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Por Alexandre Carauta, jornalista e professor da PUC-Rio
Pelos caminhos entre esporte, bem-estar e cidadania
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Arte e skate unidos para celebrar o poder feminino

Produzido e disputado só por mulheres, Girls Skate Jam ativa vigor sociocultural do esporte como fonte de inclusão, pluralismo, inventividade

Por Alexandre_Carauta Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
24 nov 2023, 00h53

O skate feminino precisa de mais espaço, mais reconhecimento. A reivindicação extrapola os feitos, por exemplo, de Pâmela Rosa, bicampeã dos X-Games, prata no Pan 2023, e Rayssa Leal, campeã no Pan, prata nos Jogos de Tóquio, em 2021, aos 13 anos. O pedido, quase um desabafo, vem das ruas. Ecoa no dia a dia de meninas invisíveis para as quais o esporte representa, acima de tudo, um raio de expressão, de libertação.

Elas sonham com pódios tanto quanto sonham com inclusão, igualdade, respeito. Fora a lei da gravidade, enfrentam precariedades e preconceitos crônicos.

Ao encontro dessas vozes, brotam, igual flor no asfalto, inciativas como o Girls Skate Jam. Idealizado pelo skatista e empreendedor social Davison Fortunato, de 29 anos, o torneio é mil por cento feminino: atletas, juízas, produtoras, locutoras. A segunda edição reúne mais de 100 mulheres, domingo agora (26), a partir das 9h, em Suzano, região metropolitana de São Paulo (transmissão pelo canal CemporcentoSkate, no YouTube).

Às provas de Street e Park, somam-se atividades culturais e gastronômicas. Na série Smart Talks, a artista plástica Juliana Sayuri conversa com a modelo Beatrice Domond, a coordenadora do STU Déa Mendes, a jornalista Nathália Penteado, entre outras profissionais.

Radicada há um ano no Rio, onde concilia os trabalhos artísticos com o curso de Administração da PUC, a catarinense Sayuri, de 21 anos, também assina o visual do Girls Jam, inspirado nas nuvens. Sayuri e Davison detalham peculiaridades da competição e destacam a importância sociocultural,  transformadora, do skate:

Como nasceu Girls Skate Jam?

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Davison: Várias amigas skatistas apontavam desigualdades persistentes, do treino às provas. Decidi, então, criar um torneio produzido e disputado só por mulheres. Ele levou cinco anos para se concretizar. Mas sou só o idealizador. Tudo fica com as mulheres.

Sayuri: Os padrões são dominantemente masculinos. Isso deixa muitas skatistas desconfortáveis. Boa parte delas ainda é sexualizada, não é levada a sério. Manobras radicais são historicamente associadas aos homens, o que caracteriza um grande equívoco. Envolvidas. Torneios como o Girls Skate Jam evidenciam o poder feminino e ajudam a derrubar esses preconceitos.

O que mudou no torneio em relação ao ano passado?

Davison: A edição 2023 reforça a relação entre skate e pluralismo, arte, empoderamento feminino. Não é só um torneio. É um movimento cultural voltado à inclusão e à melhora das condições estruturais, sociais e esportivas para as meninas do skate. Neste ano, o Girls Jam reúne mais de cem participantes, entre competidoras e profissionais envolvidas com a organização e a produção, inclusive juízas, fotógrafas, locutoras. A premiação também cresceu. Chega a R$ 40 mil, quatro vezes a do ano passado.

Sayuri: Isso mostra que a transformação em torno de mais espaço e mais reconhecimento para as skatistas não está só nas ideias, nas falas. Está acontecendo. E se materializa na interação com o público, diverso, na união entre esporte e arte, nos papos com as profissionais bem-sucedidas, inspirações para as jovens (Smart Talks).

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Que aspectos ativam a relação entre skate e cultura, estilo de vida, celebrada em iniciativas como o Girls Jam?

