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Por Patrícia Lins e Silva, pedagoga
Educação
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Filosofia para tempos incertos

Para os estoicos, a gente deve mudar o que pode e aceitar o que não pode

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Atualizado em 5 out 2020, 09h05 - Publicado em 5 out 2020, 09h04

           A vacina contra a Covid-19 ainda não chegou, a economia ainda não garante que nosso trabalho esteja seguro e a vida não parece que voltará a ser como era antes da pandemia. E tudo isso tem consequências complicadas e traz muita incerteza. É natural que estejamos inquietos.

        Nós, humanos, não gostamos de incertezas e diz-se que, para evitá-las, preferimos um mau resultado conhecidodo que um resultado desconhecido que talvez seja bom.

        O professor de psicologia em Harvard, Daniel Gilbert, afirma que a incerteza pode ser prazerosa, dependendo de como chega e em que dose chega. Nos filmes ou livros policiais e de mistério, por exemplo, o suspense nos agrada. O bilhete de um admirador secreto nos diverte e estimula. No entanto, insistimos em acreditar que seremos mais felizes sem incertezas.

         Apesar dessa nossa aversão, a imprecisão em relação ao que nos espera pode impulsionar uma busca por conhecimento. O pensamento criativo é ligado à capacidade de tolerar a incerteza e a indefinição. Os cientistas, por exemplo, convivem com as incógnitas de suas pesquisas. O físico Richard Feynman, prêmio Nobel em Eletrodinâmica Quântica, disse “eu não me sinto assustado por não saber das coisas, por estar perdido em um universo misterioso sem nenhum propósito.” O poeta inglês John Keats escreveu que os escritores são mais criativos quando “são capazes de mergulhar em incertezas, mistérios, dúvidas…”.

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          No momento, a covid-19 atingiu o planeta todo, não sabemos quando vai acabar, e a sensação de falta de perspectiva e de estabilidade nos cobre  de uma incerteza sombria que afeta nosso humor. Para o professor Gilbert, há duas maneiras para enfrentar esse temor do desconhecido: uma delas é diminuir a sensação de risco e a outra é aumentar a tolerância à incerteza.

         A filosofia talvez possa ajudar. Os filósofos gregos já falavam de incerteza e impermanência. Os estoicos, que viveram tempos turbulentos – Atenas tinha perdido parte de sua independência e a morte de Alexandre, o Grande, anos antes, deixara um vácuo de poder – estão sendo resgatados por muita gente hoje – não apenas filósofos –   porque seu pensamento cabe bem em tempos complexos. Suas questões são atemporais, como nossos desafios emocionais diante das adversidades cotidianas. Valorizam as ações sobre as palavras e, entre outras ideias, afirmam que não podemos controlar grande parte da nossa vida, mas podemos controlar o que nos é interno, nossos estados mentais e emocionais; podemos controlar nossas opiniões, impulsos, desejos e aversões. Para os estoicos, a gente deve mudar o que pode e aceitar o que não pode.

           Pensando assim, não podemos evitar as mudanças reais que vivemos hoje, mas podemos controlar nossas reações. Se trabalhamos em casa e precisamos cuidar de uma criança pequena temos uma realidade que não podemos mudar. Mas podemos controlar nossa reação, nosso modo de viver, reorganizar a maneira de trabalhar, recorrer à tolerância.

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             Já os filósofos japoneses celebram a incerteza e a impermanência. Um bom exemplo é a floração das cerejeiras, que dura muito pouco e é famosa por sua beleza. Provoca grande prazer estético cuja “beleza está no próprio desaparecimento”, lembra o autor de A Tractate on Japanese Aesthetics, Donald Richie.   

         A pandemia evoca a transitoriedade das coisas e de nós mesmos. Sabemos que a única certeza da vida é que tudo, um dia, deixará de existir, o que, nos tempos que correm, é uma premissa incômoda de lembrar. Mas podemos tornar a reflexão sobre o que é inevitável numa busca de sentido para nossas vidas.

         O isolamento a que fomos obrigados pode ser uma oportunidade para procurarmos nos tornar pessoas melhores, para expandir nossas mentes e refletir sobre os caminhos que a humanidade trilha e sobre a qualidade do mundo que desejamos deixar para as outras gerações. Podemos passar a agir em defesa da vida, a nos mobilizar para evitar outros eventos desastrosos e a colaborar na construção de um ambiente global saudável, justo e harmônico.

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