Avatar do usuário logado
Usuário
OLÁ, Usuário
Ícone de fechar alerta de notificações
Avatar do usuário logado
Usuário

Usuário

email@usuario.com.br

Meio século de humor: Luiz Fernando Guimarães revisita sua trajetória

Ator comemora a efeméride com o espetáculo Curto-Circuito e a leveza de quem aprendeu a rir de tudo — inclusive de si mesmo

Por Elisa Torres
Atualizado em 14 nov 2025, 09h44 - Publicado em 14 nov 2025, 06h33
Luiz Fernando Guimarães
De volta aos palcos: o ator interpreta tipos hilários à beira de uma situação-limite no Teatro Copacabana Palace a partir de terça (18)  (Daniela Dacorso/Veja Rio)
Continua após publicidade

Inventar outro monólogo a essa altura da vida? Mais de 70 anos na cara, cinquenta de carreira, dois filhos, cheio de cachorro… Fica em casa, querido! Mas não, fica por aí querendo fazer teatro, quer sentir frio na barriga”, provoca a amígdala do cérebro de Luiz Fernando Guimarães logo no início de Curto-Circuito, uma homenagem à trajetória de um dos mais importantes comediantes brasileiros, que completa cinco décadas fazendo o que sabe melhor: pôr o público para rir. A região da mente responsável por processar as emoções é interpretada pela atriz Letícia Augustin no espetáculo que estreia na próxima terça (18), no Teatro Copacabana Palace. Escrita por Gustavo Pinheiro e dirigida por Gustavo Barchilon, a peça revisita, com humor, claro, e vasta lucidez, as pequenas tragédias e situações-limite do cotidiano, mirando algo tão comum de se ver — a desistência. “Todo mundo já pensou em desistir. Não da vida em si, mas de qualquer coisa. Eu mesmo já vivi intensamente algumas situações em que só queria ir embora. Acho que a plateia vai se identificar”, aposta o artista.

+‘Fui ousada’, diz Paolla Oliveira, que encerra Vale Tudo sob elogios

 

Um paciente prestes a ser trancado no tubo de ressonância magnética, um estudante que não sabe resolver as questões do Enem, um comissário de bordo em voo turbulento, uma celebridade encarapitada num carro alegórico de escola de samba — esses são os tipos encarnados por um enérgico Luiz Fernando Guimarães, que não sai do palco em nenhum momento durante a uma hora de apresentação. “Ele assistiu à peça A Tropa, com Otávio Augusto, e disse que tinha vontade de interpretar um texto meu. Prontamente, comecei a escrever”, relembra o dramaturgo Gustavo Pinheiro, que conta ter assistido pela primeira vez a uma montagem dele com apenas 8 anos. A peça era Fica Comigo Esta Noite, com Luiz ao lado de Debora Bloch. “Fiquei fascinado. Está até hoje na “Minha memória afetiva”, emociona-se. Para conferir à empreitada uma camada extra de brilho, Pinheiro convocou uma turma de elevado quilate: Debora Bloch, Fernanda Torres, Claudia Raia, Regina Casé e Patricya Travassos, amigas de longa data do homenageado, se fazem presentes em áudios ao longo da peça. “De todas as pessoas com quem contracenei, foi com ele que bati a melhor bola. Estava com saudade dessa troca”, diz Regina Casé.

luiz fernando guimaraes e debora bloch
Parceiro exemplar: amigas de longa data, como Regina Casé, Fernanda Torres e Debora Bloch, participam da peça por meio de áudios (arquivo pessoal/Divulgação)

Expoente do humor nacional, Luiz Fernando integrou o irreverente grupo de teatro Asdrúbal Trouxe o Trombone, que antecipou o besteirol durante os anos de chumbo da ditadura militar, influenciando gerações de artistas. Ele anda longe das novelas desde 2018, quando fez parte do elenco de O Tempo Não Para, trama global das 7. A última experiência teatral em solo carioca foi em Ponto a Ponto — 4000 Milhas, em 2022. Vivendo com o empresário do ramo hoteleiro Adriano Medeiros e os filhos adotivos Dante, 14, e Olívia, 12, entre o apartamento no Jardim Botânico e o sítio em Itaguaí, o artista tomou gosto pela rotina mais reclusa. Nascidos no Amazonas, os irmãos vieram morar com o casal na pandemia, selando o fim de uma virada que começou em 2017. Naquele ano, Luiz Fernando foi internado à força pelo marido, com a ajuda de Claudia Raia, para tratar do abuso de álcool. “Foi a fase mais difícil de todas. Ou entrava forte nessa tentativa, ou eu tomava outro rumo”, recorda Adriano. O sítio, com horta, pomar e cães para todos os lados, se tornou o cenário idílico da fase serena. “Não cogitava a paternidade, mas um dia olhei para o Adriano e falei: está faltando algo”, conta Luiz Fernando. “Ele é um amigo raro. Não julga e está sempre pronto a estender a mão. Hoje, é um pai que nos enche de orgulho”, elogia Claudia, madrinha de Olívia.

