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Fernanda Torres

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Ciclos

Leia na crônica de Fernanda Torres

Por Fernanda Torres
Atualizado em 15 out 2017, 09h01 - Publicado em 15 out 2017, 09h00
 (Isabelle Barreto/Veja Rio)
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Todo ciclo dura de dez a vinte anos. É algo que percebo com clareza, do alto dos meus 52 percorridos.

Nasci um ano depois do golpe militar e esperei vinte, até o presidente Figueiredo declarar que prenderia e arrebentaria quem fosse contrário à abertura política.

A transição, entre Tancredo e FHC, com direito a um Collor no meio, exigiria mais dez anos de paciência, até a estabilidade democrática se concretizar.

E vinte anos foi o tempo necessário para descobrir que o ciclo virtuoso era alimentado pela corrupção endêmica, baseada na compra de votos de deputados e na corrida eleitoral movida a superfaturamento de obras públicas. Uma prática que nos levou até o desastroso governo de Dilma Rousseff, seguido desse arremedo sinistro chamado Michel Temer.

A falência moral e ética dos partidos que nasceram da luta pelo fim da ditadura teve o efeito de terra arrasada e abriu caminho para um radicalismo que apenas começa a engatinhar.

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No último festival de cinema de Brasília, a diretora Daniela Thomas enfrentou o paredão depois da apresentação de Vazante, filme que trata da origem da miscigenação no Brasil.

A diretora foi acusada de ter se valido do olhar de uma menina branca para falar das feridas da escravidão e de ter repetido, com esse olhar, a eterna apropriação cultural, que relega ao segundo plano os afro-brasileiros e sua história.

Daniela, que possui antepassados brancos, pretos e índios e que viu seu pai, o cartunista Ziraldo, ser levado de casa pelo Dops nos anos de chumbo, sentiu-se fora de tempo e lugar ao ouvir dos manifestantes que Vazante deveria ser engavetado, se não pela censura, pela autocensura.

Do outro lado, e de forma ainda mais preocupante e arbitrária, uma vez que se trata de decisão tomada pelo Estado, a prefeitura do Rio de Janeiro proibiu a exposição de arte Queermuseu, sobre a diversidade de gênero, no Museu de Arte do Rio. O carioca não deseja esse tipo de blasfêmia no espaço gerido pelo município, afirma o prefeito que quer dar um banho de loja na Rocinha e enfrenta baixíssimo nível de aprovação.

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Em Brasília, a CPI dos Maus-Tratos convocou o curador da mesma mostra, Gaudêncio Fidélis, para se defender da acusação de incitação à zoofilia e à pedofilia, enquanto o ministro da Cultura vê crime no fato de uma criança, sob os cuidados da mãe, tocar o pé de um homem nu. Isso sem falar no deputado que se diz saudoso do tempo em que podia enfiar o cacete em desavergonhado.

Terreiros de candomblé são destruídos nas comunidades do Rio; a Casa do Mago, no Humaitá, sofre atentados e a cura gay avança; Doria apaga grafites nos muros de São Paulo e os exageros multiplicam-se, o obscurantismo oportunista para garantir votos e correligionários, desviando a atenção para crimes hediondos, que saqueiam verbas de educação, saúde e saneamento.

Novos tempos.

Para quem achava que caminhávamos para um entendimento maior entre povos, culturas e nações, o castelo ruiu. É justo o contrário.

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Desponta no horizonte o reino da patrulha, do fundamentalismo, do fascismo, do ódio e da censura. É melhor se preparar para o tortuoso inverno, porque periga levar duas décadas para o frio passar.

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