Olimpíadas de Paris: o forte time de atletas cariocas que sonha com o ouro

Da ginástica artística à vela, passando pelo judô, o tiro com arco e o vôlei, esforçados esportistas chegam a Paris com sede - e chance - de pódio

Por Marcela Capobianco
19 jul 2024, 06h00
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Seleção carioca: Marcus D'Almeida, do tiro com arco; Martine Grahel e Kahena Kunze, da vela; Rebeca Andrade, da ginástica artística, e Bruninho, capitão da seleção masculina de vôlei representam o Rio em Paris-2024 (COB/Divulgação)
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Todas as atenções se voltarão para Paris entre 26 de julho e 11 de agosto, e a razão não está nos açucarados macarons nem na coleção de cartões-postais que ajudam a contar a história ocidental e ainda rendem cliques aos montões. Nessa breve janela de tempo, a Cidade-Luz respirará os ares da Olimpíada, a terceira que sedia, e a expectativa é de que a festa seja acompanhada por milhões de pessoas planeta afora.

São 45 modalidades, desde as mais tradicionais — atletismo, natação, lutas — até o novato breaking dance. A delegação brasileira conta com 277 atletas disputando medalha em 39 modalidades — e pelo menos 42 deles são nascidos em território fluminense. Outros tantos, graças ao legado da Rio 2016, orgulham-se de chamar a Cidade Maravilhosa de casa, já que é nestas praias que se preparam, no Centro de Treinamento do Comitê Olímpico Brasileiro, na Barra.

Essa, aliás, é uma vantagem que ajuda a fazer do Rio um vigoroso celeiro de esportistas de alta performance. “Há aqui uma boa integração entre as áreas da ciência do esporte que, em conjunto com as comissões técnicas, trabalham em busca do melhor desempenho”, explica Kenji Saito, diretor de desenvolvimento e ciências do esporte do COB.

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As primeiras modalidades a utilizar as instalações na Barra foram natação e tae kwon do. Hoje, grandes nomes do judô, do atletismo, do nado sincronizado, dos saltos ornamentais e da ginástica artística, entre outros, aproveitam o espaço.

O CT Time Brasil também conta com uma sala de força e condicionamento, a maior estrutura de preparação física de alto rendimento do país, e o laboratório olímpico do COB, com aparelhos ultramodernos — eles fornecem dados para auxiliar os técnicos a diminuir o risco de lesões e elevar a qualidade dos treinos.

Outra boa herança de 2016 são as estruturas, espalhadas por solo carioca, que têm abrigado cada vez mais torneios internacionais. Neste ano, o Rio foi palco de campeonatos mundiais de tiro esportivo, judô e ginástica. O Rio Open, em fevereiro, atraiu aficionados por tênis ao Jockey Club, enquanto em maio a Arena Carioca 1, no Parque Olímpico, sediou o WTT Contender, reunindo as grandes estrelas do tênis de mesa. Na ocasião, Hugo Calderano sagrou-se campeão. O jovem egresso do bairro do Flamengo, agora na Alemanha, é uma das apostas para subir ao pódio com o Hino Nacional ao fundo.

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Outros atletas embarcam para Paris envoltos em expectativa de pódios. Única carioca no tatame, Rafaela Silva, aos 32 anos, dorme e acorda com a obsessão de conquistar seu segundo ouro olímpico.

Já no piso emborrachado da ginástica artística, a carioca de coração Rebeca Andrade, 25 anos, trabalha para superar a incrível campanha de Tóquio, em 2021, quando pousou sobre o peito a prata no individual geral e o ouro no salto, tornando-se a primeira brasileira a ganhar láureas olímpicas na ginástica.

Cariocas da gema, Flávia Saraiva e Jade Barbosa, que compõem o time, também podem cravar seus nomes no panteão dos Jogos. Numa estimativa do COB, o Brasil tem chances de amealhar mais de vinte pódios. Nas próximas páginas, conheça os atletas — que nasceram na cidade ou a adotaram — que, a tirar pelos últimos resultados, podem sonhar com as medalhas que contêm, todas elas, fragmentos da Torre Eiffel. O treinamento está em dia e a sorte foi lançada.

