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Ganho de peso na quarentena põe à prova maior risco para Covid-19

Levantamento feito nos primeiros noventa dias por especialistas no Rio verificou que mais de 20% dos cariocas engordaram, em média, 3 quilos no isolamento

Por Carolina Barbosa
Atualizado em 18 set 2020, 15h14 - Publicado em 18 set 2020, 06h00

Não há dúvida de que o isolamento social é ferramenta de eficiência comprovada contra a expansão do novo coronavírus. Mas ele tem efeitos colaterais desagradáveis, e um deles, praticamente universal, é o aumento de peso dos confinados. Levantamento conduzido nos primeiros noventa dias por um grupo de especialistas no Rio verificou que mais de 20% dos cariocas engordaram, em média, 3 quilos na temporada de porta de casa fechada.

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“As causas são alimentação mais rica em massas, pães e carboidratos em geral, interrupção de atividades físicas, maior consumo de álcool e o fato de as pessoas estarem comendo mais por vontade do que por fome”, explica a coordenadora do estudo, Rosita Fontes, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (SBEM).

(Redação/Veja Rio)

Nos consultórios, os relatos são, muitas vezes, desoladores. “A média de aumento de peso entre meus pacientes é de 7 quilos, mas alguns engordaram o dobro em quatro meses”, diz o endocrinologista Luciano Negreiros. “O estado emocional também contribuiu para isso”, afirma.

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A propensão ao sedentarismo e a facilidade de beliscar fora de hora já seriam suficientes para fazer subir o ponteiro da balança, mas a esses dois fatores se somaram, na pandemia, a dificuldade para dormir, o stress das incertezas, as preocupações em relação ao futuro e a falta de distrações e estímulos. “Neste período difícil e atípico, a ansiedade acaba se confundindo com fome e a pessoa come mais do que precisa”, constata a médica Lívia Lugarinho Corrêa, doutora em endocrinologia pela UFRJ e chefe do Serviço de Obesidade e Transtornos Alimentares no Instituto Estadual de Diabetes e Endocrinologia (Iede).

A médica Lívia Lugarinho Corrêa: “Ansiedade acaba se confundindo com fome” (Maurício Bazilio/Secretaria de Estado de Saúde/Divulgação)

Paciente do Iede, a chef Claudia Alves Fadel, 54 anos, hipertensa, emagreceu 20 quilos em tratamento à base de muita disciplina e esforço e iniciou a quarentena fazendo refeições regradas, como havia aprendido. No fim do segundo mês em casa, um sítio de 6 000 metros quadrados na Zona Oeste, veio a ansiedade, regada a litros de café e porções cada vez maiores de comida. Resultado: ganhou 7 quilos em pouco tempo.

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“Foi sem perceber. Eu seguia a dieta, mas consumia muito mais. Senti que estava perdendo o controle e me bateu uma tristeza sem tamanho por jogar no lixo um trabalho de dois anos”, diz Claudia, que já voltou à luta contra a balança. Físico e emocional caminham lado a lado nas questões relacionadas a peso.

Novos hábitos: o consumo de leite e derivados nos mercados cariocas aumentou 72% (Tânia Rêgo/Agência Brasil)

É muito comum que as pessoas recorram à alimentação para ativar o mecanismo de recompensa cerebral e, assim, reduzir níveis de ansiedade e depressão. É o chamado comer hedônico, regido pela sensação de prazer”, diz o psiquiatra Jose Carlos Appolinario, coordenador do Grupo de Obesidade e Transtornos Alimentares do Instituto de Psiquiatria da UFRJ.

Os estudos sobre alimentação na quarentena mostram ainda que a qualidade foi se perdendo conforme as semanas se passavam. No começo, era comum as famílias passarem horas elaborando pratos saudáveis, cheios de verduras e legumes, mas aos poucos os industrializados reassumiram seu lugar de destaque na dieta.

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Pesquisa da Associação de Supermercados do Estado do Rio de Janeiro (Asserj) revelou que, nos últimos cinco meses, houve crescimento de 67% nas vendas de biscoito recheado em comparação ao mesmo período de 2019. A demanda por leite cresceu 72% e por pão francês, 30%.

De volta aos esportes e à dieta: o arquiteto Denis Rennó eliminou 10 quilos (Léo Lemos/Veja Rio)

“A minha fuga era comer doce, preparar massas. Eu me distraía assim”, conta o arquiteto Denis Rennó, 46 anos. Com 1,82 metro e esportista, ele viu pela primeira vez na vida a balança registrar 101 quilos, 10 a mais do que antes do isolamento. “As roupas não entravam e bateu o desespero”, relata Rennó, que, desde julho, retomou os jogos de tênis, as trilhas de bicicleta e entrou em uma dieta de baixa ingestão de carboidratos para reverter o prejuízo. Resultado: já perdeu os excessos adquiridos durante o isolamento.

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Mais da metade da população brasileira – 55,4% – está com excesso de peso e 20,3% se encontram no estágio de obesidade. O Rio, sempre associado a boa forma e vida saudável, supera a média nacional: 21,7% dos cariocas estão com sobrepeso e 57,1% são obesos – uma estatística alarmante, considerando-se que a obesidade é o fator de mais alto risco para pacientes de Covid-19 abaixo dos 60 anos.

(Redação/Veja Rio)

“Estar acima do peso, mesmo na ausência de outras doenças metabólicas, já deixa o organismo vulnerável às formas mais graves de quadros infecciosos”, explica Rodrigo Moreira, presidente da SBEM. Um estudo patrocinado pelo governo britânico mostrou que pessoas com IMC acima de 35 têm probabilidade 40% maior de morrer da doença, e o primeiro-ministro Boris Johnson, que estava acima do peso, contraiu o novo coronavírus e precisou ser internado, tornou-se enfático defensor da alimentação saudável – ele estuda ainda proibir o anúncio de junk food antes das 21 horas na TV e limitar sua promoção em lojas.

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“A Covid-19 contribuiu para o reconhecimento da obesidade como uma doença potencialmente mortal”, diz o endocrinologista Walmir Coutinho, diretor do Departamento de Medicina da PUC-Rio. Fabiano Serfaty, mestre em endocrinologia e pesquisador da Uerj, vai mais longe: “Estamos vivendo duas pandemias globais em franca expansão, a do novo coronavírus e a da obesidade. Trata-se de uma combinação gravíssima, espécie de bomba-relógio”. Perder peso, nesta saída do isolamento social, deixou de ser uma questão de simples vaidade.

 

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