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“O Maraca é nosso”: a polêmica volta do público

Saudade é sentimento unânime, mas profissionais de saúde, dirigentes e torcedores divergem sobre uma eventual reabertura dos estádios no Rio

Por Lucas Maciel, Marcello Braga, Maria Fernanda Anacleto
Atualizado em 30 nov 2020, 16h41 - Publicado em 30 nov 2020, 13h43

O maior palco esportivo do Rio de Janeiro e um dos mais importantes do mundo segue fechado ao seu fiel e apaixonado público. A última oportunidade que os cariocas tiveram de ir ao Maracanã, ou a qualquer outro estádio da cidade, foi em março deste ano. E ainda que torcedores, dirigentes e profissionais da saúde dividam opiniões sobre a possível volta do público aos “campos”, um sentimento é comum e predominante: o de saudade.

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O Maracanã iniciou, em outubro, o isolamento das cadeiras nas arquibancadas e a instalação de dispensers com álcool em gel. O estádio foi oferecido para testar os novos protocolos impostos pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF), em um possível retorno do público durante o Campeonato Brasileiro de 2020. Questionada pela reportagem sobre esse planejamento e as possíveis datas para o retorno dos torcedores, a CBF não se pronunciou sobre o assunto. A Federação de Futebol do Rio de Janeiro (FERJ) enviou uma nota sobre a organização dos campeonatos previstos para 2021.

“Assim como em 2020, a Federação de Futebol do Estado do Rio de Janeiro seguirá as diretrizes dos órgãos sanitários sem abrir mão dos alicerces: combate a disseminação ao COVID e preservação de vidas. A FERJ faz acompanhamento da curva epidemiológica desde março e sempre estará aberta ao diálogo, dentro da responsabilidade. A FERJ reitera que o Protocolo Jogo Seguro, produzido para o Campeonato Carioca de 2020, é elogiado até hoje pela eficácia na preservação da saúde – 7 148 exames foram realizados em jogadores, comissões técnicas, imprensa, Polícia Militar e demais envolvidos na organização de uma partida – com índice de 4% de infectados (303), sendo imediatamente isolados e evitando o contágio”.

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A infectologista Erika Gouvea, professora de Doenças Infecciosas da UERJ, é contra a ideia da volta do público neste momento. Para ela, “até a volta dos jogos sem público foi uma decisão precipitada”. Além disso, “muitos serviços ainda não voltaram na cidade e, portanto, não há porquê os torcedores voltarem ao estádio”. Na mesma linha de pensamento, o Luiz Carlos Fadel, médico do Ministério da Saúde e servidor da Fiocruz, ressalta que “o futebol não é uma atividade essencial à sociedade”. Na sua visão, “não existe protocolo seguro devido ao grande número de pessoas, mesmo com o estádio em capacidade reduzida. A forma como o público se comporta nos estádios também conspira muito para a falha deste protocolo”.

Flamengo
Fla Manguaça (Divulgação/Divulgação)

A visão de profissionais ligados à área de gestão dos clubes, no entanto, apresenta divergências em relação ao ponderado pelos profissionais da saúde. O vice-presidente de finanças do Vasco da Gama, Carlos Leão, destaca a questão financeira. Ele afirma que a perda de alguns patrocinadores, o rearranjo das cotas de televisão e o prejuízo de aproximadamente R$ 90 mil por jogo afetaram as finanças do clube causaram demissões internas, cortes de salários e renegociação de dívidas com jogadores. A favor da volta dos torcedores em todas as praças do país, Leão acredita na efetividade do protocolo, preocupa-se em voltar a dar emoção ao torcedor e diz que “seria o primeiro da fila” em uma possível volta.

