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Histórico e sujo

Fundamental para a identidade e o desenvolvimento da cidade, o Rio Carioca inspira movimento pela despoluição de suas águas

Por Pedro Tinoco
Atualizado em 2 jun 2017, 12h51 - Publicado em 13 dez 2014, 00h00

 

Capital entre 1763 e 1960, o Rio de Janeiro é, naturalmente, coalhado de marcos importantes da nossa história. Estão aí o Paço Imperial, a Igreja de Nossa Senhora do Carmo da Antiga Sé e até um pedacinho da Ladeira da Misericórdia, lembrança dos primórdios da cidade. Destaque absoluto nessa lista, o Rio Carioca também vive, sujo, soterrado por sucessivos planos de urbanização, mas vive. Criado há pouco mais de um mês para defender a despoluição de suas águas, o projeto O Rio do Rio já está fazendo barulho. Um barulhinho bom.

Jornalista e escritora, Silvana Gontijo deflagrou a campanha. Moradora do Cosme Velho, um dos bairros cortados pelos 7,1 quilômetros da calha principal do rio, ela começou pela vizinhança. Depois de convocar o marido, o publicitário Lula Vieira, e os filhos, atraiu as associações de moradores de Santa Teresa, de Laranjeiras e do Cosme Velho, além de representantes das favelas Cerro Corá e Guararapes. Alexandre Pessoa Dias, mestre em engenharia ambiental, e a urbanista Mônica Bahia Schlee, ambos com trabalhos publicados sobre o Carioca, engrossam o time.

Há duas semanas, antes de liderar uma modesta mas animada caminhada ao longo do rio, no último dia 7, a jornalista comemorava o apoio de autoridades como Maurício Andrés Ribeiro, secretário-geral substituto da Agência Nacional de Águas, e Wagner Victer, presidente da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae). “Está tudo indo tão rápido que assusta”, diz.Amiga e colega de trabalho de Herbert José de Souza, o Betinho (1935-1997), Silvana acompanhou o sociólogo em movimentos memoráveis, como a Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida. A experiência com mobilização explica, em parte, o progresso nessa nova causa. Mas o assunto também ajuda. O Carioca deu ao Rio a sua identidade, através do nome, além de ter orientado o crescimento da cidade. Para os índios tamoios, suas águas tinham propriedades revigorantes. A foz, na Praia do Flamengo, abastecia viajantes antes mesmo da fundação, em 1565 — e os habitantes da Vila Velha, a primeira povoação carioca, aos pés do Morro Cara de Cão, iam até lá para matar a sede.

Dois anos depois, já acomodados no Morro do Castelo, e após quase dois séculos espalhados pela planície, nossos antecessores ainda dependiam do mesmo manancial. Fruto de notável obra de engenharia, parte da nascente, no alto das Paineiras, desviada por canalização através da Rua do Aqueduto (atual Rua Almirante Alexandrino, em Santa Teresa), deslizava sobre os Arcos da Lapa rumo às dezesseis torneiras do Chafariz da Carioca (hoje Largo da Carioca), o primeiro da cidade, instalado em 1723.

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Com a evolução do sistema de abastecimento, o Carioca passou de solução a problema. Para dar caminho à urbanização, foi canalizado e, em 1905, escondido em passagens subterrâneas. Transbordamentos provocados por chuvas, degradação do meio ambiente, despejo inadequado de lixo e ligações clandestinas fizeram o resto do serviço. O rio desce limpo pelo verde das Paineiras e exibe aspecto bucólico no Largo do Boticário, um de seus poucos trechos ao ar livre, já em meio ao asfalto. Dali, entra na galeria e, metros adiante, reaparece na Rua Cosme Velho, aberto pela última vez, mais sujo e com muitos dejetos. Depois, some sob a pista, serpenteia por Laranjeiras e Flamengo antes de emergir no Aterro, à beira da praia, onde o espera uma estação de tratamento construída em 2002 e administrada pela Fundação Rio-Águas, órgão da prefeitura. O sistema evita que até 80% da carga orgânica levada pelas águas desemboque na Baía de Guanabara — mas, por outro lado, atesta que o rio hoje é um canal de esgoto.

Alexandre Pessoa Dias, um dos adeptos de primeira hora da campanha, conta que, durante a Rio-92, a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, 155 ligações clandestinas feitas no Carioca foram eliminadas. Houve visível retrocesso desde então, comprovado pelo tom cinza da correnteza. Mas Dias não desiste: “Nós bebemos a água do Guandu, portanto há tecnologia para o saneamento. Nem falo do aspecto histórico. A limpeza do Carioca não é só viável, é obrigatória, trata-se de um rio encravado em áreas de proteção ambiental em todo o seu curso, das Paineiras ao Aterro”. Quem se habilita?

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