Bossa Nova virou vinho
Movimento musical e cultural que projetou o Brasil para o mundo, como o carnaval e o futebol, há mais de meio século, a Bossa Nova agora batiza uma recém-lançada linha de espumantes brasileiros. Foto: Lia Soares Por Marcelo Copello O banquinho e o violão, quem diria, agora viraram vinho. Há mais de meio século (sim, […]
Movimento musical e cultural que projetou o Brasil para o mundo, como o carnaval e o futebol, há mais de meio século, a Bossa Nova agora batiza uma recém-lançada linha de espumantes brasileiros.
Foto: Lia Soares
Por Marcelo Copello
O banquinho e o violão, quem diria, agora viraram vinho. Há mais de meio século (sim, seus 50 anos foram completados em 2008) a Bossa Nova encanta o mundo e segue viva, rendendo frutos até mesmo no mundo de Baco.
O primeiro registro que se tem notícia da palavra bossa é dos anos 1930, na canção Coisas Nossas de Noel Rosa. Esta gíria poderia ser traduzida como “jeito” ou “estilo”, ou substituída por expressões inglesas como cool ou in. Já a locução bossa-nova surgiu nos anos 1950, como um “jeito novo de fazer música”, em contraposição a tudo que a juventude que frequentava as praias cariocas na época achava velho. Falamos dos melancólicos sambas-canção, boleros, valsas e serestas eternizados em vozes empostadas como as de Nelson Gonçalves, Orlando Silva e Carlos Galhardo.
Para entender o contexto em que a Bossa Nova germinou voltemos um pouco no tempo. Nos anos 1940 um jovem cantor americano, o magrelo Frank Sinatra, começou a “tocar” o microfone, usando-o como instrumento musical. Sinatra afastava o microfone na hora de soltar a voz e aproximava-se dele para cantar macio. Esta suavidade na voz influenciou muitos cantores, entre eles o brasileiro Dick Farney. Esta afinidade tornou-se explícita quando o fã-club Sinatra-Farney foi fundado em 1949, mostrando que um jeito novo de cantar ganhava popularidade.
A Bossa Nova nasceu nos anos 1950 em circunstâncias ufanistas. Enquanto em 1956 jovens como Carlos Lyra, Roberto Menescal e Ronaldo Boscoli se encontravam para mostrar suas músicas no apartamento de Nara Leão, em Copacabana, o presidente Juscelino Kubitschek tomava posse e a Seleção Brasileira de futrbol se preparava para conquistar a Copa de 1958.
Neste meio tempo, um ano antes mais precisamente, um baiano chegava ao Rio de Janeiro. João Gilberto, ao gravar em 1958 a canção Chega de Saudade (de Tom Jobim e Vinicius de Moraes), daria o primeiro passo para este novo estilo conquistar o mundo.
Demorou apenas 4 anos para a Bossa Nova ir de Copacabana a Nova York e lotar o Carnegie Hall, no histórico show de 1962. O main-stream seria irrevogavelmente conquistado quando “A Voz”, Frank Sinatra, gravou seu primeiro disco com Tom Jobim, em 1967.
Hoje, canções como Garota de Ipanema e Wave estão entre as mais executadas do planeta. A Bossa Nova também foi incorporada ao repertório do meio musical mais exigente da história contemporêna – o jazz –, além de influenciar inúmeros artistas da música pop mundial.
A Bossa Nova é mais um estilo (uma maneira de tocar e cantar), do que um movimento musical. Podemos descrevê-la como intimista, coloquial, de canto-falado e baixinho, alegre (porém contido, sem euforia), otimista, leve, suave (ritmo moderado), de uma simplicidade sofisticada (harmonias complexas) e descompromissada (despolitizada). Além disso, a Bossa Nova é inteligente nas letras e ao mesmo tempo romântica, pois fala de amor, mas de um amor bem resolvido, sem fazer da mulher uma vilã.
Há muitos vinhos “bossa nova”, afinal nada mais cool que o néctar de Baco, em contraposição à melancolia dos destilados e à euforia das cervejas. A simplicidade do vinho está em sua origem rural e a sofisticação, nas muitas formas de seu consumo.
O vinho em geral é uma bebida intimista, muito mais para um petit comité do que para “Maracanã”. Intrinsecamente otimista, o vinho é de bem com a vida e com a saúde. Assim como a Bossa Nova, o vinho é inteligente, complexo e, podemos dizer, feminista, pois sua história (especialmente a do Champagne) foi e é protagonizada por muitas mulheres.
Uma destas personagens de destaque do mundo de Baco é a enóloga portuguesa Filipa Pato, que com seu marido William Wauters lançou ano passado dois vinhos, o “Bossa” e o “Nossa”, ambos trazidos pela Casa Flora (www.casaflora.com.br).
- Bossa 2010 (R$ 28,90). Elaborado com as castas Maria Gomes e Bical. Muito claro, esverdeado e brilhante. Aroma elegante e fresco, cítrico, limão, flores brancas. Paladar muito leve, macio e seco, com12,5% de álcool e boa acidez. Leveza, frescor e elegância. Nota 86 pontos.
- Nossa Calcário 2010 (R$ 75,60). Elaborado com 100% casta Bical, de plantas de 25 anos de idade de um vinhedo excepcional, de solo argilo-calcário anenoso, em Óis do Bairro, aldeia do século XIX famosa por seus vinhos brancos. O vinho é fermentado em barricas de 500 litros onde permanece cerca de 5 meses. Amarelo palha claro com reflexos esverdeados. Aroma intenso e elegante, mostrando óbvio acento mineral emlodurado pro frutas como cítricos, frutas secas como amêndoas e toques defumados. Paladar de médio corpo, cremoso e de ótima acidez, 12,5% de álcool, equilibrado e complexo, um branco para guarda. Nota 92 pontos.
.
Esta união “Vinho & Bossa Nova” já recebeu também uma merecida homenagem no Brasil, da novíssima vinícola Hermann (www.vinicolahermann.com.br). A recém-lançada linha de espumantes Bossa é tão tropical e refrescante quanto o ritmo musical, e chega nas versões Brut (Bossa No 1), Demi-Sec (Bossa No 2), Rosé (Bossa No 3) e Moscatel (Bossa No 4). Testei dois rótulos desta linha:
- Bossa Brut Nº 1 (R$ 25,20). Palha claro esverdeado, com boa perlage, abundante e de tamanho médio. Aroma delicado de especiarias, flores brancas, pêra, melão, acácia. Paladar de bom corpo, intenso, boa acidez, boa cremosidade. Nota 86 pontos.
- Bossa Rosé Nº 3 (R$ 25,20). Cor de cereja, perlage perfeita, pequena e abundante. Aroma intenso mas não muito limpo, de cerejas maduras, geléia de morango. Paladar leve e fresco, Cos bem presente, boa acidez, cremoso. Nota 85 pontos.
Nada mais apropriado agora do que propor um merecidíssimo brinde à Bossa Nova!
.
Marcelo Copello