O ex-vice-presidente de finanças do Flamengo Wallim Vasconcellos também alerta para a crise financeira decorrente dos estádios fechados. Quedas de arrecadação nas bilheterias e na venda de produtos no “match day”, assim como de sócios torcedores e patrocinadores, agravam os problemas de times que já estavam “mal das pernas”. Ele alerta também que um estádio com 30% de sua capacidade não se paga. No entanto, toda renda “é mais que bem vinda na situação atual”. Seria necessário otimizar a ocupação dos estádios de forma a minimizar os custos. Wallim Vasconcellos diz ainda que os torcedores ficariam receosos de torcer como faziam antes da pandemia e respeitariam os protocolos de segurança estipulados. Ele não descarta a possibilidade de ir ao Maracanã no caso da reabertura.

Botafogo
Loucos pelo Botafogo (Divulgação/Divulgação)

O Botafogo se mostra a favor da isonomia. Em nota, o departamento de marketing reforça o posicionamento do clube sobre o tema. “O Botafogo defende o princípio da isonomia, uma premissa básica quando se fala em competição. É uma discussão que precisa contemplar o coletivo, ou seja, todos os clubes e os cenários vivenciados em todo o país, sob os mesmos critérios. É imprescindível que haja o respaldo dos órgãos de saúde e que ocorra sem açodamentos”.

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A reportagem não conseguiu contato com nenhum dirigente do Fluminense. A assessoria do clube informou que o presidente Mário Bittencourt se pronunciou sobre o tema em entrevista coletiva no canal tricolor no YouTube, a Flu TV. Na oportunidade, ele declarou: “Nossa posição é de aguardar a proposição da CBF, debater e decidir em colegiado. Este é um tema de todos e não só do Fluminense, motivo pelo qual vamos debater com os coirmãos e avaliar a percepção de todos”.

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Com as emoções mais à flor da pele, os torcedores também trazem opiniões distintas. Presidente da torcida organizada Resenha Vascaína, Paulo Raphael Lopes é a favor da volta gradual do público aos estádios, de acordo com todos os protocolos de segurança estipulados. Foi dessa forma que o grupo retomou suas reuniões para assistir aos jogos do Vasco. O empresário, que contraiu a Covid-19 no início da pandemia, mostra preocupação com os empregados demitidos, por conta dos cortes de gastos nos clubes. Ele defende o retorno a partir da separação das pessoas do grupo de risco e de uma reeducação dos torcedores. “Tem pessoas que, infelizmente, estão nos deixando, mas a vida não pode parar. Se a vida parar, como que a gente paga as contas? Como vão ficar os funcionários dos clubes? O funcionário precisa receber, e o patrão precisa arrecadar. Não temos base financeira no país para conseguir sustentar tanto tempo”.

vasco
Resenha Vascaína (Divulgação/Divulgação)

O presidente da torcida organizada Fla Manguaça, Felipe Amorim, não vê a volta do público com tanto otimismo. O gerente de TI não acredita na eficácia dos protocolos e diz que a melhor decisão é não autorizar a presença da torcida. Para ele, “é impossível controlar a aglomeração da torcida, principalmente nos arredores do estádio”. Mas, caso a volta seja autorizada, confessa que iria ao Maracanã: “Se eu pego um trem e um metrô lotados para ir e voltar do trabalho, por que eu não vou poder pegar esse mesmo transporte para uma diversão?” Para Amorim, um diálogo com o clube seria uma boa forma de resolver a questão, mas ele lamenta a falta de interesse do Flamengo em debater o assunto com os torcedores.

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Segundo Rafael Kastrup, presidente da torcida organizada Loucos pelo Botafogo, a volta do público não é segura. O advogado prevê que “não há chance de qualquer protocolo ser seguido” e alerta para o modo caloroso de torcer do brasileiro. “Não tem como mudar uma cultura da noite para o dia e pedir que as pessoas sigam o protocolo. Ninguém vai seguir nada. Infelizmente, o nosso povo não tem essa educação.” Alinhado ao pensamento da diretoria alvinegra, ele diz que ainda não é o momento para se pensar em futebol, enquanto tantas vidas estão em jogo. Mas entende que, pela sua posição de liderança na torcida, seria obrigado a comparecer no estádio, caso seja efetivada a volta dos torcedores.

*Por Lucas Maciel, Marcello Braga, Maria Fernanda Anacleto, alunos da PUC

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