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A construção da Linha 4 do metrô chega à reta final

Maior obra de infraestrutura em curso no país, com 9 717 operários, a ligação do metrô entre Ipanema e a Barra da Tijuca deve estar em plena operação em julho de 2016

Por Sofia Cerqueira
Atualizado em 2 jun 2017, 12h22 - Publicado em 31 out 2015, 00h00
Os subterrâneos da obra do metrô na Praça Nossa Senhora da Paz
Os subterrâneos da obra do metrô na Praça Nossa Senhora da Paz (Felipe Fittipaldi/)
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Enquanto boa parte dos cariocas já está em casa ou dormindo, o vaivém por trás dos tapumes da Linha 4 do metrô continua incessante. Às 23 horas, na cozinha industrial montada na área do Jardim de Alah, espécie de QG da empreitada na Zona Sul, começa a ser feito o almoço do dia seguinte. Os cozinheiros e ajudantes se dividem entre a sala de lavagem de legumes, as câmaras frigoríficas, o açougue e a padaria instalados no local. Sete horas mais tarde, a refeição, preparada em gigantescos caldeirões, está pronta para ser armazenada em boxes térmicos e levada para as 22 frentes de trabalho. Ao mesmo tempo, são assados 10 000 pães para o café da manhã. Por mês, o consumo nos canteiros de obras chega a 236 toneladas de alimentos. Essa é só uma amostra de quão complexa é a engrenagem que move a cidade subterrânea escavada entre Ipanema e Barra da Tijuca. Na reta final, as obras do metrô vivem o pico de atividade, com 9 717 operários revezando-se à frente de máquinas e ferramentas 24 horas por dia. Para que os 16 quilômetros da nova linha estejam em plena operação em 1º de julho, um mês antes da Olimpíada, o ritmo é frenético. “Estamos num momento crucial, que junta trechos de obra civil pesada com grandes áreas em acabamento”, diz o governador Luiz Fernando Pezão. “As pessoas não têm ideia da efervescência que existe embaixo da terra”, completa.

O que acontece sob os pés dos cariocas impressiona. Ali, desenrola-se a maior obra de infraestrutura em andamento no país — e na América Latina. Quase todo o trabalho ocorre entre 16 e 22 metros abaixo do nível da rua. A oito meses da data de entrega, boa parte da rede de túneis perfurados do Maciço do Cantagalo, em Ipanema, à Barra ostenta aparência bem próxima da que o público verá na inauguração. Dos 32 quilômetros de trilhos (considerando ida e volta), 18 já estão instalados. Nas futuras estações, o movimento de trabalhadores também fervilha. Das seis paradas da nova linha, as do Jardim Oceânico, de São Conrado e da Praça Nossa Senhora da Paz são as mais avançadas. Nas três, as escadas rolantes estão montadas, os guarda-corpos instalados e o piso de granito e as paredes de pastilhas em fase de finalização. Na Barra, por exemplo, os pontos de iluminação natural no teto, que lembram um céu estrelado, estão à mostra. Embora a Linha 4 do metrô esteja com 83% das perfurações concluídas, o último trecho, com 1,2 quilômetro, é alvo de muita expectativa. Até o fim de dezembro deve ocorrer a junção entre o túnel da Barra e o da Zona Sul. Para isso, a tunnel boring machine, conhecida como tatuzão, equipamento que escava e reveste as paredes de concreto, deve passar pela estação da Antero de Quental nos próximos dias, cruzar o canal da Rua Visconde de Albuquerque por baixo e conectar-se ao restante da linha no Alto Leblon. “É uma obra desafiadora, que exige atenção do início ao último dia”, ressalta o secretário estadual de Transportes, Carlos Roberto Osório. 

Os números da cidade subterrânea/Linha 4 do metrô
Os números da cidade subterrânea/Linha 4 do metrô ()

Tirar a Linha 4 do papel não foi tarefa fácil. O primeiro desafio é o próprio solo carioca, com trechos de rocha e outros arenosos e encharcados, junto à orla. Por isso, foi preciso lançar mão de recursos bastante diversos entre si. No eixo do Leblon à Barra, que passa sob o Dois Irmãos, o Maciço da Tijuca e a Pedra da Gávea, optou-se por detonações. Só ali foram usadas 3 865 toneladas de explosivos, o suficiente para sustentar 161 queimas de fogos do réveillon de Copacabana. Na Zona Sul, densamente povoada, a expansão seria inviável sem o tatuzão, equipamento alemão largamente usado em intervenções similares na Europa. O gigante subterrâneo — 120 metros de comprimento — não evitou, porém, momentos de apreensão. Ao chegar à Rua Barão da Torre, em maio de 2014, abriram-se crateras na via e garagens de prédios tiveram paredes rachadas. Após o reforço na fundação dos edifícios e seis meses de atraso, a máquina começou a operar em velocidade recorde, percorrendo até 32 metros por dia. A sua passagem pelo Jardim de Alah, cruzando o canal que liga a Lagoa ao mar, também gerou tensão, mas ocorreu sem maiores sustos. Orçada em 8,79 bilhões de reais, a obra, que foi iniciada em 2010 e beneficiará 300 000 pessoas por dia, tem só um trecho em superfície, a ponte estaiada da Barra, sobre o Canal de Marapendi. “Tenho orgulho de fazer parte de uma obra desse tamanho”, diz o encarregado de solda Antônio Pereira da Silva, 56 anos. Ele, que deu o chute inicial no jogo de reinauguração do Maracanã, onde trabalhou, sonha participar também da festa da Linha 4.

