetos”, conta Luiz Calainho, diretor de marketing e negócios da Aventura, responsável pelo musical.

“O patrocínio vai muito além de uma ação de marketing — é uma forma de mostrar respeito à cidade, devolvendo o que ela nos oferece diariamente”, diz Olivia Richardson, head de marketing da Prio, empresa de óleo e gás que, só em 2023, destinou 30 milhões de reais a projetos. Vários exemplos mundo afora enfatizam o quão arte e cultura são potentes não apenas para entreter e emocionar, mas, às vezes, também para derrubar indicadores de violência e elevar o nível da educação. Que se abram cada vez mais cortinas.

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Cenas dos próximos capítulos

Um ambicioso plano pretende transformar o Parque Olímpico no maior complexo de entretenimento da América Latina

Imagine
(./Divulgação)

Com inauguração prevista para 2028, um projeto já traçado e batizado de Imagine pretende fazer do Parque Olímpico o maior complexo de entretenimento da América Latina. É boa notícia: um estudo conduzido pela Fundação Getulio Vargas prevê impacto econômico de 9,2 bilhões de reais para a cidade no primeiro ano de funcionamento.

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Concebido por Roberto Medina, criador do Rock in Rio, em parceria com a Genial Investimentos, o espaço será dividido em dez áreas, destinadas a abrigar grandes eventos, parque de diversões, anfiteatro, resort, uma torre de escritórios e um museu olímpico. Para chegar lá, foi pensado um esquema de mobilidade integrado que, além do metrô e do BRT, inclui um teleférico com cinco estações e transporte aquaviário. Também existe a ideia de levar o VLT para a Barra. Agora é ficar na torcida para que saia tudo do papel.

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