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O pastor que se tornou o guru religioso da família Bolsonaro

Com jeito de garotão e roupas de marca, guru do casal presidencial ergueu um império religioso na Barra da Tijuca

Por Sofia Cerqueira
Atualizado em 7 fev 2020, 17h32 - Publicado em 5 fev 2020, 11h04

Durante o primeiro ano de governo, em todas as grandes comemorações ou nos momentos de aperto, o presidente Jair Bolsonaro e a primeira-­dama Michelle contaram com um reforço, digamos, de instâncias superiores. O apoio veio pelas palavras e orações de um paulista que vive no Rio desde 1 ano de idade, com jeito de garotão, roupas de marca — “compradas mais barato nos Estados Unidos”, frisa — e eterno tom professoral. Josué Valandro Jr., 50 anos, pastor da Igreja Batista Atitude, na Barra da Tijuca, é uma espécie de guru do casal. Com acesso direto à senhora Bolsonaro (falam-se pelo menos uma vez por semana por telefone ou mensagens no Whats­App), em várias ocasiões, teve mais contato com o clã do que ministros e políticos do alto escalão.

Valandro acompanhou os últimos instantes do casal na Granja do Torto antes da posse, em 1º de janeiro de 2019, e ocupou lugar cativo tanto na cerimônia de transmissão da faixa quanto na festa no Itamaraty. Quando veio à tona o escândalo da família da primeira-­dama, cuja avó foi condenada por tráfico de drogas e cuja mãe foi acusada de falsidade ideológica, mais uma vez esteve lá. Há alguns meses, em meio ao furacão causado pelo depoimento de um porteiro que poderia ligar o nome de Bolsonaro ao assassinato da vereadora Marielle Franco, de novo partiu para cuidar de suas ovelhas. No evento de Natal no Palácio do Planalto, também marcou presença. Só no ano passado, esteve mais de dez vezes em Brasília. Embora refute qualquer vantagem pela proximidade com o poder, prepara-se para abrir neste ano uma filial da sua igreja no Distrito Federal. “Temos uma célula atuante ali há muitos anos, mas é claro que a chegada de pessoas como Michelle à cidade fortalece a igreja”, reconhece o pastor.

Com bordões como “Os motivados sempre ganharão dos inteligentes” e tendo os atuais moradores do Palácio da Alvorada como principais garotos-propaganda — apesar de Valandro afirmar que a igreja já prosperava —, o rebanho da Atitude, é fato, só engorda. Aos domingos, há ocasiões em que o templo da Barra reúne 8 000 pessoas (sentadas, isso mesmo!), metade no culto da manhã e o restante à tarde. A primeira-dama entrou para a instituição em 2016, vinda da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, de Silas Malafaia, após desavença entre o pastor e seu marido. Ingressou no ministério de surdos como intérprete de libras e promoveu reuniões semanais em casa, distribuiu cestas básicas e participou de quermesses.

Foi justamente em um desses eventos que o então deputado federal apareceu pela primeira vez. Embora se declare católico, Bolsonaro orou na igreja de Valandro semanas antes do segundo turno das eleições e subiu ao púlpito para agradecer no domingo seguinte à vitória. Na ocasião em que esteve internado em São Paulo após ser esfaqueado, o pastor deu mais uma prova de sua influência: passou um dia inteiro no quarto do capitão. Quando fala das ovelhas mais famosas, são só palavras de glorificação. “Michelle é uma mulher voltada para o social, apaixonada pelos mais frágeis. Aqui não andava com as esposas de empresários, mas com as surdas”, exalta. E segue elogiando: “O presidente é um homem de temperamento forte, de uma integridade absurda. Tem uma vontade de tornar o Brasil melhor que eu nunca vi em político algum”.

Fã do pastor batista Billy Graham (1918-2018), que foi próximo de vários presidentes americanos, e apaixonado por futebol — joga pelada toda semana, além de fazer musculação —, o conselheiro espiritual dos Bolsonaro bate ponto na Atitude quase todos os dias. “Isso aí parece um shopping”, apontou um motorista de aplicativo. De fato, o complexo que tem à frente Valandro, a quem Michelle chama de Pr, abreviatura de pastor, lembra um centro comercial: abriga loja de roupas, restaurante a quilo, hamburgueria, lounge com wi-fi e tem vagas para 500 carros. Filho de um pastor batista, o líder religioso sonhava em ser um rico empresário. Fez faculdade de informática, trabalhou na área de tecnologia e em um banco de investimentos até ceder ao “chamado”.

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Antes de comandar a Atitude, que começou de forma improvisada em uma escola municipal na Barra, há dezesseis anos, frequentou o seminário — quatro anos de teologia — e pastoreou em Minas Gerais. Valandro conta que o máximo de doação que recebeu do senhor e senhora Bolsonaro foi um vidro de azeite italiano e rechaça qualquer favorecimento, como se insinuou no caso da área do templo, que obteve licença para a construção de cinco andares. “Esse processo já corria há muito tempo e passou por todos os trâmites legais”, afirma.

Embora garanta que jamais fez campanha para o presidente — até porque seria crime eleitoral —, a proximidade com o líder do Executivo fica evidente em seu Instagram, recheado de fotos com Bolsonaro e Michelle. Hoje, Valandro é um pastor de sucesso: sua igreja tem quinze filiais, entre Brasil, Estados Unidos e Canadá. Volta e meia viaja para Orlando, onde fica uma das unidades, e constantemente é chamado para pastorear no exterior. No fim de janeiro embarcou para Dubai, após aceitar um desses convites, e de lá seguiu para uma viagem pela Ásia com a mulher, uma corretora de imóveis com quem está junto há 25 anos, e os dois filhos.

Por aqui, quando vai a Brasília, que teve o bairro de Águas Claras escolhido para sediar a nova sucursal da Atitude, costuma ser recebido no Palácio da Alvorada para almoçar ou jantar e orar por seus moradores. Entre os conselhos recorrentes está: “Nada como uma noite de sono e um tempo de oração antes de uma grande decisão”. E, quando é interpelado por curiosos, sai em defesa de seu fiel mais notório. “Não elegemos a nossa mãe, que é perfeita para nós. Elegemos Jair Bolsonaro, que vem com uma série de defeitos, mas é um cara bem-­inten­cio­nado e que montou um ministério de nobres. Só não vê quem não quer”, prega.

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