Marie Bèndelac: empresas familiares — o balanço que importa é o diálogo
As empresas familiares são a base da economia brasileira e representam 90% no país e geram 75% dos empregos

Recentemente acompanhei de perto a rotina de um casal de empresários e seus dois filhos, todos sócios do mesmo negócio. A empresa crescia, os números iam bem, mas dentro da sala de reunião o cenário era outro: o pai insistia em impor decisões de forma autoritária, um dos filhos reagia mal, a mãe tentava apaziguar sem sucesso e acabava se sentindo frustrada. O resultado era desgaste para todos, travas nas decisões e um ambiente carregado de tensão.
Situações assim não são exceção. Já vi irmãos brigarem por caminhos opostos na gestão enquanto os pais, omissos, se calavam para evitar mais atritos. O silêncio, no entanto, nunca resolveu nada: o conflito permanecia, contaminava a equipe e prejudicava até a relação familiar.
Esse é um padrão comum nas empresas familiares: a mistura de laços afetivos com responsabilidades profissionais. Sem comunicação madura e construtiva, conversas viram disputas, diferenças de visão se transformam em muros, e o negócio que sustenta a família acaba fragilizado.
As empresas familiares são a base da economia brasileira. Segundo o IBGE, representam 90% das empresas do país e geram 75% dos empregos. Mas o Banco Mundial traz um dado preocupante: apenas 30% chegam à terceira geração.
Ou seja, se por um lado são protagonistas da economia, por outro enfrentam sérios desafios de longevidade. E o maior deles raramente aparece nos relatórios financeiros: lidar com as relações humanas na gestão.
Entre os dilemas mais comuns estão:
Sucessão: quando e como passar o bastão sem perder valor.
Gestão intergeracional: pais conservadores x filhos inovadores.
Mistura de papéis: ser mãe/pai e, ao mesmo tempo, sócio/sócia.
Conflitos entre irmãos: rivalidades pessoais que transbordam para decisões estratégicas.
Comunicação difícil: conversas que viram acusações, silêncios que viram muros.
Esses pontos mostram que o futuro das empresas familiares não depende apenas de balanços e resultados, mas da capacidade de dialogar, construir consensos e profissionalizar a comunicação.
Nos casos em que atuei, ajudei empresários a se posicionarem de forma estratégica, sem desgaste, e a desarmar conflitos que pareciam intermináveis. O que funcionou? A aplicação do Método CONECTA — um passo a passo que desenvolvi a partir de mais de 10 anos de experiência em Comunicação Não Violenta com líderes.
Na prática:
Curiosidade – entrar na conversa para compreender antes de querer ser compreendido.
Ouvir – praticar escuta ativa, dando espaço real para o outro se expressar.
Não Julgar – suspender rótulos (“você é teimoso”, “você nunca entende”) e focar nos fatos.
Empatizar – reconhecer sentimentos e necessidades por trás das falas.
Checar – confirmar se o que você entendeu é realmente o que o outro quis dizer.
Transição – escolher o momento certo para expor sua visão, evitando confronto.
Assertividade – se posicionar com firmeza e respeito, sem agressividade nem submissão.
Esse método, aplicado em reuniões e negociações, permitiu que casais, pais e filhos, e até irmãos passassem a ouvir mais, reagir menos e chegar a consensos com muito mais frequência.
Profissionalizar a gestão de uma empresa familiar não significa abrir mão da essência da família, mas criar espaços claros para que decisões sejam tomadas com responsabilidade — sem que os laços afetivos sejam corroídos por disputas mal resolvidas.
No fim das contas, números saudáveis mantêm a empresa viva no curto prazo. Mas é o diálogo — transparente, empático e assertivo — que garante a continuidade para as próximas gerações.
Minha pergunta para você, líder: se sua empresa é familiar, que conversas estão sendo evitadas hoje? Pode ser justamente nesse silêncio que mora o maior risco — e também a maior oportunidade de crescimento.
Boa semana e bons negócios!
