Ho ho ho, hic hic hic
Cervejas fabricadas especialmente para as celebrações do Natal conquistam os cariocas e se tornam uma opção para brindar na ceia
Desde o século XVII, e a despeito de parecerem elementos paradoxais, cerveja e religião caminham juntas. A história remete aos monges da Ordem da Trapa, nos Países Baixos, que produziam a bebida artesanalmente valendo-se de receitas raras passadas de geração a geração. Fabricadas ao longo do ano, as fórmulas mais exclusivas ficavam reservadas às datas religiosas. Para a celebração do Natal, o ápice do calendário cristão, eram selecionadas as melhores matérias-primas, guardadas no decorrer da temporada especialmente para a ocasião. Embora a tradição se mantenha intacta em algumas regiões europeias, nas quais oito mosteiros ainda produzem o líquido à moda antiga, o tipo trapista se disseminou pelo mundo e ganhou variantes. Com ele, espalhou-se também o hábito de preparar séries limitadas para o Natal.
No Rio, onde as cervejas especiais conquistam cada vez mais espaço nas prateleiras dos mercados e nos cardápios de bares e restaurantes, os gêneros sazonais são uma aposta do setor nesta época do ano. Entre os rótulos à venda temporariamente na cidade, de novembro a janeiro, figuram as belgas Delirium Tremens Noël, Gouden Carolus Christmas e St. Feuillien Cuvée Noël, além de marcas nacionais. Por serem voltadas para o consumo durante o rigoroso inverno europeu, as grifes importadas são mais encorpadas, além de possuir alto teor alcoólico (em torno de 10%), sabor levemente adocicado e coloração rubi. Elas caem bem com carnes robustas regadas a molhos igualmente densos. Portanto, não é o ideal para acompanhar receitas mais leves, como os pratos de bacalhau típicos das ceias brasileiras. É possível, no entanto, harmonizar a bebida com a nossa realidade. “Elas combinam com sobremesas como panetones, bolos escuros, frutas cristalizadas e castanhas”, afirma Andréa Calmon, uma espécie de sommelière de cerveja.
Atentas ao vigor do mercado, algumas empresas nacionais passaram a fabricar a bebida, adaptando-a ao gosto e aos termômetros dos trópicos. “Ela precisa ser mais leve, porque o consumo se dá no verão”, destaca o empresário Alexandre Bazzo, fabricante da Bamberg Weihnachts, do interior de São Paulo, que compõe o leque de opções nacionais, ao lado da catarinense Eisenbahn Weihnachts Ale e da também paulista Baden Baden Christmas. O preço é um aliado dos rótulos pátrios. Enquanto uma garrafa de 750 mililitros da St. Feuillien ou da Delirium Noël custa 69 reais, as marcas nacionais saem por 13 a 25 reais. Seja fabricado no país, seja no exterior, o fato é que o tipo sazonal aos poucos conquista o paladar do carioca. Prova disso é que o Delirium Café, bar em Ipanema que é referência no tema, triplicou a importação de natalinas em relação ao ano anterior. Ainda assim, um dos sócios, Hélio Vieira Jr., tem dúvida se a casa conseguirá suprir a demanda. Afinal, a cerveja não deixa de ser uma devoção do carioca.