Gastronomia: retrospectiva de Bruno Calixto
2024 foi ano de… Os chefs que deram um show na temporada e as tendências

Em 2025, algumas tendências gastronômicas devem rezar por cartilhas já conhecidas, como sustentabilidade (uso de ingredientes locais e sazonais) e produtos com menos conservantes e experiências mais autênticas. Outras darão passos mais largos rumo ao futuro: zero desperdício; veganismo & vegetarianismo e dark kitchens (as casas sem salão). A Inteligência Artificial terá lugar à mesa; as embalagens compostáveis e as bebidas com práticas regenerativas também. Com base nessa régua, o blog mapeou 10 chefs/casas (tem muito mais…) que vieram ou despontaram na cena carioca em 2024 e que, ao que se espera, estão aptos a virar o ano com louvor.

10 – Igor Renovato e Raí Mendes, a dupla de bartenders do SuruBar, na Lapa, CEP da coquetelaria popular brasileira e também dos ótimos petiscos, abriu o Suru Bafo em frente, colado ao Reffetorio, onde servem comida no bafo, com curadoria da chef Roberta Antonia. Um show sentar ali naquele largo, cheirando a boemia e pedir cupim, ossobuco, copa lombo e pratos, por exemplo, sobrecoxa marinada na cerveja com arroz, feijão e batata frita (R$ 45). Se você é daqueles que se deslocam em busca de moela, naquela cozinha ela é marinada na cachaça (R$ 27). Melhor ainda é estar à mesa com o expert em fotos, Alexandre Macieira, pai da Duda e da Malu. Além da companheira de boas garfadas e goles, Cláudia Silva. Atenção para a cena de revitalização desse entorno dos Arcos com a Glória, cheia de jovens moderninhos com copinhos de batida nas mãos (R$ 8). #ReviverCentro

9 – A reinauguração do Roxy como casa de espetáculos e jantares trouxe Danilo Parah ainda mais para o centro da mesa carioca — um craque, melhor chef da sua geração, antenado a questões de produto, inovação e sobretudo ancestralidade. Parah consegue cozinhar numa geringonça alemã, atento ao que lhe ensinava sua avó, mãe… O pai do Jorginho, chef por trás de Rudä, Izar e Mäska (todos em Ipanema), atual curador dos pratos servidos com brasilidade no novo destino turístico no Rio, onde manda para a mesa arroz de moqueca, a galinha caipira mineira com taioba e quiabo com creme de queijo da Canastra. Longa vida ao Roxy Dinner Show.

8 – A Casa 201, do chef João Paulo Frankenfeld, seguiu contando vantagens e acumulando premiações em 24. Mais do que isso, o endereço no Jardim Botânico serve de laboratório de Frankenfeld, onde ele prepara de “um tudo”: manteiga maître d’hotel, rillette, tartelette, bourguignon, brut, consommé, foie gras, brunoise, beurre blanc, boursin, jus, brie, Cointreau, entremet, petit-fours, sablé, financier, macaron… — ao modo do chef e ao estilo francês clássico, como se vê em tudo que atravessa o salão diminuto ao sabor de vinhos nacionais (ainda bem!).

7 – João Diamante, enfim, chegou ao lugar que o merece: a Pequena África, “onde o Rio é mais baiano”: o Dois de Fevereiro, de comida ancestral. E dá-lhe bobós, caldeiradas, baiões, salgas da casa!… Galinha com quiabo; canjiquinha cremosa com queijo e vinagrete de munguzá; feijuca vermelha no cafofo; carne-seca desfiada, nata, linguiça, toucinho, queijo coalho e ovo estalado. E os petiscos? Acarajé, manjubinha, casquinha de sardinha, coxinha de bobó… Para cada um desses itens, você pode desfrutar da promo: dois chopes por R$15. “Um café moído na hora, vindo diretamente de Varre-Sai, é a chave que fecha tudo em ouro”, sugere Diamante, o novo e eterno Canto da Sereia carioca.

6 – Maíra Freire, do Lasai e, a partir deste ano, também do Libô, bar de vinhos que abriu com a igualmente craque Roberta Ciasca. Fica no casarão onde Roberta mantém seu Brota, em Botafogo, com Renata Gebara, um timaço de lideranças femininas, agora encorpado pelo brilho de Maíra, a sommelier nacional do Michelin. Pode imaginar a delícia que é se jogar nos braços dela ao sabor da cozinha da Roberta? Dona de uma carta de vinhos contemporânea e “facin de beber”, que traz por exemplo o Freghino, um vinho biodinâmico, produzido na Umbria, Itália. Artesanal de A a Z, feito com leveduras indígenas, fermentado de forma espontânea e com baixíssima intervenção. Ou então o “Aqui Estamos Todos Locos”, um vinho natural produzido na região de Mendoza, todo trabalhado nos aromas de frutas vermelhas e notas sutis de anis. Já foi?

