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Por Rita Fernandes, jornalista
Um olhar sobre a cultura e o carnaval carioca
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O carnaval de rua se despede de Nelson Sargento

Com sua simplicidade elegante, o sambista nos dava a honra de nos ajudar naquela maluquice que era escolher música de bloco para desfilar no carnaval

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Atualizado em 27 Maio 2021, 13h44 - Publicado em 27 Maio 2021, 13h41

Estava escrevendo o texto dessa coluna sobre o carnaval de 2022, quando chegou a notícia da morte do cantor e compositor Nelson Sargento. Que tristeza tudo isso! Baluarte da Mangueira, o sambista de 96 anos se foi, deixando órfãs várias gerações de músicos e artistas que o têm como referência. Mais um nesse mar de irresponsabilidades quando o assunto é Covid-19.

Com certeza, teremos várias homenagens a esse artista que vivenciou todos os momentos do samba carioca em quase um século de vida. Entre eles, os momento em que o gênero “agonizava” longe das rádios e das gravadoras, como ele cantava nos versos da sua música mais conhecida, “Agoniza, mas não morre”. Quem é frequentador de rodas de samba conhece bem, como também “Falso Amor Sincero” (“O nosso amor é tão bonito, ela finge que me ama e eu finjo que acredito”), e tantas outras entre as mais de 400 que compôs.

Eu me lembro muito dele quando as rodas de samba voltaram a ganhar fôlego, na década de 1990, especialmente as do Candongueiro, em Niterói. Nessa, era presença constante, com sua mulher Evonete, e ao lado de um outro amigo que também já se foi, o sambista Guilherme de Brito.

Nelson participou como jurado de várias escolhas de samba do Imprensa Que Eu Gamo.
Nelson participou como jurado de várias escolhas de samba do Imprensa Que Eu Gamo. (Publius Vergilius/Sebastiana/Divulgação)

Mas as lembranças mais vivas são de quando ele participava das escolhas de samba dos nossos blocos de carnaval. No “Imprensa que eu Gamo”, bloco do qual sou fundadora com outros amigos e do qual faço parte até hoje, passados 26 anos, por diversas vezes ele nos prestigiou, quando ainda ocupávamos a Casa da Mãe Joana, em São Cristóvão, nos nossos eventos pré-carnavalescos. Lembro muito da escolha de samba para o carnaval de 2000, tão esperado por ser a virada do milênio, na antiga sede do Bola Preta, na Rua Treze de Maio, Centro do Rio. Era uma delícia ter ele ali com a gente, na mesa de jurados, dividindo conversas, histórias e opiniões. Nesse ano, venceu o samba de Marceu Vieira, Lefê Almeida e Janjão Pimentel, “Extra, Extra”, entre outros muito inspirados que nos desafiavam na escolha. E Nelson ali, ponderando tudo, das estrofes ao refrão, a melodia e tudo mais.

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Pessoa gentilérrima, de uma simplicidade elegante, carismático no seu jeitinho, Nelson Sargento nos dava a honra de nos ajudar naquela maluquice que era escolher música para desfilar no carnaval. Não foi só no Imprensa que estive com ele, mas também nas lendárias escolhas de samba do Simpatia é quase amor, no Clube Condomínio, e do Bloco do Barbas. No Barbas, inclusive, ele participava ativamente das rodas de samba e dos eventos desde 1981, quando havia apenas o bar em Botafogo, que depois deu origem ao bloco de mesmo nome em 1985. No Carmelitas, Nelson até ganhou homenagem e o Troféu Carmelitas 2010.

A imagem mostra Nelson Sargento, vestido de verde e rosa
Nelson Sargento: foi infectado mesmo após tomar as duas doses da vacina contra a Covid-19 (Edinho Alves/Divulgação)

E, claro, Nelson era a cara da sua Mangueira, escola de samba do seu coração, onde era presidente de honra e para a qual compôs alguns dos sambas-enredos mais importantes da história da escola, como ‘Primavera’, em 1955 com Alfredo Português, que também ficou conhecido como ‘As quatro estações’.

Amigo e parceiro de outros ícones do samba, como os também mangueirenses Cartola, Carlos Cachaça e Darcy da Mangueira, Nelson fez história participando de grupos importantes como A Voz do Morro e Os Cinco Crioulos, com esses no antológico show “Rosa de Ouro”, produzido por Hermínio Bello de Carvalho, em 1966, no Teatro Jovem, em Botafogo.

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Por tudo o que Nelson Sargento representa, deixo registrada aqui toda a minha admiração por ele, esse ser humano exemplar, esse artista multifacetado, sobrevivente das injustiças e desigualdades desse país que ainda não soube se retratar com os pretos, com as mulheres, com os pobres, com todas as populações injustiçadas.

Se depender da gente, o samba nunca vai morrer, Nelson! Que os deuses te recebam em festa no céu, com seus amigos tão queridos que já te esperam com um novo violão. O carnaval de rua te reverencia e se despede, baluarte!

Rita Fernandes é jornalista, escritora, pesquisadora de cultura e carnaval e presidente da Sebastiana.

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