Famílias que perderam entes para a Covid-19: “Todo dia é dia de finados”
Em meio à pandemia, cariocas cujos parentes morreram em decorrência da infecção relatam a dor e a saudade
O Dia de Finados, dedicado à memória dos que se foram, será mais difícil para muitas famílias este ano, especialmente para quem perdeu entes queridos na pandemia do novo coronavírus. Em meio à dor cotidiana, algumas vão manter seus rituais.
Para Luciana Lahr Moura, que lida com a morte ainda recente do pai, “todo dia é dia de Finados”. De família católica, a coordenadora pedagógica pretende ir à missa com a família neste dia 2. Ela se recorda frequentemente do pai e faz orações para que ele esteja em paz. Na casa de Luciana, todos contraíram a doença: o marido, ela, os dois filhos, a mãe e o pai.
Marco Antônio Moura, de 72 anos, que tinha diabetes controlada e havia feito um cateterismo em fevereiro, ficou internado no Quinta D’Or por 24 dias e morreu no dia 27 de setembro, por uma infecção bacteriana. No fim de agosto, o marido de Luciana viajou a trabalho, e é possível que tenha contraído o vírus neste período. Marco Antônio, que morava na Ilha do Governador, deixa três filhos e quatro netos.
Evangélica, a dona de casa Érica Cristina Araújo, que perdeu o marido para a Covid-19, pretende fazer um culto em casa para amigos e familiares neste Dia de Finados. “Ainda é muito doloroso falar sobre esse assunto, mesmo pensando nele todos os dias”, diz Érica, que atendeu a reportagem no dia 30, aniversário dela e exatos seis meses depois do marido morrer. O policial penal aposentado Sílvio Lúcio Brito da Silva, de 48 anos, sem doença pré-existente, teve uma tosse seca e procurou a UPA de Bangu, onde morava, no início de abril.
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Examinado, foi liberado sem fazer o teste de Covid-19. Dois dias depois, com febre, Sílvio retornou à UPA e foi diagnosticado com princípio de pneumonia. Com sintomas mais severos, testou positivo em uma clínica particular e foi internado no hospital municipal Albert Schweitzer, onde deu permissão para tratamento com hidroxicloroquina, medicação sem eficácia comprovada no tratamento da Covid-19. Consciente e sem precisar de intubação, alguns dias depois teve uma parada cardíaca e morreu, no dia 30 de abril. Sílvio deixa ainda uma filha e um enteado.
Adepta do espiritismo, que entende que a alma não morre, a família de Tarcísio Esteves pretende fazer um culto no lar, como faz semanalmente, reunindo parentes e amigos para fazer orações e ler o evangelho. Médico veterinário e fiscal sanitário da Prefeitura, Tarcísio, de 66 anos, trabalhava nas ruas quando foi infectado. Mesmo não tendo doença pré-existente, acabou morrendo, após 30 dias de intubação. Tarcísio morava em Jacarepaguá e deixa a esposa e um filho.
Um dos quatro filhos da diarista Claudia da Silva, de 53 anos, o tosador Alex da Silva Figueiredo conta que ainda é difícil falar sobre a morte da mãe. A moradora da Rocinha ficou duas semanas internada, foi intubada e faleceu no dia 3 de maio. Possivelmente contraiu Covid-19 devido à exposição no trabalho. Alex não costuma fazer nenhum ritual no dia de Finados. “Vai ser um dia normal, mesmo estando ainda muito mexido com a morte dela”, afirma Alex.
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Para quem pretende visitar sepulturas, os cemitérios estarão abertos, mas é obrigatório o uso de máscara e o respeito ao distanciamento. A Guarda Municipal do Rio montou operação de ordenamento urbano e de fiscalização nos vinte cemitérios da cidade.
O Memorial do Carmo, no Caju, oferece serviços especiais como o agendamento de visitas virtuais ao jazigo e arranjos de flores, além de missa virtual.
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* Júlia Rivero, estudante de Jornalismo da PUC-Rio, sob orientação da professora Itala Maduell e revisão final de Veja Rio.