A grande aposta

A ginasta Rebeca Andrade é candidata a medalha em quatro modalidades

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Rebeca Andrade: “Cuido bastante da saúde mental para dar o meu melhor. Se vier medalha, será maravilhoso” (Olivier Matthys/EPA/EFE/Divulgação)
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Em maio, a maior ginasta brasileira cravou mais um feito em sua extraordinária jornada, este fora dos estádios: virou Barbie, sinal de sua popularidade. Rebeca Andrade foi homenageada com uma boneca à sua imagem e semelhança, como ocorreu com a tenista americana Venus Williams, numa ação da fabricante Mattel com o propósito de, além de vender, incentivar a permanência de meninas no esporte. Os resultados recentes da jovem de 25 anos sinalizam que ela está no páreo para ocupar quatro pódios: barras assimétricas, salto, solo e individual geral, marca que a situará no mais elevado patamar de um atleta olímpico brasileiro na história, contando o que já conquistou em Tóquio (Robert Scheidt e Torben Grael, da vela, têm cinco medalhas cada um). “Cuido bastante da saúde mental para dar o meu melhor. Se vier medalha, será maravilhoso”, diz ela, que no Japão levou os inéditos ouro no salto e prata no individual geral.

Formada no Flamengo, onde treina desde 2011, Rebeca percorreu uma trajetória de superação para chegar ao ponto atual. Sua mãe, Rosa, é empregada doméstica e criou sozinha sete filhos, em Guarulhos, na Grande São Paulo. A ginasta ficou fascinada pelos aparelhos bem nova, aos 4 anos, em um projeto social de iniciação ao esporte. Sua primeira referência foi Daiane dos Santos, a dona do mais belo duplo twist carpado, que também rompeu barreiras. Em outubro de 2023, no Mundial de Ginástica da Antuérpia, Rebeca foi aplaudida e reverenciada pela americana Simone Biles, com quem travará alguns dos mais aguardados duelos dos Jogos. Na ocasião, as duas dividiram cinco pódios (com Simone levando a melhor). “Fico feliz em ver que há muitas mulheres em posição e situação de destaque hoje em dia. Isso mostra que a sociedade vem reconhecendo o talento, o valor e a capacidade delas”, sublinha Rebeca, que há três anos ostenta o título de cidadã carioca honorária. Essa gigante de 1,55 metro já é campeã.

BOAS DE BRIGA. Flávia Saraiva, 24 anos, e Jade Barbosa, 33, também estarão na batalha por medalhas. Depois de encarar uma cirurgia no tornozelo, cujo processo de recuperação quase a fez desistir da ginástica, Flávia colecionou cinco pódios no Pan de Santiago, tornando-se a maior medalhista do Brasil na competição. Jade, que se prepara para sua terceira incursão olímpica, conquistou o ouro no solo na etapa da Turquia do Mundial de Ginástica, radiante em nova coreografia ao som de Baby One More Time, de Britney Spears.

Meu tatame, minha vida

Nascida e criada na Cidade de Deus, Rafaela Silva está na luta outra vez

CELEIRO DE MEDALHAS - O primeiro ouro do Brasil no judô foi do paulistano Aurélio Miguel, em Seul, em 1988. Em Londres 2012, a piauiense Sarah Menezes foi a primeira brasileira no lugar mais alto do pódio. A modalidade é a que maior número de medalhas rendeu ao Brasil em Olimpíadas, com 24 até o momento. Neste ano, a gaúcha Mayra Aguiar pode fazer história, ao se tornar a primeira judoca com quatro medalhas consecutivas.
Rafaela Silva: com fome de ouro, ela não pretende parar tão cedo (Buda Mendes/Getty Images)
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A rotina é para lá de puxada: duas horas de treino físico pela manhã, 1 hora e 20 minutos de treino técnico e mais um par de horas no tatame à tarde — tudo no cronômetro. No fim do dia, Rafaela Silva ainda assiste a vídeos para identificar os pontos fracos das oponentes. Ela não pensa em outra coisa senão Paris. “Depois de oito anos do meu ouro olímpico, sou grata por poder competir mais uma vez. Sei que tudo pode acontecer, mas só penso no lugar mais alto do pódio”, diz a atleta de 32 anos que, em 2023, conquistou a medalha dourada inédita no Pan-americano. Bicampeã mundial, ela é dura na queda — já deu a volta por cima ao superar uma suspensão por doping em 2019, que a deixou de fora dos Jogos no Japão. “Há mais de dez anos conto com a ajuda da coach Nell Salgado, que sempre me lembra de algo importante: se fico estressada, acabo me afastando dos verdadeiros objetivos”, diz.

