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Por Alexandre Carauta, jornalista e professor da PUC-Rio
Pelos caminhos entre esporte, bem-estar e cidadania
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“Temas relevantes sobre futebol vão além de jogadores, clubes, conquistas”

Organizador do Cinefoot, cuja 14ª edição começa nesta quinta, Antonio Leal destaca o elo entre cinema, universo esportivo, pluralidade e cidadania

Por Alexandre_Carauta Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
24 abr 2024, 10h35

O cineasta Antonio Leal é garimpeiro por natureza. Faro de centroavante, há uma década e meia o criador do Cinefoot conduz uma arqueologia audiovisual pelo universo do futebol. Escava preciosidades que aproximam memória esportiva, diversidade, cidadania.

A 14ª edição do festival reúne 51 delas. Serão exibidas, entre 25 e 30 de abril, no Estação Net Rio, no Estação Botafogo, no Centro Cultural da Justiça Federal e no Cine Teatro Eduardo Coutinho Biblioteca Parque de Manguinhos. Os ingressos (gratuitos) e a programação completa estão disponíveis em cinefoot.org.

O cardápio inclui uma oficina audiovisual para jovens, uma masterclass com o documentarista Pedro Asbeg, diretor de “Democracia em preto e branco” e “O Ninho: futebol e tragédia”; homenagens aos craques Cruyff, Doval, Júnior, Dinamite; e debates relacionados, por exemplo, antirracismo e equidade no esporte. “A programação plural se conecta com questões sociais. Buscamos ampliar o olhar em torno da representação do futebol e seus impactos socioculturais”, sintetiza o incansável Antonio Leal, cuja fala mansa disfarça o dinamismo comum aos desbravadores.

“O cinema brasileiro ainda deve muitos filmes à história do nosso futebol. Temos temas bem relevantes além de obras sobre jogadores, clubes, conquistas, torcedores”, completa. Com a habitual ponderação, ele traça um balanço do Cinefoot, seus legados, seus desafios, seus “torcedores”, enaltece produções relativas ao futebol feminino e avalia por que jogador estrangeiro vira carioca desde criancinha:

Qual a importância, para o cinema, de ídolos como Cruyff, Doval, Júnior e Dinamite, homenageados no festival?

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Ídolos constroem paixões, memórias, marcas genuínas que os fãs carregam por toda a vida. O cinema traduz este turbilhão de emoções em obras documentais de enorme repercussão e relevância. Estas histórias audiovisuais eternizam nossos ídolos.

O audiovisual expandido pelos meios digitais mostra-se cada vez mais importante à construção do ídolo?

Quando alguma história já vem sendo construída pelo personagem, a conexão ocorre. Quando se trata de uma expansão de imagem e tentativa de conexão com o público sem pilar afetivo, não é segurança de êxito. A bola pune.

Um dos filmes em deferência a Roberto Dinamite aborda a jornada história dos Camisas Negras do Vasco, campeões cariocas em 1923, marco da luta antirracista. O tema também é discutido numa das mesas do Cinefoot.  Como o cinema contribui para radiografar, debater e mitigar as discriminações no meio esportivo?

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O Cinefoot é um festival de cinema único no Brasil. Isso nos transfere uma responsabilidade imensa, por ser a única vitrine de difusão na qual a cinematografia de futebol é projetada. É um festival aguardado pelos realizadores audiovisuais, pelos produtores, pelo público. Neste sentido, é muito importante construir uma programação ampla, plural e conectada com temas de interesse social, ampliando o olhar e a importância do debate em torno da representação do futebol e seu impacto cultural e social. Temas como diversidade, futebol feminino, antirracismo e equidade no esporte estão em todas as edições.

Iluminar a história de pioneiras como Lucy Alves, retratada no documentário do italiano Roberto Pili, constitui um dos caminhos para efetivar avanços de igualdade e reconhecimento?

O futebol feminino tem amplo espaço no Cinefoot desde a primeira edição. Inúmeras atletas e ex-atletas já foram homenageadas, assim como diretoras cinematográficas de filmes sobre futebol. Cresce bastante a presença de mulheres nas equipes criativas de produções audiovisuais. Percebemos também uma expansão no número de filmes com mulheres protagonistas. Além do filme sobre a desbravadora Lucy Alves, o 14º Cinefoot exibe um documentário sobre as pioneiras do futebol feminino brasileiro; uma coprodução Brasil-Egito que aborda o sonho de uma jovem egípcia em praticar futebol; uma consagrada animação brasiliense sobre a persistência de meninas em jogar bola; e um doc sobre a luta das mulheres para atuar na arbitragem.

