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Patricia Lins e Silva

Por Patrícia Lins e Silva, pedagoga Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Educação
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Inteligência artificial, a escola e o futuro das novas gerações    

Ao invés de proibir, é melhor trazer o ChatGPT (ou qualquer outra Inteligência Artificial) para a sala de aula para que os alunos aprimorem seu uso

Por Patricia Lins e Silva Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
1 jun 2023, 14h55
Pessoa digita no computador com ferramenta ChatGPT aberta.
Capaz de criar conteúdos em segundos, nova ferramenta é desafio para as escolas. (Shutterstock/Reprodução)
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Se essa tecnologia der errado, pode dar muito errado, queremos ser sinceros sobre isso; queremos trabalhar com o governo para evitar que isso aconteça”, disse Sam Altman, CEO da OpenAI, empresa que criou o ChatGPT, num depoimento ao congresso norte-americano em maio de 2023.

O ChatGPT (Chat Generative Pre-trained Transformer), para os que não lembram, é uma plataforma de IA (Inteligência Artificial), que funciona com LLM (modelo de linguagem avançado) e é treinado para responder perguntas, gerar textos e interagir com humanos, como num bate-papo, o que impressiona porque é capaz de processar e compreender informações complexas.

Retomo o assunto, dada a popularização e repercussão do último modelo e a corrida que provocou entre as empresas de tecnologia para desenvolverem IA. O mundo observa com certa apreensão o que acontece e se preocupa com as consequências imprevisíveis de seu uso para a humanidade. Um exemplo concreto e recente da interferência da tecnologia nas nossas vidas foram as eleições mundo afora, com distribuição em massa de informações, verdadeiras ou não, e o uso de algoritmos para mirar o alvo das comunicações.

Quando as mídias sociais não existiam, a dispersão geográfica bastava para abrandar o poder potencial de grupos agressivos. Mas a chegada delas facilitou a divulgação de inverdades e pensamentos extremistas, o que causa impacto nas instituições democráticas. As redes sociais têm substituído o representante político, num abalo à democracia. A Inteligência Artificial é uma ferramenta poderosa, que pode acelerar ainda mais a divulgação de desinformação. É fundamental cuidar que, em nossas sociedades, tecnologia e democracia andem juntas.

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Existe a preocupação com uma regulamentação do uso da IA porque, além dos benefícios de curto prazo, traz ameaça de danos graves, alguns já evidentes, como a automação de inúmeras atividades humanas, o que atinge, por exemplo, motoristas de caminhão, advogados, codificadores e pessoas que dependem de domínio intelectual para sua subsistência. A produtividade será aumentada às custas de empregos, o que vai exigir reciclagem de trabalhadores para exercerem novas tarefas e ocupações.

As empresas tecnológicas desejam o prosseguimento irrestrito da pesquisa com IA, e pressionam as instituições porque os interesses econômicos envolvidos são imensos, assim como os sociais, políticos e geopolíticos.

É um cenário que implica pensar em mudança na preparação das novas gerações, para que possam viver no mundo incerto que se estrutura à nossa volta. Logo, a escola terá que mudar, tateando um caminho desconhecido.

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Proibir o uso da tecnologia não resolve, já que o ChatGPT e todas as IAs que seguem no seu rastro são uma realidade que não vai desaparecer. Os alunos precisam ser formados para o mundo em metamorfose, uma tarefa nada fácil porque ninguém tem o dom de ver o futuro e todos temos uma imagem de escola gravada em nossas mentes de maneira profunda, como um arquétipo, o que torna difícil fazer mudanças.

Para começar, um esforço bem interessante pode ser debater com toda a comunidade escolar – professores, pais e alunos – sobre o mundo em que vivem e refletir sobre o mundo em que desejam viver. Que formação será necessária para as novas gerações e não para as que já passaram.  Não haverá resposta imediata, mas será um momento para a comunidade escolar pensar, repensar, imaginar, estudar, aprender muita coisa e aceitar a possibilidade de mudar. Pode-se começar por discutir sobre o papel básico da escola hoje, que deve ser incentivar a capacidade de pensar do aluno para solucionar problemas da vida real junto com outras pessoas. Os  conteúdos estão à disposição na internet e podem ser acessados sempre que necessário. O trabalho de todos será a construção de conhecimento coletivo, de repertório cognitivo, de reflexão junto com os outros, ouvir opiniões, trocar ideias para expandir as capacidades do pensamento.

