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Implantação de UPP na Maré é decisiva na luta contra o tráfico no Rio

Por que a ocupação do Complexo da Maré pela Polícia Militar será o desafio mais difícil enfrentado pela corporação desde a criação das Unidades Pacificadoras

Por Ernesto Neves
Atualizado em 2 jun 2017, 12h40 - Publicado em 11 abr 2015, 00h59

Em meio à espiral de violência provocada por repetidos tiroteios no Complexo do Alemão, que culminou com a morte do menino Eduardo de Jesus Ferreira, de 10 anos, no último dia 2, o projeto de pacificação implantado pela Secretaria de Segurança está prestes a enfrentar mais um desafio hercúleo. O programa vai ser expandido para outro quartel-general do crime, o Complexo da Maré. Encravada entre a Avenida Brasil e as linhas Vermelha e Amarela, a região, onde moram 140 000 pessoas, vê chegar ao fim a ocupação conduzida pelo Exército e pela Marinha, que durou um ano. Fruto de um acordo entre os governos estadual e federal, a operação deverá ser encerrada definitivamente até junho, quando todos os 3 300 militares deixarão o local.

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Serão substituídos por policiais militares, que devem preparar a região para a instalação de quatro bases de UPP. O problema: o forte poderio bélico que o tráfico ostenta nas dezesseis favelas localizadas ali. Especialistas consideram que a ocupação militar na área se mostrou insuficiente para fazer frente ao crime. Durante todo o período em que os soldados estiveram presentes houve permanente clima de tensão, que não raro descambava para pesados tiroteios. Em pontos como a Vila do Cruzeiro, os criminosos enfrentaram abertamente as forças militares na ferrenha disputa pelo território. “A PM terá de se desdobrar. E abrir uma nova frente de combate ao tráfico num momento tenso como esse requer enorme esforço”, explica Paulo Storani, antropólogo e ex-capitão do Bope. 

O governo estadual planeja deslocar 1 620 policiais para fazer a segurança da Maré. Iniciada no dia 1º de abril, a ocupação aconteceu primeiro nas comunidades de Praia de Ramos e Roquette Pinto, que viviam sob o jugo de uma milícia. As duas contam, atualmente, com cinquenta PMs. Em maio, será expandida para mais quatro favelas, entre as quais há notórios focos de resistência criminosa, como Parque União e Nova Holanda. O cinturão formado pela polícia completa-se em 30 de junho, quando mais dez favelas passam para o controle da corporação. Com um efetivo exposto por sucessivas falhas no Alemão e na Rocinha, o governo estadual terá de lidar ainda com um cenário extremamente negativo na economia. A crise financeira provocada pela queda na arrecadação de royalties, somada ao escândalo de corrupção que paralisa os investimentos da Petrobras, fará com que o estado precise desembolsar algo próximo a 2,6 bilhões de reais neste ano.

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Zona de conflito
Zona de conflito ()

Além de limitar o trabalho da polícia, o risco é que a crise financeira impeça a injeção de recursos que poderiam reverter os gravíssimos problemas estruturais da Maré. É difícil pensar em policiamento comunitário enquanto riachos fétidos correm nas ruas em direção às águas da Guanabara. Não raro, soldados do Exército tinham de resolver problemas como falta de água ou de luz. “O que a gente tem hoje é a distribuição de parcos recursos em áreas que precisam de altos investimentos”, diz Isnard Martins, professor da PUC-Rio e especialista em segurança pública. “O modelo pensado no começo das UPPs era de ocupação, seguida por investimentos sociais. A segunda parte do plano nunca aconteceu”, diz.A localização estratégica, aliada à situação de exclusão social, explica a força do tráfico na Maré. Esparramada em um terreno plano de 800 000 metros quadrados, ela é cortada por três das principais vias expressas da cidade. Antigo pântano tomado por palafitas removidas por um plano de urbanização nos anos 90, o local também possui saída para a Baía de Guanabara. Seja por via terrestre, seja pela água, as duas facções criminosas e a milícia que dominam o complexo recebem e distribuem rapidamente armamentos e drogas. Tal facilidade logística se reflete no aparato bélico. Durante os doze meses em que os militares estiveram na Maré, foram apreendidos 3 200 cartuchos de munição.

Os embates resultaram na morte de trinta pessoas e deixaram um rastro de 100 feridos, 51 deles militares. Ao resistirem, os criminosos encastelados evidenciam quão importante é aquele local para a economia do tráfico. Mas há caminhos a seguir. Mesmo que a geografia e o histórico apontem para o longo percurso, é possível trabalhar para aproximar a polícia da comunidade. “A seu favor, a Maré tem muitas instituições civis e ONGs que podem ajudar”, diz Ignácio Cano, do Laboratório de Análise da Violência da Uerj. É vital que se evitem as incursões de confronto, que não raro vitimam moradores inocentes. Também não se pode deixar que desvios de conduta policial criem um fosso de desconfiança entre moradores e PMs, como vem acontecendo no Alemão. Em suma, espera-se que os erros cometidos até agora não se repitam mais.

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