Luiz Fernando Guimarães com a família
Da introspecção ao estrelato: o ator  (à esq., de suspensório) nasceu numa família de classe média de Laranjeiras e foi uma criança muito tímida (Fotos Arquivo Pessoal/Divulgação)

Os intensos episódios de uma vida de excessos foram escancarados em Eu Sou Uma Série de 11 Capítulos — A Autobiografia, lançada em 2022 (Ed. Globo), graças ao incentivo de Fernanda Torres, com quem ele marcou a história dos sitcoms brasileiros em Os Normais, de Alexandre Machado e Fernanda Young (1970-2019). Sem fazer drama, o ator relembra com franqueza como se lançou ao fundo do poço, com direito à perda total de dois carros, e da relevância da terapia para reconhecer o vício. Aventuras lisérgicas com o amigo Ney Matogrosso Também são citadas no livro, assim como memórias da época em que só conseguia trabalhar à base de ansiolíticos, além de tristes partidas de amigos que tiveram a vida abreviada pela aids nos anos 1980. Nas páginas, ele deixa clara a lupa pela qual enxerga o mundo: sem militância e sem bandeiras agitadas. “Repasso aos meus filhos um conselho que sempre dei a meus amigos: vai no impulso”, diz Luiz Fernando, que se vê reconectado com seu “eu mais alegre” desde a chegada das crianças. “Somos uma família como outra qualquer. Queremos inspirar as pessoas a viver de forma natural”, fala o marido.

Continua após a publicidade

 

Luiz Fernando Guimarães com a mãe Yara
O ator ao lado da mãe, Yara (Fotos Arquivo Pessoal/Divulgação)

Nascido em 1949 em uma família de classe média carioca de Laranjeiras, o humorista de verve afiada foi um jovem engraçado, porém introspectivo. “Eu era o cara das boas tiradas, mas muito tímido. Achava que todo mundo ria de mim, não do que eu dizia, e isso me incomodava”, lembra. A intuição e a sinceridade, marcas inconfundíveis, segundo ele o guiaram por uma carreira feita de escolhas autênticas e firmes recusas, a exemplo de papéis que preferiu não fazer. Também nunca teve contrato longo com a TV Globo, “em nome da liberdade criativa”. No teatro, entendeu que o humor jamais poderia ser um escudo. “Nos tempos do Asdrúbal, aprendi a não temer imprevistos”, afirma o ator, que prefere ser chamado de comediante a humorista e não se desvia de uma polêmica não raro evitada por profissionais do riso. “Acredito que o limite está no constrangimento. O importante é respeitar. Se a piada for constrangedora, não é engraçada”, reflete. Para o pesquisador Mauro Alencar, ele ajudou a redefinir no país a própria ideia do que é engraçado. “Com a TV Pirata e Os Normais Luiz Fernando agregou teatralidade à TV, unindo o drama cotidiano ao deboche”, avalia o autor de A Hollywood Brasileira — Panorama da Telenovela no Brasil.

 

asdrubal trouxe o trombone
Asdrúbal Trouxe o Trombone: grupo teatral influenciou gerações de atores (arquivo pessoal/Divulgação)

 

Entre 2020 e 2024, o núcleo de humor da Globo ficou esvaziado e uma das grandes apostas deste ano foi a série Pablo & Luisão, criada por Paulo Vieira, que resgata o conceito de “humorístico para a família toda”. “As novas gerações estão fragmentadas e não assistem tanto à TV aberta. O riso continua sendo um dos estímulos mais nobres das artes”, analisa o historiador e pesquisador teatral Daniel Marano. “O estilo contido e observador de Luiz Fernando Guimarães faz com que ele seja uma espécie de Bill Murray brasileiro, que, mesmo sério, faz a audiência rir”, ressalta. Já o diretor Gustavo Barchilon, que também o conduziu em Ponto a Ponto, assim o qualifica: “Ele é um capítulo vivo da história da comédia, misturando ironia, poesia e crítica social”. Aos 75 anos, o ator continua se reinventando, ávido por sentir mais uma vez aquela comichão que acompanha o nascedouro de um trabalho ó e deixa a amígdala a toda. “No início, dá ansiedade, mas sempre saio de cena com a alma lavada”, diz. Para o futuro próximo, uma viagem com paradas na Croácia e no Japão com a família já está nos planos. A ideia é tirar proveito dos mais belos cenários ó dentro e fora de cena.

