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Por Analice Gigliotti, psiquiatra
Comportamento
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Gal Costa e Chandler de “Friends”: a dor de perder um amigo

Declarações de amigos do ator Matthew Perry e da cantora Gal Costa fazem pensar na importância das amizades (e na dor de perdê-las)

Por Analice Gigliotti
21 nov 2023, 09h02

Foi um susto para os fãs da série “Friends” diante da surpresa da notícia de que o ator Matthew Perry, intérprete do incomparável personagem Chandler, havia morrido dentro da piscina, em casa, nos Estados Unidos. Dependente químico declarado há anos, recorrentemente internado para tratamento de adição, o corpo de Perry está passando por exames toxicológicos para saber-se se, no momento da morte, ele estava ou não sob efeito de substâncias.

Independente da causa mortis, o anúncio de seu falecimento causou forte impacto emocional em várias gerações que, por décadas, acompanharam a história da amizade de Chandler, Rachel, Ross, Joey, Phoebe e Monica. De certo modo, a amizade dos cinco personagens era um pouco a amizade idealizada por cada espectador. Um tipo de amizade capaz de resolver as piores brigas ou desavenças em 25 minutos de programa, numa vida em que trabalho e dinheiro são assuntos secundários: o importante é perder a noção do tempo batendo papo e dando risadas com os melhores amigos na cafeteria da esquina. Que jovem não sonhou com uma vida assim, na passagem da adolescência para a vida adulta?

Ao longo desta semana, à medida em que os cinco atores da série divulgaram suas notas oficias e fizeram posts sobre o assunto, foi ficando bastante clara a importância de Matthew Perry em suas vidas pessoal e profissional. “Todos experenciamos perdas ao longo da vida, perdas de amores ou de vidas. O luto permite viver momentos de gratidão por ter amado tanto uma pessoa. E nós amamos Matt, muito”, declarou a atriz Jennifer Aniston, que interpretava Rachel na série. “Obrigado pelos dez anos incríveis de risadas e criatividade”, disse o ator David Schwimmer, que vivia Ross na série. “Obrigado pelos melhores dez anos que uma pessoa poderia ter”, completou Lisa Kudrow, intérprete de Phoebe.

Em uma triste coincidência, acaba de completar um ano desde que Gal Costa morreu. Em suas redes sociais, Caetano Veloso deixou uma mensagem: “Hoje faz um ano que Gal morreu. Nem acredito. É como tivesse sido ontem, é como não tivesse sido. (…) Não dá pra medir, não dá pra entender. (…) Ela ter ido embora não metabolizo. Já faz um ano que o mundo não tem Gal? Impossível aceitar.”, postou o cantor.

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A dor em torno da morte de Matthew Perry teve o mesmo efeito que a de Gal, há um ano: acabou por irmanar pessoas de diferentes idades em torno de uma sensação de melancolia. Se no caso de Gal, muitos sentiram que haviam perdido a trilha sonora de suas vidas, com a partida de Perry a impressão em cada espectador que acompanhava a série é que tinham perdido um amigo.

Assim como a falta de Gal traz um momento de reflexão em Caetano sobre a sua própria história, a morte de Perry provoca os jovens fãs da série dos anos 1990 a constatarem que todos vivemos, envelhecemos e, nesta caminhada, criamos novas dores e alegrias.

Não é difícil ter empatia com a desolação de Caetano e dos colegas de elenco de Matthew Perry em “Friends”. A perda de um amigo não é algo que se supere com facilidade. Amigos são testemunhas de vida, em muitos casos, mais fieis e presentes do que familiares.

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E como lidar com o luto que parece não passar? Vários livros tem se dedicado sobre o assunto, sob diferentes perspectivas, como “Lutos finitos e infinitos”, de Christian Dunker, “Notas sobre o luto”, de Chimamanda Ngozie Adichie e “Manual do luto”, de Fabricio Carpinejar.

Não há uma única resposta certa sobre como viver o sentimento da perda. Mas a senha pode estar na genialidade de Carlos Drummond de Andrade no poema “Ausência”:

“Por muito tempo achei que a ausência é falta.

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E lastimava, ignorante, a falta.

Hoje não a lastimo.

Não há falta na ausência.

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A ausência é um estar em mim.

E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços,

que rio e danço e invento exclamações alegres,

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porque a ausência, essa ausência assimilada,

ninguém a rouba mais de mim.”

Assimilar a ausência, entender que nela não há falta e que é este sentimento de permitir que ela resida em nós que traz conforto e possibilita a gratidão pelos momentos vividos. A ausência é, na verdade, cultivar a presença, mas agora dentro de nós.

Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp; professora da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.

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