Nos momentos de alta tensão, Rafaela logo pensa em comida (devorar uma pizza, um hambúrguer), mas garante que não foge da dieta. “Quando o nervosismo aperta, eu peço ajuda à nutricionista, que costuma liberar uma paçoquinha”, conta a atleta, nascida e criada na Cidade de Deus. Revelada ainda na adolescência como um dos talentos do Instituto Reação, a judoca é a prova de que o esporte pode transformar realidades. “O judô é a minha vida desde os 5 anos. Se estou pisando no tatame, estou respirando”, resume ela, que não pretende parar tão cedo. Los Angeles, em 2028, está nos planos, assim como a maternidade. Ela e a esposa, Eleudis Valentim, também faixa preta, não veem a hora. Mas é preciso esperar Paris passar, de preferência com muito brilho.

CELEIRO DE MEDALHAS. O primeiro ouro do Brasil no judô foi do paulistano Aurélio Miguel, em Seul, em 1988. Em Londres 2012, a piauiense Sarah Menezes foi a primeira brasileira no lugar mais alto do pódio. A modalidade é a que maior número de medalhas rendeu ao Brasil em Olimpíadas, com 24 até o momento. Neste ano, a gaúcha Mayra Aguiar pode fazer história, ao se tornar a primeira judoca com quatro medalhas consecutivas.

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Continue a nadar

Não dá para perder as potentes braçadas de Guilherme Costa nas piscinas e no Sena

FENÔMENO DAS RAIAS - Companheira de clube de Guilherme, Mafê Costa disputou três provas e chegou a três finais no Mundial de Esportes Aquáticos no Catar, em fevereiro, tornando-se a primeira brasileira a figurar numa decisão dos 200 metros nado livre. A carioca de 21 anos terminou em quinto lugar e com o recorde sul-americano. Como os índices melhoram a cada competição, especialistas dizem que também ela pode sonhar com um pódio em Paris.
Guilherme Costa: o Cachorrão tem fôlego de sobra para figurar nos pódios parisienses (Wander Roberto/COB/Divulgação)
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Embora esteja sempre dentro d’água, o apelido do atleta de 25 anos é de um animal terrestre — Cachorrão. A alcunha o acompanha desde um episódio na adolescência. O carioca jogava altinha com os amigos em Angra dos Reis e levou uma mordida de um cão feroz. No dia seguinte, já era Cachorrão, e assim ficou. Na piscina, ele está mais para tubarão. É no mundo aquático que vem acumulando medalhas — ostenta o posto de recordista sul-­americano nos 400, 800 e 1 500 metros, além de ter sido finalista olímpico nos 800 metros nado livre. Do último Pan-Americano, realizado em 2023, em Santiago, no Chile, voltou com quatro ouros. “A torcida, grande e sempre entusiasmada, ajudou muito. Esse apoio faz diferença principalmente nas largadas”, diz, deixando recado.

