Corações partidos
Não gosto de histórias com finais tristes, portanto não sou grande fã de Romeu e Julieta. Nunca fui de rompantes românticos. Declaração de amor, pra mim, pode vir na forma de um simples “eu te amo” num engarrafamento ou nos detalhes do dia a dia, como acordar e ver que o ser amado botou pasta […]
Não gosto de histórias com finais tristes, portanto não sou grande fã de Romeu e Julieta. Nunca fui de rompantes românticos. Declaração de amor, pra mim, pode vir na forma de um simples “eu te amo” num engarrafamento ou nos detalhes do dia a dia, como acordar e ver que o ser amado botou pasta na sua escova de dentes antes de sair. Também não me sinto nada bem quando caio numa armadilha de turistas. Turismo, romantismo (ou falta de)… O que tem a ver uma coisa com a outra? É o que explico no texto a seguir.
Por conta da minha participação na feira do livro de Bolonha aproveitei para dar umas voltas em solo italiano e dividi meu périplo nas redes sociais. Mas parti corações ao postar no Instagram uma foto da Casa de Julieta, em Verona, abarrotada de turistas enlouquecidos que se espremiam para registrar a sacada da residência e a estátua da moça, cujos seios passam por tantas mãos há tantos anos que já estão desgastados, coitados (não, não é tendência na Itália bolinar estátuas, diz a lenda que para encontrar um grande amor basta dar uma esfregadinha básica nos peitos da Julieta).
Na legenda deixei claro o meu espanto com um cenário tão falso, criado para receber turistas nos anos 20. Isso mesmo! Mais de 300 anos depois de Shakespeare escrever a obra alguém teve a ideia (ou a sacada, como queira) de criar uma sacada (hehe, não sou romântica mas sou boba) e seu entorno para atrair fãs de Romeu e Julieta à cidade onde se passa o amor proibido. A estátua veio depois, só na década de 60. Ou seja, é Disney total, só que em Verona.
E nada contra a Disney! Pelo contrário, adoro! Mas imagine ir para a terra do Mickey à cata de museus medievais, afrescos seculares e igrejas majestosas. Simplesmente não combina.
Mesmo sabendo que princesas, patos e ratos famosos que circulam pelo reino criado por Walt Disney nunca existiram, viro a pessoa mais feliz do mundo quando estou lá. Achei que todo mundo soubesse que Julieta era um personagem de ficção e que sua casa em Verona foi idealizada para arrebanhar turistas e vender souvenirs. Mas não. Recebi uma chuva de lamentos e fiquei realmente triste por decepcionar tanta gente. Venho aqui, por meio deste humilde blog, pedir desculpas. E me explicar.
Encantadora, Verona não pode se resumir a um cenário criado para satisfazer a indústria do turismo. Sua arquitetura, suas ruas, suas praças, suas cores, sua arena monumental e o Castelvecchio merecem muito mais atenção. Dar uma passadinha na casa da Julieta pode fazer parte do roteiro, claro, mas não deve, na minha humilde opinião, ser o motivo principal da viagem a uma das cidades mais lindas em que pus os pés.
Uma pessoa mal-criada escreveu no Instagram que se não gosto de turistas que eu vá para a Malásia. Fofa. Não tenho nada contra turismo (nem contra a Malásia!), só não gosto de armadilhas para turistas. Mas já joguei moedas em fontes e chafarizes, subi a Notre Dame (e me arrependo muitíssimo, é claustrofóbico e a vista de Paris é bem mais bonita da escadaria de Montmartre), esfreguei o nariz do javali em Florença para ter sorte e tirei foto com a estátua do Fernando Pessoa em Lisboa, entre outras bobagens deliciosas que fazemos quando viajamos.
E já que estou falando de viagem, deixo uma dica que arrebatou meus olhos e não faz parte dos principais roteiros de turismo: Castellina in Chianti, uma pérola cravada no caminho entre Florença e Siena. Escondida e belíssima.