Crônica, por Eduardo Affonso: O que é que a crônica tem?
Se a crônica fosse um bicho, seria um camaleão...
Se a crônica fosse um bicho, seria um camaleão. Ou um gato, daqueles que não só têm sete vidas como podem estar, simultaneamente, vivos e/ou mortos, dependendo da caixa em que forem metidos. Um polvo, talvez, com aquela flexibilidade alienígena. Uma água-viva, e sua leveza e capacidade de regeneração.
É um ser mutante, a crônica, essa metamorfose ambulante. Uma nuvem – cirrus, nas altitudes de uma Clarice; cumulonimbus, nas tempestades de um Lobo Antunes: você olha, é uma gaivota; olha de novo, pode ser um elefante.
Tem um pé no conto, outro na poesia – e, sendo também centopeia, passeia por ensaio, crítica, fábula, parábola, artigo de opinião. Vira textão, haicai, lista, diálogo, roteiro, bula, manual, fluxo de consciência, carta, prece, receita, confissão.
É ironia na pena de Machado e Fradique, lirismo na máquina de escrever de Cecília e Braga, sarcasmo no computador de Ubaldo, Tutty e Simão. É música em Ruy Castro e Nelson Motta, cinema em Sérgio Augusto, paladar em Apicius e Cristiana Beltrão.
É humor com Ivan Lessa, Verissimo, Eliachar, Novaes, Stanislaw, Duvivier, Millôr. É dor, com todos os seus vícios, nos copos e cigarros de Antonio Maria, Caio Fernando – e, claro, de Vinicius.
É o sublime em Hilst e Mendes Campos; o cotidiano em Sabino, Aversa, Mario e Antonio Prata, Drummond, Tezza e Zanatta. A política em Barreto, Cony e Jabor; e em Otto, Elsie, Martha, Xexéu, Young, Colasanti e Affonso Romano, encontra o que há de mais moderno, mais eterno e mais que humano.
É a vida das ruas em Joaquim e João do Rio; a vida das almas em Lya, Lygia e Bandeira. O mundo inteiro em Cora, Batalha, Ivan Ângelo, Zuenir, Danuza; o subúrbio em Aldir e Gabeh. A vida com magia em Agualusa. Em Nelson, Barreto, Plínio, Scliar, a vida como ela é.
O romântico-urbano de Claudia Tajes, o olhar apurado de Fernanda, Carlinhos e Rachel de Queiroz: há uma crônica e um cronista para cada gosto, para cada momento, para cada um de nós.
Mas também são cronistas Noel, Chico, Belchior, Lupicínio, Adoniran. Cronistas Rita Lee, Ângela Ro-Ro, Calcanhotto, Marília Mendonça, Dolores Duran.
E o que é a crônica, afinal? Qual é o seu jenecequá, seu it, seu borogodó?
Não é a ave, mas o voo. Não é a mexerica, mas seu cheiro insistindo em morar na ponta dos dedos. Não é o medo do escuro, mas o ronronar do monstro embaixo da cama, depois que lhe emprestamos o travesseiro.
É o mundo visto por uma lente macro, não por uma grande angular. É a raspa do mingau de maisena. O umbigo da laranja-bahia. A blue note que muda tudo, o claro-escuro do filme noir. A sessão de análise na qual não se tinha nada para dizer, e é aquela em que se vai mais fundo. A fantasia de antes, o silêncio de depois. A primeira vez em que um mineiro vê o mar.
“Pura vadiação mental”, confessou Drummond. “Poesia à paisana”, proseou Carpinejar.
O dia em que alguém definir com precisão o que seja a crônica, ela puff! deixa de existir. Perde seus superpoderes, feito teorema demonstrado. Esfinge privada dos dentes, enfiará o rabo entre as pernas e irá fazer companhia aos ditirambos, às cantigas de amigo, às de escárnio e maldizer, nalgum Retiro dos Gêneros Que Não Seduzem Mais Ninguém.
Até lá, deixemo-nos devorar.
Cedae faz manutenção na terça (25) e vinte bairros do Rio serão afetados
Pista ganha nome de Phil Haegler; missa de sétimo dia foi marcada
Sim, Gracyanne Barbosa lançou uma linha de ovos ‘de galinhas talentosas’
Ela enganou todo mundo! Marca de ovos de Gracyanne era ação publicitária
Nova Iguaçu inaugura uma das maiores exposições de arte sacra do país