Morador de Santos, no litoral paulista, o atleta da equipe da Unisanta se inspira em outros ases das piscinas, como Gustavo Borges, o primeiro brasileiro a acumular três medalhas olímpicas, e Thiago Pereira, prata nos 400 metros medley em Londres, em 2012. Quando está de folga, gosta de jogar futevôlei na Barra da Tijuca e de apreciar a beleza da Joatinga, emendando com um restaurante japonês. “Curto muito a vocação da cidade para o lazer ao ar livre. O Rio é maravilhoso para quem gosta de esporte”, afirma. Como se não bastassem todos os desafios das piscinas, Guilherme também vai se arriscar na maratona aquática, no Rio Sena. Com a ausência de brasileiros na categoria masculina, o nadador aproveitou o índice conquistado na prova dos 800 metros e oficializou sua inscrição na prova de 10 quilômetros. Haja fôlego.

FENÔMENO DAS RAIAS. Companheira de clube de Guilherme, Mafê Costa disputou três provas e chegou a três finais no Mundial de Esportes Aquáticos no Catar, em fevereiro, tornando-se a primeira brasileira a figurar numa decisão dos 200 metros nado livre. A carioca de 21 anos terminou em quinto lugar e com o recorde sul-americano. Como os índices melhoram a cada competição, especialistas dizem que também ela pode sonhar com um pódio em Paris.

Entre corpo e mente

O focado Hugo Calderano, cria do Fluminense, busca a primeira medalha brasileira no tênis de mesa

MADE IN CHINA - Dominado pelos países asiáticos, sobretudo pelos chineses, o tênis de mesa foi incorporado aos Jogos em 1988, na edição de Seul, na Coreia do Sul. O Brasil vem aos poucos se infiltrando na modalidade. Na última Olimpíada, em Tóquio, Hugo Calderano fechou a competição em quinto lugar no torneio individual, a melhor marca já obtida pelo país. Antes dele, o também brasileiro Hugo Hoyama, que é fã de Calderano, havia encerrado Atlanta, em 1996, na nona colocação individual.
Hugo Calderano: “Sou jovem e, ao mesmo tempo, experiente. Lidar com a pressão é um dos meus pontos fortes”, garante (VCG/Getty Images)
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Nascido no bairro do Flamengo, o atleta, que hoje ocupa o sexto lugar no ranking mundial de tênis de mesa e vem obtendo excelentes resultados nos últimos tempos, chegou a ter duas obsessões na arena esportiva. Dos 8 aos 13 anos, Hugo Calderano passava grande parte de seu dia bem perto de casa, na sede do Fluminense, onde ora treinava saques com bola de vôlei, ora com a bolinha que hoje lhe é tão cara. Avaliou que, com seu 1,82 metro, talvez não tivesse tanta chance assim no vôlei e, no início da adolescência, ficou com o tênis de mesa, mudando-se para São Caetano do Sul, no interior paulista, para treinar com a seleção brasileira. “É um esporte individual, muito dinâmico, que desafia o corpo e a mente”, diz o atleta, tricampeão latino-americano e atual tricampeão pan-americano. Este ano tem sido promissor: ele conquistou dois títulos e garantiu o vice-campeonato em outros dois torneios organizados pela World Table Tennis (WTT).

Aos 28 anos, no auge da carreira, Calderano deu um gás na preparação física para recuperar-se o mais rápido possível de uma lesão na lombar, que não o impediu de jogar, e tenta suavizar as cobranças para voltar de Paris com uma medalha. “Sou jovem e, ao mesmo tempo, experiente. Lidar com a pressão é um dos meus pontos fortes”, garante ele, confiante. Em 2014, Hugo fez história, conquistando a medalha de bronze nos Jogos Olímpicos da Juventude, na China. Foi naquele ano que ele decidiu se mudar para a Alemanha, onde é titular no clube Ochsenhausen. “Moro em uma cidade pequena, boa para os meus objetivos. Só não é perfeita porque não encontro arroz, feijão e pão de queijo”, brinca o atleta, que não vê a hora de passar uns dias de folga no Rio depois da Olimpíada e das competições da liga alemã, uma logo após a outra. Que seja também para celebrar Paris.

