As histórias do Capanema, que quase foi a leilão em 2021, são revisitadas em livro
Tombada pelo Iphan, antiga sede do Ministério da Educação guarda curiosidades já no título: 'Capanema maru' é apelido inspirado por lembrar navio japonês
“É tão esquisito e escandalosamente maluco o edifício novo do Ministério da Educação, que o bom humor popular já lhe deu o nome: ‘Capanema Maru’. Porque surgiu do cérebro do Sr. Gustavo Capanema e traz no conjunto e nos detalhes a linha excêntrica dos navios japoneses, aqueles ‘marus'”. O texto com que o Vanguarda definia o Palácio Capanema durante sua construção, em abril de 1945, abre o livro “Capanema Maru” (editora Jauá), resultado de 10 anos de pesquisa sobre este marco da arquitetura moderna brasileira feita pela arquiteta e urbanista Sandra Branco Soares.
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Recém-lançado, o livro traz em suas mais de 300 páginas toda a história e muitas curiosidades sobre o prédio – concebido por expoentes como Lucio Costa, Oscar Niemeyer, Affonso Eduardo Reidy, Jorge Machado Moreira, Ernani Vasconcellos e Carlos Leão, sob a supervisão do franco-suíço Le Corbusier e tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico Nacional (Iphan) em 1948 – que quase foi a leilão este ano. O Governo Federal chegou a incluir o prédio, que tem painéis de Candido Portinari e jardins suspensos de Burle Marx, na lista do “feirão de imóveis” que organizava, para arrecadar fundos junto à iniciativa privada. Mas voltou atrás após protestos e críticas de especialistas e da sociedade em geral.
“Soube que o 16º pavimento, que é o do terraço do Palácio Capanema, ia ser esvaziado. Ele era originalmente destinado ao gabinete do ministro e ao restaurante dos funcionários. Então fiz uma pesquisa inicial para tentar propor um retorno dele, que estava em má situação de conservação”, conta Sandra, que trabalhou por mais de 20 anos no prédio.
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Ela chegou a fazer um projeto para reativar o refeitório, que não foi adiante. Mas a tal pesquisa cresceu e se transformou no livro, a medida em que a arquiteta se aprofundava no passado do edifício, no porquê de alguns espaços terem sido alterados… “Uma das coisas que mais me impressionou neste processo foi como havia um trato pessoal nos documentos firmados entre todos os envolvidos nas obras. Era uma relação pessoal e íntima também. Isso foi me encantando, e minha pesquisa foi saindo dos registros mais oficiais para os pessoais. Fui buscar depoimentos do Capanema, do Lucio Costa, do Portinari, do Carlos Drummond de Andrade… Dali fui tirando as histórias. Este prédio é uma grande paixão”.
Confira cinco curiosidades sobre o Palácio Capanema:
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1 – O fantasma do comunismo estava tão vivo na época da construção que houve em alguns meios militares quem enxergasse na planta baixa do projeto o desenho da foice e do martelo. Detalhe: Capanema era um conservador e renomado intelectual católico.
2 – O Palácio Capanema ganhou quatro andares extras depois que prefeitura do então Distrito Federal aceitou aumentar o gabarito do prédio. Quando a decisão municipal saiu, a laje do décimo segundo andar já estava assentada. O ministro Gustavo Capanema ordenou, então, que fossem construídos mais quatro pisos. O Capanema ficou com 16 pavimentos.
3 – O prédio, que tem como uma de suas marcas os pilotis, teria apenas cinco intercolúnios – vão entre uma coluna e outra – sob o salão de exposições. Um sexto foi incluído na ocasião do aumento do número de pavimentos. Mas depois de pronto, notaram que o jardineiro só conseguiria acessar o terraço passando pelo gabinete do ministro. Resolveram a questão ampliando os intercolúnios para sete, o que devolveu a proporcionalidade do projeto.
4 – O Capanema tinha um restaurante para funcionários em seu terraço, com vista espetacular e que seguia em seu mobiliário o estilo modernista. Este mobiliário foi especialmente desenhando para o local.
5 – Uma escultura do artista Celso Antonio (1896-1984), “Maternidade”, foi projetada para ficar no mezanino do prédio, mas, por iniciativa de Lucio Costa, acabou sendo retirada e posteriormente transferida para a Praia de Botafogo, onde está até hoje, na altura do Edifício Argentina. Sujeita a intempéries, a obra em mármore, concebida para ficar em ambiente fechado, sofre processo de deterioração.