A cultura fora dos planos
Mal havia sido divulgado o resultado das eleições e eu escrevi no Facebook: “Agora que acabou, eu gostaria de saber: qual é a política para a CULTURA?” (assim mesmo, em caixa alta.) Circunstancialmente, tendo sido Dilma Rousseff a vencedora do pleito, a pregunta era dirigida a ela. Mas poderia ter sido endereçada a Aécio Neves. […]
Mal havia sido divulgado o resultado das eleições e eu escrevi no Facebook: “Agora que acabou, eu gostaria de saber: qual é a política para a CULTURA?” (assim mesmo, em caixa alta.) Circunstancialmente, tendo sido Dilma Rousseff a vencedora do pleito, a pregunta era dirigida a ela. Mas poderia ter sido endereçada a Aécio Neves. Acho que não faria grande diferença. Muito se falou sobre as baixarias das campanhas. Mas, esporadicamente, ainda se ouvia uma ou outra proposta. Falou-se em ampliação de programas sociais, reforma política, crescimento econômico, investimento em educação. Sobre cultura, necas.
Antes que me apedrejem, digo logo que talvez eu esteja sendo leviano. Talvez ambos os candidatos tenham apresentado suas políticas culturais para o Brasil, e eu é que não atentei para o fato. Para evitar injustiças, fui atrás do programa de governo da presidente reeleita (que, a esta altura, como vencedora, é quem pode ser cobrada). Em 42 páginas, a palavra “cultura” e suas variações – “cultural”, “culturais” – aparecem treze vezes. Parte das menções não se refere a propostas, como no trecho em que se lê sobre o desejo de que o Brasil seja “um país onde todas as pessoas tenham os mesmos direitos: à liberdade de informação e de opinião, à cultura, ao mercado de consumo (…)”.
No trecho que mais se parece com uma proposta, lê-se que “no segundo governo Dilma, avançaremos ainda mais na Cultura e no Esporte, aprofundado os programas já estruturados (…)”. Que “O Sistema Nacional de Cultura continuará sendo fortalecido, assim como todas as políticas públicas integradas decorrentes da sua criação”. E que “a adoção de medidas para a aceleração da implantação do Vale Cultura ajudará a criar uma nova geração de consumidores culturais, favorecendo e estimulando a produção nacional”. Convenhamos, é tudo muito vago. E, considerando o tema deste blog, talvez seja interessante notar que a palavra “teatro” não é citada uma vez sequer. Não sei se o plano de Aécio ia muito além disso – não fui atrás para ler. De todo modo, é estranho (e isso vale tanto para Dilma quanto para o tucano) que, ao longo de uma campanha inteira, qualquer interessado em saber as metas dos candidatos para a cultura tenha sido obrigado a catá-las na internet.
No âmbito estadual, não vi nada muito diferente. Segundo o programa de Luiz Fernando Pezão (que procurei no Google, porque também não ouvira ou lera nada consistente a respeito durante a campanha), as metas do seu governo são a ampliação da rede de bibliotecas-parque, o lançamento da segunda fase do programa Rio Criativo (descrito como uma “incubadora pública de empreendimentos criativos”) e a criação e consolidação do Sistema Estadual de Cultura (que, pelo programa, não dá pra saber direito o que é). Até a construção do Museu da Imagem e do Som, que já está rumando para sua conclusão, é citada como plano. E só.
Alguém pode retrucar que, em um país onde ainda tem gente que passa fome, ir ao teatro é um luxo desnecessário. É um raciocínio torto, porque uma coisa não deveria anular a outra. Ou pode-se dizer que, dada a nossa classe política, o melhor que nossas autoridades podem fazer para a cultura do país é justamente não mexer muito nela. Talvez. Mas não é justamente um país culturalmente forte o mais capaz de fiscalizar seus políticos? George Bernard Shaw disse certa vez que “nós aprendemos da história que nós aprendemos nada da história”. Se a máxima é mesmo verdadeira, como parece ser, o tratamento dispensado à cultura certamente tem algo a ver com isso.