MADE IN CHINA. Dominado pelos países asiáticos, sobretudo pelos chineses, o tênis de mesa foi incorporado aos Jogos em 1988, na edição de Seul, na Coreia do Sul. O Brasil vem aos poucos se infiltrando na modalidade. Na última Olimpíada, em Tóquio, Hugo Calderano fechou a competição em quinto lugar no torneio individual, a melhor marca já obtida pelo país. Antes dele, o também brasileiro Hugo Hoyama, que é fã de Calderano, havia encerrado Atlanta, em 1996, na nona colocação individual.

O ouro na mira

Atleta do tiro com arco, Marcus D’Almeida treina doze horas por dia

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Marcus D’Almeida: “Ninguém nunca atingiu a precisão máxima no tiro com arco. Eu sou um dos tantos na busca desse resultado”, fala o jovem (Alexandre Loureiro/COB/Divulgação)

Quem vê Marcus D’Almeida compenetrado, prestes a acertar o alvo num gesto de leveza, nem imagina que a carga sobre o corpo do atleta no instante do tiro seja de 25 quilos. O arco ainda acrescenta 4,5 quilos aos ombros do carioca de 26 anos. Seus movimentos, repetidos cerca de 300 vezes ao dia, são ultrafocados, envoltos em frieza e severa autocrítica. “Com o tempo, eu aprendi a extrair aprendizado de cada derrota”, disse Marcus a VEJA em abril. Atual número 1 do mundo no tiro com arco, existente desde os primórdios da humanidade, ele treina incansavelmente doze horas diárias, embalando o sonho de trazer para casa uma medalha inédita para o Brasil. Esta é a terceira incursão olímpica de Marcus, que estreou na Rio 2016, quando foi eliminado na primeira rodada. Já em Tóquio, o atleta garantiu o melhor resultado da história do Brasil no esporte ao vencer o holandês Sjef van den Berg. Deixou a competição nas oitavas de final, mas em curva ascendente.

Ele é morador de Maricá, na região metropolitana, que se tornou a meca do tiro com arco no Brasil, já que a Confederação Brasileira se instalou por lá em 2010. Hoje, há 2 000 atletas federados, que têm no carioca um ídolo. “Ninguém nunca atingiu a precisão máxima no tiro com arco. Eu sou um dos tantos na busca desse resultado”, fala o jovem, que já se projeta a 70 metros do alvo posicionado na vasta esplanada em frente ao Hôtel des Invalides, onde fica o túmulo de Napoleão Bonaparte, disparando flechas que superam 220 quilômetros por hora. Para aplacar a ansiedade, Marcus joga videogame, estuda teoria musical e está sempre ao lado da noiva, Bianca Rodrigues, também adepta da modalidade. Em sua casa, dedica um quarto só para seus troféus e medalhas. O plano é adicionar mais uma à coleção.

NOVA CONVOCADA. Marcus D’Almeida vai encarar o torneio de duplas mistas em Paris ao lado de Ana Luiza Caetano, 22 anos, nascida em Maricá. Ela foi convocada pelo COB para ocupar a posição garantida por Ana Machado no Pan de Santiago. Primeira mulher no pódio da modalidade em Pan-americanos, Ana Machado cravou um feito na competição ao faturar duas pratas, mas acabou perdendo a vaga olímpica para Ana Luiza.

Jogador caro

Aos 22 anos, o atacante Darlan é a estrela da seleção masculina de vôlei

NOVA GERAÇÃO - A seleção feminina de vôlei terminou a Liga das Nações em quarto lugar e chega a Paris com determinação para tentar o sexto pódio olímpico, após ouros em Pequim e Londres, uma prata em Tóquio e dois bronzes, em Atlanta e Sydney. Único técnico tricampeão olímpico, José Roberto Guimarães também tem chance de se tornar o primeiro treinador a acumular quatro medalhas douradas.
Darlan, do vôlei: com a camisa do Sesi-Bauru, ele foi o maior pontuador do país, batendo recordes de bolas no chão do adversário neste ano (Mark Fredesjed Cristino/Getty Images)