Davison: O skate envolve música, arte, design, moda. É uma grande fonte de expressão, de criação, de libertação, e de união entre pessoas identificadas com o seu repertório sociocultural. Quando ingressei no skate, aos 14 anos, eu me encontrei, me senti parte desse universo. Queria que outras pessoas tivessem o mesmo encontro. Parti para ações inclusivas. O Skate Jam Suzano, por exemplo, estimula o desenvolvimento de talentos: os vencedores disputam o Tampa Bay, uma das competições mais tradicionais, nos Estados Unidos. Já o Amazing AM busca democratizar o esporte, melhorando as pistas de regiões carentes. O Girls Jam tem a mesma pegada social.

Você pretende expandir as ações sociais?

Davison: Sim, é uma prioridade. Tento ampliá-las enquanto me divido entre Suzano, minha terra natal, onde se concentram meus projetos sociais; Los Angeles, onde passo boa parte do ano; e as viagens pelo Brasil. Essas ações são coletivas. Agregam profissionais de diversas áreas e parcerias como a do Banco do Brasil. A força cultural do skate alinha-se à responsabilidade social cada vez mais valorizada por organizações públicas e privadas.

Ainda falando dessa força sociocultural, por que a arte se mostra tão afinada com o mundo do skate?  

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Sayuri: A arte potencializa o genuíno, o questionamento, a quebra de moldes sociais dominantes. Representa a busca apaixonante por originalidade, profundidade, liberdade. Enfatizei isso na expressão visual do Girls Jam, inspirado nas nuvens. Elas simbolizam o estado de flow vivenciado tanto por artistas quanto por atletas.

Como assim?

Sayuri: O estado de flow significa ficar hiperfocado, convergir as habilidades necessárias para testar e superar limites, o que faz parte do esporte, da arte, do processo criativo. Essa sensação, vivida por músicos, poetas, artistas, atletas, expressa o poder do genuíno, representado pelas nuvens. Mas cada pessoa, claro, pode interpretá-las de maneira diferente.

Davison: O trabalho da Sayuri explora a arte como uma ferramenta de questionamento, contra a naturalização de determinados padrões sociais, predominantemente masculinos…

Sayuri: Exato, porque arte transcende o estético. Experimentei técnicas de pintura para criar algo que ficasse não só bonito, mas que ativasse esse espaço de fuga, de originalidade, de transformação, muito ligado à cultura do skate.

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Diante desse pulso transformador, que mudanças ou aprendizados o skate impulsiona em vocês?

Davison: Skate é um estilo de vida que valoriza o pluralismo, refletido, por exemplo, nas suas vertentes de moda, música, arte, com as quais me identifico desde a adolescência. Isso me levou a canalizar a energia para ações positivas, para encontrar pessoas construtivas, de diversas gerações. O skate também me ensinou a ser persistente e buscar sempre a inclusão, o que vai além da alta performance. Quando a pegada inclusiva se junta à competição, aí vira uma grande celebração da cultura transformadora.

Sayuri: O skate me encanta por vários motivos. É um esporte muito coletivo, com uma troca constante de conhecimentos, experiências, desafios. É um motor de relações interpessoais e de questionamentos. Sinto que faltam questionamentos e profundidade na minha geração. O skate também é estimulante como território de expressões culturais.

Como a vocação cultural e esportiva do Rio pode aguçar ou explorar esse vigor imaterial do skate?

Davison: O Rio tem um enorme potencial para acolher iniciativas plurais, inclusivas, como na pista de Madureira ou em Saquarema, por exemplo.

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Sayuri: Sim, o Rio é vocacionado para o esporte, para a cultura das ruas. Vivencio essa vocação desde que me mudei de Florianópolis para cá, no ano passado.

A que vivências, particularmente esportivas, você se refere?

Sayuri: Ah, eu jogo bola com amigas no Vidigal e na faculdade, surfo na Barra, e me reúno frequentemente com a comunidade do skate. Mas devo confessar que o meu esporte preferido é o snowboarding. (risos)

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Alexandre Carauta é jornalista e professor da PUC-Rio, doutor em Comunicação, mestre em Gestão Empresarial, pós-graduado em Administração Esportiva, formado também em Educação FísicaOrganizador do livro “Comunicação estratégica no esporte”.

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