Avatar do usuário logado
Usuário
OLÁ, Usuário
Ícone de fechar alerta de notificações
Avatar do usuário logado
Usuário

Usuário

email@usuario.com.br
Imagem Blog

Manoel Carlos

Por Blog Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Blog do novelista Manoel Carlos

Xeretando

Gosto de conhecer escritores e artistas através do que deixaram de sua vida em diários, livros de memórias, cartas, confissões, entrevistas, meditações etc. É uma maneira de me meter na vida deles, saber o que faziam, do que se queixavam e o que planejavam realizar. Saber também como foram vividos os dias mais felizes de […]

Por Daniela Pessoa Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
14 out 2013, 15h43 • Atualizado em 25 fev 2017, 18h55
  • Gosto de conhecer escritores e artistas através do que deixaram de sua vida em diários, livros de memórias, cartas, confissões, entrevistas, meditações etc. É uma maneira de me meter na vida deles, saber o que faziam, do que se queixavam e o que planejavam realizar.

    Saber também como foram vividos os dias mais felizes de sua vida e — mais do que os felizes — os infelizes.

    Por onde viajaram, que países conheceram, com que pessoas se relacionaram, a quem admiraram e odiaram.

    Que escolaridade tiveram, que formação cultural conseguiram alcançar. E também — talvez até principalmente — que experiências humanas amealharam com as tragédias e as desilusões amorosas que os atingiram. Como enfrentaram os fracassos e — mais do que estes — os sucessos. E as perdas: se ficaram apenas chamuscados ou arderam incessantemente diante da morte da mãe, de um grande amor, de um amigo, de um filho.

    Continua após a publicidade

    Sempre aprendemos alguma coisa com o que eles nos oferecem, fazendo a doação de sua vida para que a nossa vida se mire em seus exemplos. Para o bem ou para o mal. Neste momento estou lendo os Diários de Lúcio Cardoso, um dos mais sensíveis escritores brasileiros, pouco conhecido, mas com um dado biográfico humano e irresistível: o de ter sido o grande amor impossível de
    Clarice Lispector. Homossexual assumido, deixou-se amar, impossibilitado de corresponder. Deu-se ao amor de Clarice, esteve à disposição da ternura e do interesse da grande escritora, ainda que indiferente ao amor físico.

    É a bisbilhotice, é o leitor xeretando nesses depoimentos na primeira pessoa uma referência picante, uma confissão, um vício jamais revelado.

    Na minha juventude líamos os diários sempre que eram publicados. Era uma maneira, então, de nos conformarmos com a nossa pequena estatura cultural, sabendo como os grandes artistas haviam sido pequenos também em determinados momentos da vida, nem sempre rica e fértil como imaginávamos ingenuamente.

    Continua após a publicidade

    — Meu Deus, Kafka inseguro, descrente do seu valor!

    Que maravilha!

    Festejávamos assim, um tanto debochados, os vacilos das celebridades antes da consagração. Aqueles a quem sonhávamos suceder um dia — quem sabe? —, com a pretensão da juventude.

    Continua após a publicidade

    E para os de pouca fé sempre se podia recorrer a Santo Agostinho e São Francisco de Assis em suas Memórias e Confissões, em que se declaram miseravelmente imperfeitos.

    E é isso que nos aproxima deles dois: a imperfeição.

    E é também por essa razão que Deus é o personagem principal de todos os diários. Como nestas linhas de Lúcio Cardoso:

    Continua após a publicidade

    “Não acredito que Deus vigie constantemente nossas pequenas misérias — mas há instantes, fases de luta, em que sentimos perfeitamente que é a nós que seu olhar acompanha”.

    Em 17 de março de 1952, com 40 anos, escreveu:

    “Um diário é apenas uma crônica de gemidos”.

    Continua após a publicidade

    E nessa mesma nota ele nos aquece com uma chama de esperança: “De novembro para cá ainda não realizei as grandes coisas que sonhei… mas elas serão realizadas, tenho certeza”.

    Lúcio morreu em 1968, com 56 anos.

    Publicidade

    Essa é uma matéria fechada para assinantes.
    Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

    Domine o fato. Confie na fonte.
    15 marcas que você confia. Uma assinatura que vale por todas
    Impressa + Digital no App
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital no App

    Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

    Assinando Veja você recebe semanalmente Veja Rio* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
    *Assinantes da cidade do RJ

    A partir de R$ 29,90/mês