Todas as cores do Prêmio da Música Brasileira, agora em novas mãos
Estreando na direção do PMB, Giovanna Machline, filha de Zé Mauricio, assume o projeto e promete ainda mais novidades
Novos ventos sopram na direção do Prêmio da Música Brasileira, o mais importante na cena musical. Na última quarta-feira, 12 de junho, a 32ª edição do PMB mostrou, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, todas as cores e ritmos da música brasileira atual. E foi Giovanna Machline, 38 anos, que, ao lado de seu pai, Zé Mauricio Machline, transformou aquele palco na grande festa do “síndico” Tim Maia, o homenageado da noite. Giovanna, que conviveu com um efervescente caldeirão musical dentro de casa, assume a partir de agora a direção do projeto e promete honrar, com muito entusiasmo, o legado de seu pai.
Essa edição do PMB entra para a história. A noite premiou os cantores, compositores, produtores e musicistas que mais se destacaram no decorrer de 2023, em 33 categorias. Mas foi a homenagem a Tim Maia, um dos mais importantes artistas nacionais, que fez daquela uma noite especial. Tim é unanimidade, em todas as gerações.
Mais uma vez, no palco do PMB passaram artistas dos mais diferentes gêneros, interpretando canções do homenageado. No roteiro, clássicos como “Gostava Tanto de Você”, “Coroné Antônio Bento”, “Primavera”, “Azul da Cor do Mar”, “Você”, “Réu Confesso”, “Não Quero Dinheiro”, em encontros musicais inusitados, que mostraram a pluralidade e as nuances rítmicas de um Brasil que vai do samba ao sertanejo, do funk ao rock, sem nenhum problema.
Quanta beleza nas misturas de artistas: Criolo, Lazzo, Jota Pê e Yan Cloud, Céu e Xamã, o trio Monica Salmaso, Chico Cesar e Alceu, Simone e Nei Matogrosso, Silva e Zélia Duncan, Cida Moreira e Rico Dalasam, Negra Li, Sandra De Sá, Sued Nunes e Tony Tornado, passeando pelo universo musical de Tim. E mais que tudo, que emoção ver Toni Tornado, nos seus 94 anos, dando um show à parte. Aliás, a noite foi marcada por artistas que provaram que idade e vitalidade não têm nada de contraditório.
A premiação de Lia de Itamaracá – Lançamento / Categoria Música Regional – foi um desses momentos, com a plateia de pé ovacionando aquela rainha pernambucana, deusa naquele palco sagrado. Ela, visivelmente feliz e agradecida, uma divindade na sua imensidão, uma artista que construiu sua carreira dentro da sua verdade. Macalé foi outro super premiado, com dois troféus para Lançamento e Melhor Canção na Categoria MPB. Antes do último número musical, teve ainda a bela homenagem a Jacques Morelembaum.
A cenografia de Gringo Cardia foi um capítulo à parte. De tirar o fôlego. Me pergunto sempre como o Gringo consegue: tudo é lindo no que ele faz. Na grande tela ao fundo do palco, uma mistura de imagens multicoloridas, trazendo obras de jovens artistas da periferia. A escolha de Gringo não poderia ter sido mais representativa, para ilustrar uma noite dedicada a Tim Maia. Ele certamente, se ali estivesse, teria desfrutado desta festa de cores. Gringo nos conduziu por um Brasil admirável, em todos os tons, que ele nos apresenta, acima de tudo, como uma nação tão plural, que nos enche de orgulho.
Sobre o futuro do Prêmio da Música Brasileira e os projetos novos, quem nos conta é Giovanna Machline, na entrevista que segue abaixo.
Algum dia você imaginou comandar o Prêmio da Música Brasileira? Você já estava envolvida de alguma maneira?