O jovem integrante da seleção masculina de vôlei, de 22 anos, chama atenção pelo carisma e pela habilidade para atrair holofotes. Era uma criança caseira, que não gostava de se exercitar, até que passou a acompanhar os jogos do irmão do meio, Alan, pelo Botafogo. Atualmente, os dois são colegas no escrete verde e amarelo. Quando começou a jogar, Darlan, nascido e criado em Nilópolis, na Baixada Fluminense, descolou um teste para a equipe do Flamengo. Como seus pais não conheciam o caminho, acabaram chegando ao clube com duas horas de atraso. E o menino perdeu a vaga. Não passou muito tempo, surgiu uma oportunidade no time da AABB, a 240 metros da sede rubro-negra. Deu certo. Hoje, ele é uma espécie de ídolo pop do vôlei, conhecido por fazer em quadra gestos do anime japonês Naruto. “Quem me vê dançando na quadra não imagina que, na vida, sou tímido. Tem o Darlan do vôlei e o Darlan de casa”, diz o atleta.

Quis o destino que sua primeira grande chance na seleção viesse justamente como substituto do irmão numa situação para lá de tensa. Durante uma partida pela Liga das Nações, em 2022, contra a equipe iraniana, Alan rompeu o tendão ao levantar a bola para o saque. “Já teria sido horrível ver um companheiro de time se machucar, mas o desespero foi em dobro ao saber que era o meu irmão que estava chorando de dor”, lembra. Neste ano, com a camisa do Sesi-Bauru, Darlan foi o maior pontuador do país, batendo recordes de bolas no chão do adversário. Tanto vigor lhe rendeu o título de MVP (o jogador mais valioso) da Superliga masculina. Quarenta anos após a primeira medalha olímpica conquistada pela seleção (prata, em Los Angeles), ele não desanima diante dos últimos resultados — na Liga das Nações, o Brasil caiu nas quartas e passou para o sétimo lugar do ranking mundial. Outro carioca, Bruninho, de 38 anos, capitão da equipe, é também trunfo do técnico Bernardinho, seu pai. Ele é o grande motivador do time que embarca para Paris com o objetivo de virar o jogo.

NOVA GERAÇÃO. A seleção feminina de vôlei terminou a Liga das Nações em quarto lugar e chega a Paris com determinação para tentar o sexto pódio olímpico, após ouros em Pequim e Londres, uma prata em Tóquio e dois bronzes, em Atlanta e Sydney. Único técnico tricampeão olímpico, José Roberto Guimarães também tem chance de se tornar o primeiro treinador a acumular quatro medalhas douradas.

Elas querem mais

Martine Grael e Kahena Kunze tentam o inédito tricampeonato na vela

DE VOLTA AO JOGO - Bronze em Pequim, a velejadora carioca Isabel Swan, 40 anos, volta aos Jogos após um hiato de oito anos. Ela disputa a classe 470 mista, com o também carioca Henrique Haddad. Em paralelo, Marco Grael, irmão de Martine, terá em Marselha sua terceira chance olímpica, ao lado do gaúcho Gabriel Simões. Gabriella Kidd, Marina Ardnt e João Bulhões são outros cariocas na vela, o esporte que mais ouros trouxe ao Brasil (até agora).
Kahena Kunze e Martine Grael: “A gente tem que entender que o esporte tem ciclos, uma hora atingimos o pico, depois estamos em baixa”, explicam (Miriam Jeske/COB/Divulgação)

Quando Torben Grael, 63 anos, participou de sua primeira Olimpíada, a de Los Angeles, em 1984, nem sequer existia disputa feminina na vela. Quatro décadas depois, ele suspira aliviado ao perceber um avanço, em sua própria família — também velejadora, a filha, Martine, de 33 anos, já tem duas medalhas de ouro olímpicas. Sinal de novos ventos, o esporte contabiliza hoje o mesmo número de homens e mulheres nas diferentes classes da vela. A quantidade de pódios em Jogos também é igual, para eles e para elas. Embaladas pelo entusiasmo e pela técnica, Martine e Kahena Kunze, paulistana radicada no Rio desde os 10 anos e também filha de velejador, vão desbravar as águas de Marselha, no sul da França, sede das competições náuticas. Alimentam o objetivo de conquistar o tricampeonato inédito para o Brasil. Em março, elas encerraram o Campeonato Mundial de 49erFX, nas Ilhas Canárias, em quarto lugar, mostrando capacidade de recuperação após alguns resultados não tão satisfatórios.

