Caminho do Ouro: a preciosa rota dos queijos premiados de Valença
Produtores da cidade situada na maior bacia leiteira do Rio acumulam mais de 130 medalhas em concursos e investem num polo de produção marcado pela diversidade

O tema da festa de 12 anos era fazenda, seguindo a tradição rural da família, e o aniversariante Fabrício Vieira havia pedido uma vaca de presente. Como o pai achou que era um animal muito grande para a criança ordenhar, a solução foi dar uma cabra ao rebento. Nascia ali a paixão que, décadas mais tarde, se transformaria no primeiro queijo do Rio a ganhar medalha de ouro no Mondial du Fromage, na França, em 2023. Entre os doze premiados havia dez franceses, um suíço e o tal caprinus do lago, no estilo pecorino, vindo de uma pequena cidade chamada Valença, a pouco mais de duas horas da capital fluminense. Nos últimos três anos quem se aventura pelo município do Vale do Café – até o fim do século XIX, a área foi dominada pelo grão – tropeça em queijos laureados. Os produtores decidiram se unir e colocar de pé um roteiro turístico em que o laticínio é a estrela. Situada na maior bacia leiteira do Rio, a cidade tem mais de vinte queijarias e 138 medalhas em concursos, com preciosidades como os oito queijos de leite cru que conquistaram, em julho, o Selo Arte, chancela de qualidade artesanal que libera a venda interestadual. “Não há em Valença um estilo próprio histórico e ligado ao terroir, como em outras regiões, mas receitas variadas e contemporâneas, ampliando a cultura do produto nacional”, avalia o especialista Tiago Dardeau, autor do recém-lançado livro Queijarias Artesanais do Brasil.

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O cenário diversificado inclui ainda vacas e búfalas, criadas, respectivamente, por marcas premiadas como a Du’Vale, de Rodrigo do Vale, e a Latte Buono, do casal Eduardo e Mônica Lo Buono. A maior parte dos produtores é formada por profissionais liberais – Fabrício, do Capril do Lago, e Eduardo são dentistas, por exemplo -, que se apaixonaram e começaram a estudar o ofício. “Gosto de búfalos desde criança. Comprei a primeira em Minas e decidi mudar para Valença ao me encantar com o terroir da região e a qualidade absurda dos produtos”, diz o sócio da Latte Buono, que produz de brie a gruyère e até gelatos com o leite dos animais negros de chifres retorcidos. Ele costuma promover eventos gastronômicos com a chef Flávia Quaresma. A área, formada por vales verdes entre os rios Paraíba do Sul e Preto, dispõe de água mineral abundante e pastos privilegiados, enquanto o microclima favorece o surgimento de bactérias propiônicas em afloramentos rochosos. São esses microrganismos que criam as olhaduras, ou furinhos, nos queijos. Há também um mofo natural e benéfico que aparece como parte das condições naturais, agregando sabores especiais.

Na festa queijeira, porém, há parênteses adocicados. A edição de 2024 do Mundial do Queijo, em São Paulo, trouxe um fato inédito: um doce de leite deixou a categoria própria e ficou entre os cinco melhores produtos lácteos, entre 2 000 competidores de vinte países. Os jurados internacionais o agraciaram com a medalha Super Ouro, considerando-o o melhor do planeta, desbancando argentinos e mineiros. Feita em tacho de cobre, e mexida com colher de madeira por cinco horas, no fogão a lenha, a maravilha da Du’Vale pode ser degustada na Rota do Queijo, que percorre no mesmo dia três fazendas, entre cinco participantes (Capril do Lago, DuíVale, Latte Buono, Vale do Vento, e Marquês de Valença). A experiência chega a reunir oitenta pessoas, e a próxima edição acontece no dia 30 de agosto – as reservas podem ser feitas por WhatsApp: (24) 99883-1085. O tour completo vai da ordenha à fabricação, com degustações de inúmeros laticínios e um almoço em fogão de lenha capitaneado por Rodrigo do Vale, que toca seu berrante e anuncia delícias como porco na lata, galinha caipira com quiabo, feijoada e uma concorrida broa de fubá. Um passeio que, definitivamente, vale a viagem