Falando ainda sobre memória, você acredita que documentários como “O Ninho: futebol e tragédia”, de Pedro Asbeg, também homenageado no festival, impulsionem uma arqueologia audiovisual imprescindível para discutir os rumos do esporte e do país?

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O cinema brasileiro ainda deve muitos filmes à história do nosso futebol. Temos temas bem relevantes para tratar que vão além de obras sobre jogadores, clubes, conquistas e torcedores. Por isso, é preciso ampliar o olhar sobre este rico mosaico temático que o futebol oferece. “O Ninho..” é uma série documental relevante que preenche lacunas na busca de novos horizontes para reflexão em torno deste universo.

O filme de abertura do 14º Cinefoot, “Doval: o carioca mais gringo do futebol”, de Sérgio Rossini e Federico Bardini, expõe a relação estreita do atacante argentino com o Rio, a ponto de ter virado ídolo no Flamengo e no Fluminense. Por que a cidade é tão querida pelos jogadores estrangeiros, e vice-versa?

O Rio é uma cidade aberta a estas experiências. E o futebol é uma marca identitária da cidade. Durante muitos anos, os clubes cariocas eram o sonho a ser alcançado por jogadores estrangeiros que queriam jogar em times populares, com torcidas apaixonadas, bons salários, e desfrutar das belezas naturais da cidade. Doval viveu como ninguém esse glamoroso momento. Hoje outras cidades e regiões brasileiras também atraem jogadores internacionais.

Os documentários “A última partida”, de Jordi Marcos, em torno da genialidade e do legado de Johan Cruyff, e “A turma do Maestro Junior”, de Daniel Furiati Sroulevich e Raphael Vieira, lembram a importância dos regentes para o futebol. Eles andam em falta?

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Andam em falta, sim. Já vimos até convocações da seleção brasileira sem um maestro. Esta carência precisa ser combatida pelos clubes na formação dos talentos. Futuros maestros devem ser estimulados na base, com liberdade e criatividade.

Que personagem ou personagens você gostaria de retratar ou de ver retratado no cinema?

Inúmeros. A lista é grande. Mas tem uma figura cuja história me encanta e me emociona profundamente: Rivaldo.

Nesses 14 anos, que avanços o Cinefoot acumula?

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Quando olhamos para trás, percebemos que o Cinefoot abriu muitas frentes artísticas, culturais e econômicas para o cinema futeboleiro do Brasil. Produtores, realizadores, distribuidores, exibidores e criadores de toda a cadeia produtiva audiovisual foram impactados pelo florescimento e pela continuidade do festival. Ele se transformou em referência no circuito internacional de cinema sobre futebol. É associado à Federação Internacional de Cinema e Televisão de Sports (FICTS), que reúne um seleto grupo de 20 festivais de cinema esportivo de várias partes do mundo. Isso abre espaço para filmes brasileiros de futebol em vários países, sendo laureados várias vezes.

A formação de público, tanto de cinema quanto de futebol, é outro legado importante?

Sim, muito. Temos também uma atuação importante no estratégico processo de formação de plateia. As crianças que estiveram na Mostra Dente de Leite dos primeiros anos de Cinefoot hoje são jovens que cresceram em contato com uma cinematografia especial, sem presença regular no circuito comercial. A conexão com o público é a nossa maior riqueza.

Quais os desafios para fortalecer a triangulação entre futebol, audiovisual e cidadania, eixo tradicional do Cinefoot?

Nosso principal desafio é manter uma atividade repleta de energia para ampliar esta convergência com tudo que integra o ecossistema do futebol e do cinema. Nossos parceiros são fundamentais neste processo, em espacial o Museu da Pelada, que desenvolve um trabalho singular e imprescindível. Trabalhamos intensamente para manter o festival relevante e desejado pelo público e por realizadores audiovisuais, reinventando nossas ações com base na criatividade e no encantamento da nossa torcida.

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Alexandre Carauta é jornalista e professor da PUC-Rio, integrante do corpo docente da pós em Direito Desportivo da PUC-Rio. Doutor em Comunicação, mestre em Gestão Empresarial, pós-graduado em Administração Esportiva, formado também em Educação FísicaOrganizador do livro “Comunicação estratégica no esporte”.

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