A dupla aterrissou na França bem antes do início dos Jogos, para se familiarizar com os ventos. “A gente tem que entender que o esporte tem ciclos, uma hora atingimos o pico, depois estamos em baixa. Tivemos que escolher a dedo os campeonatos dos quais participamos este ano, para chegarmos bem dispostas à Olimpíada”, explicou Martine em entrevista a Fátima Bernardes, em seu canal no YouTube. As duas conquistaram o primeiro título juntas em 2009, no Mundial Júnior da classe 420. Curiosamente, ambas começaram a cursar engenharia ambiental e daí passaram quatro anos em rumos diferentes. A parceria voltou em 2013, e elas trancaram a faculdade, já que não dava para levar os estudos junto com a vela. Valeu a pena. A partir daí, vieram pódios em campeonatos mundiais, nos Pan-americanos de Lima, em 2019, e Santiago, em 2023, e nas Olimpíadas de 2016 e 2021. O vento parece mesmo estar a favor delas.

DE VOLTA AO JOGO. Bronze em Pequim, a velejadora carioca Isabel Swan, 40 anos, volta aos Jogos após um hiato de oito anos. Ela disputa a classe 470 mista, com o também carioca Henrique Haddad. Em paralelo, Marco Grael, irmão de Martine, terá em Marselha sua terceira chance olímpica, ao lado do gaúcho Gabriel Simões. Gabriella Kidd, Marina Ardnt e João Bulhões são outros cariocas na vela, o esporte que mais ouros trouxe ao Brasil (até agora).

Um cenário campeão

Carol Solberg e Bárbara Seixas vão trocar as areias do Leblon pelas da Torre Eiffel

A BASE VEM FORTE - O vôlei de praia deu as primeiras medalhas ao Brasil em Atlanta, em 1996, com uma bela final 100% brasileira na disputa feminina. Desde então, a modalidade acumulou três ouros, seis pratas e três bronzes. Na edição de Paris, mais três duplas vão duelar em frente à Torre Eiffel: Ana Patrícia e Duda, André Stein e George Wanderley e o carioca Evandro Gonçalves ao lado de Arthur Lanci.
Bárbara Seixas e Carol Solberg: “Não somos jogadoras extremamente altas, mas conseguimos equilibrar isso com muita química e versatilidade”, analisa Carol. (Gregor Fischer/dpa/Getty Images)

Quem nunca sonhou em ter um escritório na praia? Pois essa é a realidade das cariocas Carol Solberg e Bárbara Seixas, que costumam bater ponto nas areias do Leblon, treinando duro — disciplina que lhes valeu a vaga olímpica. Em breve, a visão do Morro Dois Irmãos cederá lugar à da Torre Eiffel. Às margens do ícone-mor parisiense foram instaladas as arenas de vôlei de praia. Ambas com 36 anos (nasceram com três dias de diferença), Carol e Bárbara têm também a mesma altura, 1,78 metro, e mais de duas décadas de amizade. Embora já jogassem juntas na adolescência, a dobradinha profissional começou em 2021. O ápice vem agora, após uma boa performance no Circuito Mundial, sobretudo no torneio do Catar, no qual conquistaram o título. “Não somos jogadoras extremamente altas, mas conseguimos equilibrar isso com muita química e versatilidade”, analisa Carol.

Filha de Isabel Salgado (1960-2022), jogadora de vôlei que participou dos jogos de Moscou e Los Angeles, Carol se sente pronta para encarar sua primeira experiência olímpica. Já Bárbara guarda com todo o cuidado a medalha de prata conquistada no quintal de casa, ao lado de Ágatha Rippel, na Olimpíada carioca de 2016. Em meio à puxada rotina de treinos sob sol inclemente, Carol ainda toca o Instituto Levante, que oferece aulas gratuitas de vôlei de praia a crianças do Vidigal e da Cruzada São Sebastião, no Leblon. “À primeira vista, a praia parece um lugar democrático, mas quem vive na favela não tem o mesmo tratamento de quem mora no asfalto”, disse a VEJA RIO. Politizada, em 2020 ela chegou a ser advertida, e posteriormente absolvida, pelo Superior Tribunal de Justiça Desportiva ao entoar um “fora, Bolsonaro” na TV, após um jogo em Saquarema pelo Circuito Brasileiro. O que não falta é consciência à dupla egressa das areias cariocas.

