Crônica, por Eduardo Affonso: No débito ou no crédito?
"Pagar no débito é uma declaração com fé pública de que a pessoa tem dinheiro parado (sobrando) na conta"
– Débito.
É inevitável que eu procure o olhar de quem responde assim. Talvez porque adivinhe uma arrogância aveludada na voz. Talvez pela certeza de que a pessoa tampouco resistirá a olhar em torno, para colher os olhares dos que, como eu, sentem uma inveja secreta (vá lá: mal dissimulada) de quem paga no débito.
Pense comigo: quem, podendo pagar mês que vem, prefere pagar agora? Quem, podendo pagar devagarinho, em suaves prestações mensais, prefere pagar tudo de uma vez?
Pagar no débito é uma declaração com fé pública de que a pessoa tem dinheiro parado (sobrando) na conta. Que não precisa parcelar em até três vezes, sem juros. Um atestado de estabilidade financeira, ainda que – dependendo do tom da voz, e da quantia em questão – possa embutir certa necessidade de reconhecimento social.
Só perde para quem, no aeroporto, pede um pão de queijo.
Pedir café (“R$ 15,00. No débito ou no crédito?”) é de praxe. Pedir pão de queijo (“À vista ou financiado?”) é puro exibicionismo.
Entendo quem viaje de primeira classe: é um afago no ego, um sinal de respeito pelas próprias vértebras, um reconhecimento às pernas pelos bons serviços prestados. Entendo quem pegue o cardápio, na executiva, e peça um blood mary (“Bem temperado, por favor”) e uma quiche. Ou mesmo aqueles que, na econômica, comprem um kit de viagem ou um fone de ouvido. Mas pão de queijo em aeroporto é puro exercício de extravagância.
Coisa de novo rico, suponho. Bem-nascidos — homens com “e” no sobrenome, mulheres grafadas com “neé” nas coluna sociais — mal aceitam uma mineral (com gás) nas salas vips. (Dizer “não” a coisas grátis é o suprassumo da finesse.) Só novo rico é que ostenta logotipo na roupa, arranca a Mercedes cantando pneu no sinal, exibe Rolex na praia e come pão de queijo em aeroporto.
Se pagar no débito, a Receita Federal deverá ser notificada, porque só pode ser lavagem de dinheiro.