+ Para receber VEJA RIO em casa, clique aqui

Continua após a publicidade
asdrubal trouxe o trombone
Um marco no teatro: Luiz Fernando era o debochado da companhia Asdrúbal Trouxe o Trombone (arquivo pessoal/Divulgação)

Diga-me com quem andas

Amigos chegados lançam um novo olhar sobre o ator

A atriz Claudia Raia
A atriz Claudia Raia diz que “Luiz Fernando Guimarães sempre foi uma referência enorme para mim na comédia” (Instagram/Reprodução)

“Ele é meu irmão, meu amigo há muitos anos. Foi uma referência enorme para mim na comédia. O tempo dele, o raciocínio, a leveza… Tudo é único. Ele trabalha com tanta alegria que é um prazer vê-lo. No teatro, então, Luiz Fernando é impagável.” Claudia Raia

 

regina casé
Regina Casé conta que sempre soube que Luiz Fernando seria seu parceiro (tv globo/Divulgação)
Continua após a publicidade

“Estávamos prestes a estrear O Inspetor Geral, primeira peça do Asdrúbal, quando um dos atores precisou ser substituído às pressas. Várias pessoas foram testadas, até que o Luiz Fernando chegou. O Hamilton Vaz Pereira pediu para ele improvisar, e ele começou a imitar animais sem dizer uma palavra. Naquele momento entendi que ele seria meu parceiro.” Regina Casé

Patricya Travassos
Patricya Travassos: “No Asdrúbal ele era o debochado, o sonso que finge não saber que é engraçado” (Joao miguel Junior TV Globo/Divulgação)

“No Asdrúbal todos tínhamos um humor natural, sem rótulos, e a personalidade de cada um aparecia de um jeito peculiar. Um influenciava o outro, sempre respeitando as particularidades. Nesse contexto, ele era o debochado, o sonso que finge não saber que é engraçado. Isso é muito bom.” Patricya Travassos

Fernanda Torres
Um dos parceiros mais generosos, em cena e fora dela, que tive o privilégio de conhecer (Vittorio Zunino Celotto GettyImages/Divulgação)

“Um dos parceiros mais generosos, em cena e fora dela, que tive o privilégio de conhecer. Durante os três anos da série Os Normais e, depois, nos dois filmes que fizemos como Rui e Vani, apenas uma preocupação me norteava: não decepcioná-lo ou atrapalhá-lo.” Fernanda Torres

Continua após a publicidade
Zorra Diogo Vilela
“Estar ao lado do Luiz Fernando  é ficar longe do tédio” (estevam avellar tv globo/Divulgação)

“O Luiz sempre propõe o novo com sua crítica inteligente sobre tudo que poderia ser maçante. Estar ao lado dele é ficar longe do tédio.” Diogo Vilela

Compartilhe essa matéria via:

 

Gustavo Pinheiro
(Pino Gomes/Divulgação)

Tiradas geniais

Dramaturgo do momento, Gustavo Pinheiro já tem quatro novos textos para 2026

Continua após a publicidade

Jornalista, escritor, tradutor e roteirista, Gustavo Pinheiro teve seu primeiro texto, A Tropa, encenado em 2016, quando venceu, aos 36 anos, a sétima edição do Seleção Brasil em Cena, concurso de novos autores do Centro Cultural Banco do Brasil. Desde então, o carioca se tornou um dos autores mais requisitados do país, atingindo a marca de 1 milhão de espectadores em peças encenadas por nomes como Antonio Fagundes, Christiane Torloni, Ana Beatriz Nogueira, Thiago Fragoso, Alinne Moraes, Deborah Evelyn, Nathalia Dill, Suely Franco e Mariana Xavier — um rol estelar que não acaba. “É uma honra que as pessoas se emocionem e se divirtam com as histórias que eu conto. Trabalho pensando na reação da plateia”, diz.

