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Por Analice Gigliotti, Elizabeth Carneiro e Sabrina Presman
Psiquiatria
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Cigarro não é feijão

Elevação do imposto não tem contraindicação: afasta jovens do vício e não aumenta o comércio ilegal

Por Analice Gigliotti
Atualizado em 6 set 2021, 12h56 - Publicado em 6 set 2021, 09h21

Num momento em que a economia vacila, a inflação aumenta e a conta de luz dispara, novas fontes de divisas para os governos são mais que bem-vindas, são necessárias. E se tal receita ainda trabalha para preservar a saúde da população e diminuir os custos do SUS a longo prazo, é o tão desejado modelo “ganha-ganha”. A população brasileira – calejada por tantos planos econômicos, década após década –, já chegou a tal conclusão. De acordo com pesquisa do Instituto Datafolha, a maioria dos brasileiros (68%) é a favor do aumento de impostos de produtos de tabaco como estratégia para reduzir o número de fumantes.

Segundo 54% dos entrevistados, o cigarro mais caro colabora para que o tabagista abandone o vício e evita que os mais jovens comecem a fumar. O suporte da população ao aumento da tributação mostra uma clareza de que um produto que comprovadamente faz mal à saúde não pode ter a mesma carga tributária que o feijão ou o arroz. O preço mínimo de um maço de cigarro no Brasil é cinco reais, enquanto que nos Estados Unidos custa 10 dólares. E mais: 71,5% apoiam a ideia de que as empresas fabricantes de cigarro devem ressarcir o Sistema Único de Saúde (SUS) pelos altos custos dos tratamentos das doenças em decorrência do tabagismo. Os números atestam o pleno entendimento da população sobre os malefícios do cigarro.

A pesquisa do Datafolha foi além e também ouviu os entrevistados a respeito dos cigarros eletrônicos: 72% já ouviram falar sobre eles, mas apenas 0,22% fazem uso diário. No entanto, os entrevistados tem a mais absoluta clareza sobre a finalidade de tal novidade. Para 84%, os dispositivos eletrônicos são uma forma da indústria de tabaco para angariar novos clientes e, de acordo com 78,3%, os cigarros eletrônicos levam os fumantes a mudarem de produto, mas continuarem dependentes do hábito de fumar.

A conclusão certeira faz com que 67,7% dos entrevistados acreditem que os cigarros eletrônicos não deveriam ser liberados. Contendo até três vezes mais nicotina – o equivalente a 20 cigarros comuns – e disfarçados em sabores adocicados, o cigarro eletrônico também está no radar do FDA (Food and Drugs Administration). Esta semana, o órgão regulador de medicamentos nos Estados Unidos proibiu três empresas de fabricarem e venderem cigarros eletrônicos aromatizados no país. Segundo o órgão, “não há evidências de que eles têm um benefício para fumantes suficiente para superar a ameaça à saúde publica representada pelos níveis alarmantes e bem documentados”. Ou seja: o FDA alerta para uma questão a qual o brasileiro já está atento, como atesta a pesquisa Datafolha.

Neste cenário, a pandemia é um fator novo – e desestabilizador – na curva descendente do consumo de cigarro no país: os fumantes eram 15% em 2006 e 9,3% em 2018, segundo o Ministério da Saúde. Porém, o consumo voltou a subir durante o isolamento social. A tensão, o tédio e a ansiedade serviram de gatilhos para recaída daqueles que já vinham numa rota de abstinência do cigarro. Soma-se a isto os tabagistas que acabaram abandonando tratamentos de controle sobre o vício:  de acordo com o INCA, a queda foi de 66% em 2020, em comparação com 2019.

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Os dados da pesquisa do Datafolha foram apresentados, pela primeira vez, em audiência pública na Câmara dos Deputados. Cabe a eles, defensores dos interesses de seus eleitores, ouvirem o claro recado que sai da pesquisa: maior taxação sobre o cigarro é uma demanda popular. Ao contrário do que possa ser alegado, o aumento da tributação não contribui para o comércio ilegal. Estudos do Banco Mundial apontam que o contrabando de cigarros está vinculado ao crime organizado e à corrupção e sofrem pouca influência das diferenças de tributação entre países.

Portanto, aumentar o preço do cigarro é uma estratégia fácil, simples e, o mais importante, eficiente no controle do consumo de tabaco, semelhante ao que já vem sendo almejado para bebidas açucaradas e bebidas alcoólicas, tríade responsável pelo adoecimento de milhões de brasileiros, há gerações.

Analice Gigliotti é Mestre em Psiquiatria pela Unifesp; professora da Escola Médica de Pós-Graduação da PUC-Rio; chefe do setor de Dependências Químicas e Comportamentais da Santa Casa do Rio de Janeiro e diretora do Espaço Clif de Psiquiatria e Dependência Química.

 

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