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Fernanda Torres

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Mexeu comigo

Leia na crônica de Fernanda Torres

Por Fernanda Torres
Atualizado em 10 abr 2017, 19h22 - Publicado em 10 abr 2017, 16h56
 (VEJA RIO/Veja Rio)
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Estava em Curitiba, no Festival de Teatro, quando recebi o convite para participar de uma reunião que discutiria o caso de assédio do ator José Mayer, denunciado pela figurinista Susllem Tonani, em um blog do jornal Folha de S.Paulo.

Eu já havia enfrentado uma reação violenta, por parte de grupos antenados com o feminismo atual, por ter escrito um artigo sobre a minha visão das questões que envolvem as relações entre homens e mulheres. Entendi, na época, que o discurso de exceção não se sustenta mais, num momento de enfrentamento do machismo, tão arraigado na sociedade brasileira.

Por ter conhecido de perto a fúria das bacantes, preferi me manter anônima nos protestos que pediam a retratação do ator.

Em sua carta de desculpas, Mayer diz que, aos 60 anos, não percebeu que o mundo havia mudado e jura ter saído do episódio transformado. Acredito que sim. O caráter educativo da execração pública é uma lição dolorosa. As gerações mais novas, que cresceram com o advento das redes sociais, aprenderam quanto uma situação exemplar serve para disseminar ideias e promover mudanças.

O abuso de poder e o machismo nos corredores da TV Globo são muito mais tênues, hoje, do que no passado. Mulheres ocupam cargos de chefia na casa, diretoras e produtoras tomam decisões importantes, e os salários são equiparados.

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Há dois anos, foi distribuído um manual de conduta aos funcionários, com o intuito de evitar abusos nas relações de trabalho. Susllem tornou seu caso público porque não sentiu, por parte da empresa, uma posição firme, justa, diante da violência que havia sofrido.

Seu gesto deu resultados. Não só Mayer veio a público se arrepender como também recebeu suspensão, e a direção estuda uma ouvidoria para casos de assédio.

Trinta anos atrás, posar nua para uma revista machista, como a Playboy, era prova de coragem e superação feminina. Hoje, pelo contrário, as meninas tentam estabelecer limites claros de respeito e conduta para aqueles que se sentem atraídos por elas. Para gerações anteriores, que viveram a época de ouro do macho, as novas regras de comportamento confundem e assustam.

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O assédio a Susllem não esbarra apenas no machismo, mas também no abuso de poder de um protagonista de novela, posição hierarquicamente superior à de uma assistente de figurino, sobre uma jovem que não tem como se defender. O movimento solidário, de sororidade, para usar uma palavra da hora, com que funcionárias, diretoras, técnicas e atrizes abraçaram a causa viralizou, e, agora, serve de mensagem para que outras mulheres tenham coragem de se posicionar.

Talvez não exista mudança sem dor, sem radicalidade, sem militância. As consequências foram terríveis para Mayer, mas a mensagem foi transmitida, em alto e bom som, inclusive no Jornal Nacional.

Fico pensando que outras causas, que não o assédio, teriam relevância para a vida das brasileiras.

A legalização do aborto é uma delas, assim como a descriminalização das drogas. Ambas encontram uma resistência inarredável por parte das bancadas mais conservadoras do Congresso. Mas uma livraria milhões de mulheres da ilegalidade e da morte; e a outra, milhões de mães das portas de presídios e cemitérios.

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