Crônica, por Eduardo Affonso: A uberização dos relacionamentos
Com a tinderização, o fluxograma do sexo sofreu mudanças
Antigamente, sexo era algo que vinha depois – não apenas depois das preliminares, mas depois de conhecer, pegar na mão etc. Com a tinderização, o fluxograma do sexo sofreu mudanças.
– Foi bom pra você… é… hmmm….?
– Que foi?
– Qual é o mesmo o seu nome?
– Carol.
– Muito prazer, Carol. Foi bom pra você?
– Foi … é… hmmmm….
– Cauê.
– O quê?
– Meu nome. Cauê.
– Ah, não foi tanto prazer assim, Cauê. Mas valeu.
Talvez a causa tenha sido a uberização dos relacionamentos, que ganharam flexibilidade e autonomia, mas precarizaram os vínculos. Culpa do Zygmunt Bauman e da tal da modernidade líquida, que deixou as relações mais fluidas, praticamente voláteis. Não há mais aquele compromisso tipo CLT, com aviso prévio de fim da paixão, fundo de garantia emocional e seguro-divórcio. Pejotizou geral:
– Amor, vamos ver alguma coisa na Netflix hoje, tomar um vinhozinho e…
– Não dá, amor, eu já estou em outro relacionamento.
– Ah, tá. Deixa eu ver quantos dias de aluguel a gente precisa rachar. Vai me devolver o quíndol do Neruda, né? Acho que você nem leu.
– Vou, mas fico com a pleiliste do Pixinguinha, tá? O resto é seu.
O resultado é a ifoodização dos afetos. Queremos tudo – amor, desejo, companheirismo – para já, e tem que entregar na mão, para a gente não precisar descer e pegar na portaria (metaforicamente falando, claro). E ai se o carinho vier sem o acompanhamento, se a alegria chegar morna e a gratidão não estiver no ponto.
Queremos que tudo esteja à nossa disposição para quando nos for mais conveniente, numa streaminguização que nos deixou sem o pouco de paciência que restava depois da invenção do controle remoto. Tudo precisa ser resolvido literalmente em um minuto, numa tiktokização da vida.
Já tínhamos orkutizado o romantismo com expressões como “princesa”, “tchutchuca”, “nem” e “mozão”. Aí passamos a só valorizar as manifestações de ternura que fossem instagramáveis.
O jeito é mesmo investir na airbnbização do tesão, disponibilizando a libido por curtas temporadas, com resultados bem mais vantajosos que os obtidos por contatos de longa duração. Só é preciso oferecer o mínimo necessário (tudo limpinho, higienizado, horários de chequim e checaute) e não esquecer de fornecer o básico.
Não vou dizer que antigamente fosse melhor – não era – mas a reclameaquização das relações tanto pode nos salvar de muitas roubadas quanto alertar potenciais pretendentes quanto ao risco que correm conosco.
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