‘Quando me chamam de sapatão, abro um sorriso e desmonto a pessoa’, diz Bruna Linzmeyer

Atriz é umas das primeiras da geração nascida nos anos 1990 a expor sua orientação sexual e ainda exercer ativa militância em prol da comunidade lésbica

Por Cleo Guimarães
Atualizado em 15 ago 2020, 07h41 - Publicado em 14 ago 2020, 07h00
Bruna Linzmeyer: "É normal amar outra mulher. O processo de se reconhecer lésbica às vezes tem dor, mas nem sempre" (Bruna Castanheira para Harpers Bazaar/Divulgação)
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Inseguranças de vários matizes afligiram Bruna Linzmeyer, 27 anos, quando ela se viu pela primeira vez apaixonada por uma mulher, em 2015. Assumir o amor por uma pessoa do mesmo sexo poderia afastar trabalhos na TV? E os contratos publicitários, correriam o risco de rarear? O receio, porém, durou pouco.

“Quando começamos a namorar, entendi que não havia a menor possibilidade de não falar sobre isso abertamente”, conta a catarinense,  uma das primeiras atrizes da geração nascida na década de 90 a expor sua orientação sexual e ainda exercer ativa militância em prol da comunidade lésbica.

Trabalho nunca lhe faltou: com dois longas e três curtas para estrear, Bruna completou uma década de carreira com nove produções da Globo e catorze filmes no currículo. Também é garota-propaganda de grandes marcas. “O mundo passou a lidar melhor com as diferenças de uns anos para cá, mas a luta continua, sempre”, diz a determinada atriz. De casa, na Gávea, ela falou por telefone a VEJA RIO.

Você postou recentemente um vídeo, visualizado por mais de 1 milhão de pessoas, no qual relata uma vez que foi hostilizada por andar abraçada com sua namorada numa loja do Rio. Isso costuma acontecer? Na verdade, o que mais acontece são manifestações de apoio nas ruas. Quando alguém tenta me ofender, chamando de sapatão, abro um sorriso e desmonto a pessoa. Nas redes, às vezes, sou atacada, aparece um “você não é normal”, coisas desse tipo.

E como lida com os ataques? Honestamente, não ligo, mas eles reforçam a minha determinação de seguir na luta.

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Acha que consegue atingir um público maior por não se encaixar no estereótipo masculinizado? Com certeza. A gente vive em uma estrutura racista, então sei que ser branca e jovem, por exemplo, contribui para que eu seja assimilada e passe minha mensagem. Como também sou atriz, tenho um amplificador, um megafone nas mãos, e uso bem isso.

O temor de espantar marcas publicitárias depois de expor sua sexualidade se confirmou em algum grau? Não. Acho que os tempos são outros mesmo. Estou com dois contratos longos de publicidade, de marcas que me respeitam, que me procuram por eu ser como sou. Uma delas é uma grife de lingerie, que me deu a liberdade de posar para as fotos da próxima campanha com a perna cheia de pelos. Não foi uma imposição minha. Nunca disse: “Ah, se quiser, é assim, com a perna cabeluda”. Aconteceu de forma natural. Eles me deixaram à vontade e me fotografaram como eu estava, me sentindo bem. Na TV também me entendem e não querem me mudar. Tive meu contrato renovado com a Globo por mais três anos. Já estou lá há dez. Mas, nesse trajeto todo, cheguei a ter minhas inseguranças.

Quais eram elas? Quando assumi o primeiro namoro com uma mulher, muitas pessoas falavam que eu ia perder trabalhos. Fiquei insegura, sim, mas de minha parte nunca foi uma possibilidade não falar, por mais que eu tivesse meus medos. Na minha geração, fui a primeira a deixar clara minha orientação sexual. Abri uma porta. Estávamos todas na iminência de falar, aí eu fui lá e fiz. Depois, a Nanda Costa se sentiu à vontade para tratar do assunto, a Carol Duarte também, e outras.

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Como foi a reação de sua família? Meus pais tiveram medo, receio do preconceito que eu poderia ter que encarar. Há essa narrativa de dor e sofrimento de quem se assume, que é real. Sofre-se mesmo.

Seus pais a apoiaram? Eles são pessoas muito legais. Vêm da roça, de uma cidade pequena (de Corupá, município de 16 000 habitantes em Santa Catarina, onde Bruna nasceu). Achei espaço para conversar, e eles foram entendendo. São muito abertos e amorosos. Meu pai disse: “Não é o que eu sonhei, mas, se você está feliz, eu também estou”. Meu irmão também é gay. Contou a eles mais ou menos na mesma época. Desde então, isso deixou de ser uma questão na nossa família.

Já foi assediada no ambiente de trabalho? Sim, algumas vezes, mas prefiro não falar disso. Infelizmente, para quem é mulher, essa é uma realidade, e não só no mundo do audiovisual, mas também no da moda. Eu comecei como modelo. Quer dizer, tentei ser modelo em São Paulo por um ano, quando tinha 16. Passei por todos aqueles obstáculos clássicos e não ganhei um centavo. A verdade é que tem muita mulher que foi assediada sem nem perceber, o que é tão duro quanto. No meu caso, eu percebi.

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É verdade que certa vez uma psicanalista a questionou sobre sua orientação sexual? Sim. Passei a fazer terapia depois que comecei a me relacionar com mulheres. Um dia, a psicanalista me perguntou se eu tinha certeza mesmo de que era lésbica. É difícil de acreditar, né? Pois aconteceu comigo, e dentro de um consultório. Sei que o que sinto é parte de mim. Nenhuma teoria vai desfazer ou explicar isso.

Algumas atrizes já afirmaram ter sentido preconceito por serem bonitas. Ocorreu com você? É comum em nossa estrutura machista acharem que a mulher “fez alguma coisa” para estar ali, para conseguir o trabalho. Sobre ser bonita, não sei dizer. Até porque sou bonita dentro de alguns padrões, não de todos.

Como está vendo o baque da pandemia no mercado audiovisual? Sinceramente, não é a Covid-19 que tem tirado o emprego de vários de nós. O que fez com que muita gente ficasse sem trabalho foi a paralisação da Ancine, o congelamento de milhões de reais em editais que já foram ganhos. Isso é pré-pandemia. Agora, até que a vacina chegue, temos que encontrar novas formas de trabalhar

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