A BASE VEM FORTE. O vôlei de praia deu as primeiras medalhas ao Brasil em Atlanta, em 1996, com uma bela final 100% brasileira na disputa feminina. Desde então, a modalidade acumulou três ouros, seis pratas e três bronzes. Na edição de Paris, mais três duplas vão duelar em frente à Torre Eiffel: Ana Patrícia e Duda, André Stein e George Wanderley e o carioca Evandro Gonçalves ao lado de Arthur Lanci.

Peixe dentro d’água

Nascido em Saquarema, João Chianca é o caçula do time de surfistas brasileiros

ALÉM-MAR - O surfe foi alçado a esporte olímpico nos Jogos de Tóquio, em 2021, e o Brasil conquistou uma medalha de ouro logo de cara, com o potiguar Ítalo Ferreira. Os primeiros registros do esporte datam do século XVIII, justamente na Polinésia Francesa, onde a competição será realizada. O Taiti fica a mais de 15 600 quilômetros de Paris, distância recorde para uma competição na história das Olimpíadas.
João Chianca: o Chumbinho se recuperou em tempo recorde após grave acidente no Havaí em dezembro de 2023 (Matheus Couto/Divulgação)

Bem cedo, ele mostrou que não é só filho — e irmão — de peixe. Aos 23 anos, João Chianca carrega no DNA uma adoração pelos oceanos. Seu pai, o ex-surfista Gustavo Chumbão, e o irmão mais velho, Lucas Chumbo, especialista em ondas gigantes, são seus grandes incentivadores. Tão potente rede de apoio foi fundamental para que João conseguisse se recuperar em tempo recorde de um grave acidente sofrido no Havaí em dezembro, poucos meses depois de conquistar a vaga olímpica. Durante um treino em Pipeline, Chianca caiu da prancha e acabou com um profundo corte na cabeça, além de uma fratura no crânio que o deixou desacordado. “Fui paciente comigo mesmo. E a terapia tem sido importante para lidar com os altos e baixos”, conta o surfista de Saquarema, na Região dos Lagos.

Foi em junho que veio a prova de fogo: de capacete, João regressou ao mar em El Salvador, na sétima etapa da WSL, a liga internacional do surfe. Agora, sente-se pronto para encarar as radicais ondas de Teahupoo, no Taiti, sede da competição olímpica. “Tenho certa intimidade com essa praia e estou bem seguro”, afirma ele, que vai compartilhar a jornada nos Jogos com a namorada, a também surfista Luana Silva, uma das três representantes do Brasil na equipe feminina. A parte difícil, sendo o mais novo, é acostumar-se ao convívio com os ídolos Gabriel Medina, 30 anos, a quem superou este ano, e Filipe Toledo, 29, agora companheiros de time. “Estou tentando tratar com normalidade”, conta, bem-humorado. “Para mim, é inacreditável alcançar o nível deles, um fator extra de motivação”, enfatiza o atleta, que acorda religiosamente às 6h para cair na água, seja no Recreio, em Saquarema ou na Polinésia Francesa. Que venham boas ondas.

ALÉM-MAR. O surfe foi alçado a esporte olímpico nos Jogos de Tóquio, em 2021, e o Brasil conquistou uma medalha de ouro logo de cara, com o potiguar Ítalo Ferreira. Os primeiros registros do esporte datam do século XVIII, justamente na Polinésia Francesa, onde a competição será realizada. O Taiti fica a mais de 15 600 quilômetros de Paris, distância recorde para uma competição na história das Olimpíadas.

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