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Por Analice Gigliotti, Elizabeth Carneiro e Sabrina Presman
Psiquiatria
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“The Crown”: cada família é infeliz à sua maneira

Série mostra que poder, dinheiro e fama não poupa a família mais famosa do mundo de problemas

Por Analice Gigliotti
Atualizado em 18 dez 2020, 09h30 - Publicado em 18 dez 2020, 09h13

“Todas as famílias felizes se parecem, cada família infeliz é infeliz à sua maneira”. A máxima do autor russo Leon Tolstói soa como saborosa ironia quando pensamos na Família Real Britânica, retratada com brilhantismo na serie “The Crown” (Netflix). Nenhuma família no mundo foi tão poderosa, admirada e imitada a partir da segunda metade do século XX. No entanto, acredito que poucas foram tão infelizes.

Ao longo desta quarta temporada que estreou há poucas semanas, a Rainha Elizabeth reafirma que pertencer à família real “é destino”. O que a série mostra é que para além dos bailes e jantares de gala, o pacote do tal “destino” contempla solidão, infelicidade, tédio e perda de privacidade.

O marido e os filhos da rainha se sentem inúteis, peças acessórias que orbitam em torno do centro do poder: a rainha Elizabeth e, um dia, Charles. “The Crown” mostra um núcleo familiar lidando com a frustração de indivíduos que não podem realizar os próprios desejos profissionais, amorosos ou pessoais em nome de uma causa maior: a Coroa e modus operandi que ela impõe.

Nesse contexto, uma das personagens mais interessantes é a princesa Margaret, vivida por Helena Boham-Carter. Ao longo de décadas, a irmã caçula de Elizabeth assiste a rainha exercendo o poder, sem um papel para si mesma. Margaret sabe que jamais será rainha, e mesmo assim não pode amar os homens que quis e sequer tem uma função social clara. Quando desabafa com a irmã que se sente inútil, é surpreendida com a destituição das suas funções reais em favor do sobrinho. Não é uma decisão da “irmã”, mas da “rainha”. Para azar de Margaret, quis o tal destino, que fossem a mesma pessoa. A tristeza arrasta Margaret para um espiral de festas e consumo de bebida alcoólica, tudo em suprir um vazio que, ela sabe, jamais será superado.

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No entanto, ao contrário de Margaret, que apenas reagia à vida que não escolheu, a jovem Lady Di se deslumbrou com o status real e cedeu aos cortejos hesitantes do Príncipe Charles. Não era Diana quem ele queria, mas sim Camilla Parker Bowles, a mulher impossível por já ser casada com outro homem. Reprimida e infeliz, cerceada e vigiada, segura de que o marido amava outra mulher, Diana passou a ser consumida pela bulimia. A princesa oscilava entre comer exageradamente e episódios recorrentes de vômitos. Tal como na alimentação, tinha no amor um sentimento de perda de controle, variando da ausência ao excesso, com os inúmeros amantes que a atribuiram.

De Shakespeare a Nelson Rodrigues, a ficção sempre foi hábil em retratar a família como um microcosmo social, com todas as suas virtudes e defeitos. No caso de “The Crown”, o curioso é acompanhar “a vida como ela é” das portas do Palácio de Buckingham pra dentro e descobrir que ela pode não ser muito diferente da família de qualquer espectador. Para sustentar as aparências e se manter de pé, a família mais observada do mundo achou uma forma de ser infeliz à sua maneira.

Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp; professora da Escola Médica de Pós-Graduação da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.

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