Giovanna – Já, há muitos anos que eu faço toda a direção musical do Prêmio. Eu tenho uma carreira paralela no audiovisual: trabalhei 18 anos na Globo, faço novelas como “Beleza Fatal”, da Warner/HBO, que estreia em janeiro. Mas um acordo que eu sempre tive, onde quer que eu estivesse, é que ia trabalhar no Prêmio. E assim eu consegui, nos últimos 20 anos, parar uma semana e cuidar dos ensaios musicais e do palco. Mas eu nunca tinha feito o que eu fiz esse ano, que foi assumir de fato a direção. Eu conceituei a noite e trouxe a participação de um balé, aquele formato um pouco mais informal, com a expertise da Regina (Casé) pra isso. Assumi também a produção e a gerência geral do projeto. Eu sempre estive dentro do Prêmio, mas dessa forma foi a primeira vez.
Você se sente preparada?
Giovanna – Sim, exatamente porque são muitos anos. E acho que uma carreira alimenta a outra, no sentido de que hoje tudo é audiovisual. As mídias sociais tornam tudo áudio e também visual…(risos)… E eu consigo juntar as duas coisas. Isso me faz sentir mais forte para assumir essa tarefa. Eu também me sinto preparada porque tenho esse legado na minha mão, e é uma responsabilidade absurda. Tem 20 anos que eu vejo tudo acontecer, que eu transito nesse ambiente. É uma honra e uma responsabilidade absurda. Vou fazer junto com meu pai, ele não está saindo. Acho que é refrescar o formato. É plantar uma semente nova para olhar para um futuro diferente.
O que muda daqui pra frente? Quais as novidades?
Giovanna – O Prêmio tem uma identidade e já é maior de idade. Com esses anos todos, eu entendo que o nome Prêmio da Música Brasileira vai além da noite de premiação. É uma casa de encontros da música. E a nossa ideia, que ainda vamos formatar, é que essa empresa se torne, de fato, a casa da música brasileira. Que possamos promover encontros e conteúdos para a música e sobre ela ao longo do ano todo. Tem um documentário que vamos lançar em breve, o PMB Casa, em que mapeamos os estados do Brasil que são muito frutíferos musicalmente. Esse é um movimento de acolher a música e tentar também promover encontros comerciais. Entender o que uma empresa precisa e como ambos podem se retroalimentar, trazendo conteúdos que as empresas precisam e o que os artistas têm a oferecer. Esse é o futuro: construir um lugar em que o artista brasileiro tenha segurança de participar e fazer com que seus projetos sejam frutificados.
A noite da premiação então vai ser o ápice de um projeto permanente, é isso?
Giovanna – É isso. O Prêmio vai continuar existindo, ele é uma noite. Mas queremos mostrar para o púbico e para os artistas que tem muita coisa a ser feita. Reunir artistas jovens, como fizemos no documentário, em que juntamos, em Salvador, Sued Nunes e Yan Cloud, por exemplo, com o Lazzo Matumbi e Mariene de Castro, que já têm uma trajetória artística. É importante colocar luz nos novos nomes também, fazer esse intercâmbio. A ideia é fazer isso o tempo todo, com mais frequência, e não deixar pra apenas uma vez por ano, naquela noite da premiação.
E você convivia com música na sua casa, o tempo todo?
Giovanna – O tempo todo. O Nizan (Guanaes) é que sempre brincava. Ele falava que eu ia passar por mentirosa porque ia chegar na escola e dizer ‘ontem, na minha casa, estavam os amigos do papai tocando violão: o Gil, o Almério, a Mariene’… (risos) E era verdade…
Deve ter sido uma delicia isso ter vivido nessa casa…
Giovanna – Muito! Até hoje. Esse é o grande legado que temos, uma herança musical incrível. Agora é minha filha, que tem 3 anos, que está desfrutando disso. No domingo, por exemplo, o Zé Ibarra estava lá em casa, no sofá tocando violão. Aí ela pediu que tocasse W/Brasil. Então é isso, já estamos na terceira geração.
Rita Fernandes é jornalista, escritora e pesquisadora de música, cultura e carnaval.