+Letícia Spiller compartilha desafios que experienciou na perimenopausa

A Lista, seu oitavo texto para teatro, escrito na pandemia para Lilia Cabral e a filha dela, Giulia Bertolli, recebeu três indicações ao Prêmio Bibi Ferreira, em 2022, incluindo a de melhor texto. Pinheiro foi ainda criador e roteirista da adaptação da história para um filme de TV, com a veterana ao lado de Tony Ramos, visto por mais de 15 milhões de pessoas na TV Globo. É ele também o tradutor da montagem da peça Três Mulheres Altas, de Edward Albee, no mesmo 2022. Dois de Nós, sucesso protagonizado por Fagundes e Torloni, atualmente em turnê por Portugal, já foi vista por mais de 150 000 espectadores e chegará ao Rio em julho de 2026, ano em que estão previstos quatro novos textos seus nos palcos. “O bonito nessa caminhada é que os atores assistem às minhas peças e me convidam para novos projetos. É o trabalho que me leva a novos trabalhos”, celebra o autor, voltado agora para dois projetos encomendados por produtores de cinema.

 

 

asdrubal trouxe o trombone
(arquivo pessoal/Divulgação)

 

 

luiz fernando guimaraes e familia
Família: sem levantar bandeiras, o ator e o marido, Adriano Medeiros, vivem juntos há 29 anos e adotaram os irmãos Dante e Olívia em 2021 (Instagram @luizguimaraesoficial/Divulgação)

 

 

 

luiz fernando guimaraes e cachorros
Vida no mato: o artista se divide entre o apartamento no Jardim Botânico e um confortável sítio em Itaguaí, com lago e muitos cachorros (Instagram @luizguimaraesoficial/Divulgação)

 

mazzaropi
Pioneiro: o programa de Mazzaropi na TV Tupi foi um dos primeiros relacionados ao humor (divulgacao/Divulgação)

 

Mudança de humor

Como o gênero foi se moldando aos novos tempos da TV brasileira

 

1950-1960. Os primeiros passos foram dados em Rancho Alegre, estrelado por Mazzaropi na TV Tupi, e Praça da Alegria, exibida inicialmente pela TV Paulista. A criação de Manoel de Nóbrega consagrou o formato de esquetes. Na década seguinte, o gênero se consolidou com Chico Anysio Show, marco da multiplicidade de personagens e da sátira social.

 

TV Pirata
(arquivo pessoal/Divulgação)

 

1970-1980. Novos estilos, mais críticos e sofisticados, foram experimentados em produções como Faça Humor, Não Faça Guerra e Satiricom.

 

 

viva o gordo
(tv globo/Divulgação)

 

O fenômeno Os Trapalhões dominou o país com apelo familiar, enquanto Planeta dos Homens e Viva o Gordo trouxeram uma visão política. Já a TV Pirata inovou com linguagem moderna e crítica à própria televisão.

 

chico anysio escolinha
(isac luz tv globo/Divulgação)

1990-2000. A Escolinha do Professor Raimundo consolidou Chico Anysio como mestre da comédia. Casseta & Planeta, Urgente! marcou época com refinadas paródias, enquanto Sai de Baixo trouxe o improviso teatral para a TV. No final da década teve Vida ao Vivo Show e Piores Clipes do Mundo, seguidos por Zorra Total.

 

os normais tv globo
Luiz Fernando e Fernanda Torres, parceira de Os Normais: série foi criada e escrita por Fernanda Young e Alexandre Machado (tv globo/Divulgação)

2000-2010. Nos anos 2000, a MTV ousou e conquistou os jovens com Hermes e Renato e Rockgol. Também foi nessa época que o Pânico na TV chocava pela falta de noção. Na Globo, sitcoms como Os Normais, A Diarista, Sob Nova Direção e Toma Lá, Dá Cá dominavam a grade.

 

vai que cola
Marcus Majella (Ferdinando), Samantha Schmütz (Jéssica), Cacau Protásio (Terezinha), Luis Lobianco (Reginel), Catarina Abdalla (Dona Jô), Emiliano D’Ávila (Máicol), Marcelo Médici (Sanderson), Aline Riscado (Susan), Paulo Gustavo e Rafael Infante (Éricsson) (gabriel mendes tv globo/Divulgação)

 

2010-2020. O telejornal satírico CQC — Custe o Que Custar deu o tom da transição para a era digital na virada da década. A nova geração de humoristas levou o gênero para múltiplas plataformas. Tapas & Beijos e Vai que Cola mantiveram o formato de sitcom em alta, enquanto Greg News consolidou o humor político e cultural contemporâneo.

Publicidade

Essa é uma matéria fechada para assinantes.
Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

Domine o fato. Confie na fonte.
15 marcas que você confia. Uma assinatura que vale por todas
Impressa + Digital no App
Impressa + Digital
Impressa + Digital no App

Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

Assinando Veja você recebe semanalmente Veja Rio* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
*Assinantes da cidade do RJ

A partir de 29,90/mês