5 – Locale, a pizzaria do arquiteto Guilardo Rocha, que, de tanto bater ponto na Junta Local, pegou expertise e abriu um negócio de ouro em Copa e que já deu frutos: uma casa “irmã” em Botafogo. Ali existe a alma da verdadeira e autêntica alma napolitana de se fazer pizza: produtos e insumos locais. Tudo é nosso, desde a farinha do Paraná (de boa qualidade) até os recheios: queijos, embutidos e tomates. Viva o tomate brasileiro! Sim, nós temos. A carta de bebidas é outra celebração da casa: sodas naturais, cervejas artesanais cariocas e vinhos nacionais — nas garrafinhas de 375ml (R$ 39). Molto bene!!!

4 – Satyricon. Novidade? Nenhuma! Mas vamos combinar, diferencia-se em tudo, mas tudo nos quesitos qualidade e serviço. “Não perde para nenhuma casa especializada em italiano mediterrâneo do mundo”, me garantiu uma amiga que entende do riscado. O certo é que o restaurante de Ipanema favorito das celebridades internacionais não inventa e ainda tira onda de pioneiro. Outro no mesmo degrau é o Giuseppe Grill, no Leblon, que voltou a ganhar prêmios e ser comentado nas colunas de colegas, como Luciana Fróes. Tô com a Lu!

3 – Luanna Malheiros, a chef titular do Térèze, quando foi nomeada para o cargo e entrou no mapa da gastronomia de hotéis bacanas do Rio, não era tão conhecida como ficou este ano. Ela participou da abertura do restaurante como sub de Damien Montecer. Passados 16 anos e agora essa, Luanna ocupa o posto mais alto naquela cozinha, com foco em produtos locais. Entenda por isso, uma estranha no ninho onde circulam tantos franceses na liderança, mas que foi exatamente isso a chave da virada. A chegada da gerente Sophie Barbara, de Marseille, movimentou as peças e empoderou não só Luanna como também a chef confeiteira Danielle (Reny) de Lavor. Timaço feminino, lindo de ver — e de saborear também. Para encorajar a subida, alguns exemplos: creme de milho defumado com queijo azul da serra das Antas e ovo pochê (R$ 62) e pescado (namorado) au poivre (R$ 130) regado no conhaque com aspargos.

2 – O chef maranhense Rubens Gonçalo (guarde bem este nome) é responsável pelo menu do Skylab e do Wave By Othon, no Rio Othon Palace, em Copacabana, um “retrofit” na marca que veio não faz muitos meses e promete. Era para ele ter feito Medicina, mas escolheu a cozinha. Passou pelo Sheraton e, hoje no posto atual, apresenta uma nova leitura da culinária do seu estado. Arroz de cuxá (um molho feito com vinagreira, gergelim, camarão seco, farinha de mandioca seca e pimenta-de-cheiro), sobremesa de chocolate com bacuri, feijão de Santarém. Ingredientes regionais e técnicas contemporâneas, o sucesso do menu degustação de dez etapas do chef (R$ 395 por pessoa). No quiosque em frente, uma salva de palmas para croquete de língua com vinagrete de pimenta de cheiro (R$ 42) e os bolinhos de pirarucu com molho de manga (R$ 49). Ah, nada de ir embora sem experimentar o crème brûlée de cupuaçu (R$ 32).

1 – Ísis Rangel, do Sabores de Gabriela: passa o tempo e continua no topo. E vou te contar cinco motivos:
– ainda são da maior chef baiana do Rio as receitas servidas no seu restaurante do Jardim Botânico, que arrancam suspiros e até buzinaço na rua. Fazem um barulho lindo saindo da casa;
– Ísis cozinhou para a elite intelectual baiana na Academia Brasileira de Letras, quando ela chegou ao Rio e inaugurou o saudoso Siri Mole, em Copa. Jorge Amado, Dias Gomes e toda uma sorte de nomes para os quais ela servia a moqueca de siri mole de “Dona Flor e Seus Dois Maridos”;
– os Rolling Stones no Rio, em 1995. Corta. Teve comida da Ísis no camarim, onde foi montada uma bancada só de pratos baianos. Eles amaram tanto que o bufê precisou ser reposto inúmeras vezes. Foram três viagens com comida a bordo para os ingleses;
– ela é uma das (senão a) única chef que vai ao restaurante, senta à porta, recebe os clientes, bate ponto. Não se cansa. Agora, ainda inventou de promover noites regadas a samba na calçada (tudo baixinho, até 22h), com roda de samba de mulheres, uma lindeza só. Única. Alegria que falta naquele ponto da cidade onde moram a tranquilidade, o suvaco do Cristo, o amor.
Volta e meia envolvida em outros projetos, Ísis sempre volta para o Gabriela, onde não admite “camarão congelado” nem energia que não bate: “Os orixás nunca me deixaram na mão.”