Ao invés de proibir o ChatGPT na escola (ou qualquer outra Inteligência Artificial (IA)), é aconselhável trazê-lo para a sala de aula e engajar os alunos para que se aprimorem no seu uso. O professor apresenta o ChatGPT aos alunos, mostra o que é e como funciona, suas capacidades e limitações. Indica exemplos de interações com a máquina e discute os pontos fortes e as falhas do modelo.

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Os projetos de pesquisa dos alunos em sala de aula podem contar com o  ChatGPT para obter informações, fazer perguntas e explorar tópicos. Ao avaliar as respostas que recebem, os alunos exercitam o pensamento crítico.

O ChatGPT pode ser um colaborador nas discussões de sala de aula. O professor propõe perguntas abertas ou temas controversos e os alunos conversam com o modelo, desenvolvendo o pensamento crítico, a criatividade e habilidades de comunicação.

Questões abertas para discussão podem ser  ‘qual o impacto das redes sociais na sociedade atual’, ‘como lidar com a desigualdade que retrata nossa época’, ‘qual a importância da preservação ambiental’, ‘como a tecnologia afeta nossa comunicação’, ‘como as “fake news” afetam a democracia’, ‘qual a importância da diversidade e inclusão em ambientes de trabalho e de aprendizagem’, ‘como a inteligência artificial pode ser usada para resolver problemas globais’ etc Os temas polêmicos podem ser ‘a eficácia, a ética e os direitos humanos relacionados à pena de morte’, ‘causas, consequências e ações necessárias para enfrentar as mudanças climáticas’, ‘liberdade de expressão, censura e responsabilidade da mídia na divulgação de informações’, ‘argumentos a favor e contra o casamento entre pessoas do mesmo sexo’, ‘problemas éticos dos testes em animais na indústria e na pesquisa científica’, ‘riscos, benefícios e impactos ambientais da energia nuclear como fonte de energia’, ‘influência da mídia e da sociedade na formação dos padrões de beleza e suas consequências para a autoimagem’ etc.

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Trabalhando a partir desses exemplos os alunos formam  opiniões embasadas nas discussões. As opiniões divergentes devem ser respeitadas, assegurando-se um ambiente de debate construtivo.

O ChatGPT pode funcionar também como auxiliar para o desenvolvimento de ideias, para obter sugestões e receber feedback sobre trabalhos escritos, mas sempre se enfatizando a importância de usar o próprio julgamento e não depender exclusivamente das sugestões do modelo.

Na aprendizagem de  idiomas, os alunos praticam suas habilidades linguísticas em conversas com o ChatGPT.

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Discutir questões éticas associadas à IA e ao ChatGPT é provocador e instigante. Pensar sobre a privacidade dos dados, os vieses algorítmicos e o impacto da IA na sociedade incentiva o pensamento crítico e desenvolve uma compreensão abrangente daquilo com o que se está interagindo.

Comparar respostas do ChatGPT com outras fontes de informação ajuda a desenvolver habilidades de pensamento e a avaliar a confiabilidade das respostas do modelo. Os alunos precisam perceber a importância da tecnologia como ferramenta de aprendizagem e exploração e não como única fonte de informação.

Enquanto os alunos usam o ChatGPT, o professor está sempre disponível para eles, orientando-os para formularem perguntas adequadas, interpretarem respostas e avaliarem a credibilidade das informações.

O ChatGPT pode ser uma ferramenta de aprimoramento da aprendizagem e de incentivo ao pensamento crítico, mas não substitui o professor, que é sempre fundamental para criar um ambiente de sala de aula produtivo e enriquecedor. A orientação, a expertise e o auxílio nas discussões significativas são competência do professor.  

Uma boa providência da comunidade escolar pode ser a capacitação dos professores e alunos numa perspectiva de pensamento filosófico. A Filosofia é uma área do saber que acolhe as dúvidas e as incertezas, que nunca faltaram ao mundo, mas que agora, com o turbilhão da tecnologia digital, parecem nos mergulhar numa inquietante realidade fortuita.

Num ambiente transformado pela IA, será necessária a formação dos alunos para enfrentar desafios e assegurar a democracia. Isso requer bastante tempo. E tempo, nem mesmo o GPT-4 pode fazer por nós. É preciso começar logo porque o gênio está fora da garrafa e, como bem sabemos, não voltará a ela.

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