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Operários do metrô da Linha 4
Operários do metrô da Linha 4 ()

 No labirinto subterrâneo escavado entre as zonas Sul e Oeste, o ruído dos equipamentos se funde a inúmeros sotaques. Como uma cidade recheada de oportunidades, a obra atraiu operários de todo o país e até do exterior. Segundo pesquisa dos consórcios responsáveis pela linha, 40% deles vieram de outras regiões e há representantes de 23 dos 26 estados brasileiros. “Já morei no meio do mato e agora estou no céu. Passo o dia no buraco, mas posso andar na praia no fim da tarde”, conta o encarregado de escavação Edson Lopes, 43 anos, um paranaense que trabalhou em cinco hidrelétricas. Hoje, ele mora no alojamento do metrô, no Leblon. A vida oculta pelos tapumes surpreende. Em todos os canteiros, na superfície, foram criadas áreas especiais para o lazer dos funcionários, onde, após as refeições, é possível jogar totó, pingue-pongue e ver TV. Várias delas têm biblioteca. Mas é no subsolo que não faltam curiosidades. A cada entrada de túnel, por exemplo, fica uma imagem de Santa Bárbara, padroeira das escavações. Para que os trabalhadores não percam a noção de sua localização, há placas nas paredes escavadas com o nome das ruas situadas acima. E, como forma de enfrentarem o desconforto lá debaixo, onde a temperatura chega a 38 graus, foram instalados ventiladores gigantes, além de bebedouros e banheiros junto às estações — são 533 sanitários na obra. “É cansativo, mas não reclamo. Vim tentar a sorte e agora participo da história do Rio”, diz o paraibano Marco Polo Barbosa, 44 anos, que antes trabalhou como encarregado de pedreiro na Cidade das Artes e no Maracanã.

Detalhes da obra da Linha 4 do metrô
Detalhes da obra da Linha 4 do metrô ()
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Não há dúvida de que a chegada do metrô à Barra é um alento no deficitário transporte de massa da cidade. O que está sendo realizado em seis anos — 16 000 metros de linha subterrânea — é quase igual ao que foi feito em 35 anos. O metrô carioca, inaugurado em 1979, tem 41,9 quilômetros de extensão, dos quais só 17 foram projetados como túnel — os demais trilhos ficam na superfície. O avanço da rede metroviária é ínfimo, se comparado ao de cidades como Xangai. A metrópole chinesa, que até 1993 nem sequer contava com esse meio de transporte, tem hoje o maior sistema de metrô do mundo, com 500 quilômetros de linhas. Nas últimas duas décadas, foram inauguradas no Rio apenas doze estações. A atual expansão só saiu do papel graças a uma conjunção de fatores, dos quais o mais vistoso é a realização dos Jogos Olímpicos na cidade. Desde o início, sabia-se que a logística seria monumental. Só para se ter ideia, foi preciso abrir uma espécie de piscinão subterrâneo junto à General Osório para depositar o entulho das escavações. Diariamente, toda a terra removida é transportada até uma área de descarte em Senador Camará por caminhões que se concentram em locais como a Rua Tonelero, em Copacabana, o que volta e meia gera reclamações de moradores. Eles são parte de uma frota de quase 400 máquinas, entre elas tratores e escavadeiras, que circulam pelos canteiros. Um dos modelos, a pá carregadeira, tem como operadora Fátima da Conceição Silva, 52 anos. “No futuro, vou poder dizer aos meus filhos que ajudei a construir o metrô e que meu trabalho foi muito importante”, orgulha-se a motorista.

O mapa das linhas 1, 2 e 4 do metrô carioca
O mapa das linhas 1, 2 e 4 do metrô carioca ()

A tão sonhada ligação entre Ipanema e a Barra por baixo da terra chega à reta final com quase cinquenta anos de atraso. Um plano metroviário de 1968, assinado por técnicos alemães contratados pelo então Estado da Guanabara, já previa um traçado para a Zona Oeste. No entanto, o primeiro estudo para esse transporte é de 1947, época em que a Light administrava os antigos bondes da cidade. Agora, o governo do estado se debruça sobre um plano diretor para o sistema metroviário com projeções até 2045. Diferentemente de obras anteriores, tanto a nova estação da Gávea, com abertura programada para o fim do próximo ano, quanto a do Jardim Oceânico foram construídas já prevendo expansões. Ou seja, não ficarão fechadas no caso de ampliações, como a da Praça General Osório em 2013. Entre as próximas intervenções, garante o governo estadual, está o aumento da Linha 2, entre Estácio e Praça XV, cujas obras devem iniciar-se em 2016. Também está sendo avaliada a obra da Linha 3, toda em superfície, de Niterói a São Gonçalo. Há ainda estudos para levar o metrô da Barra ao Recreio e Jacarepaguá e para conectar Gávea a Botafogo, pelo Jardim Botânico. Por enquanto, todos os esforços se concentram no cronograma da Linha 4. Após a junção dos túneis dos dois trechos, serão concluídas a instalação dos trilhos e a fase de acabamento. Em março devem começar os testes com trens. A linha passará a receber o público em junho, quando, então, os cariocas poderão ter a incrível experiência de ir de Ipanema à Barra em apenas treze minutos. 

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