Imagem Blog

Rita Fernandes

Por Rita Fernandes, jornalista Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Um olhar sobre a cultura e o carnaval carioca

Arte negra na veia

Artistas negros ocupam a timeline de João Cavalcanti e revelam o Brasil que muitos não querem ver

Por Rita Fernandes Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 9 jun 2020, 16h51 - Publicado em 9 jun 2020, 15h37
Aiace, cantora baiana de Salvador, é uma surpresa e tanto, cantando "Cordeiro de Nanã"
Aiace, cantora baiana de Salvador, é uma surpresa e tanto, cantando "Cordeiro de Nanã" (Foto Matheus L8/Divulgação)
Continua após publicidade

João Cavalcanti, cantor e compositor carioca, resolveu usar sua rede social para dar visibilidade a artistas negros. Desde a semana passada, iniciou uma série de posts com os temas “Eu ouço” e “Eu vejo, em que apresenta artistas pelos quais tem profunda admiração. A surpresa foi João apresentar artistas tão potentes, alguns que eu não conhecia, o que  me chamou ainda mais a atenção. Arte negra na veia, de encher a alma de alegria.

Foi no domingo que me dei conta, com o vídeo da cantora Aiace em “Cordeiro de Nanã”. No post, João não dizia mais que uma única frase: “Eu ouço Aiace”. Querendo saber mais, corri para a página dela.

View this post on Instagram

⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ #Repost @aiaceoficial "Cordeiro de Nanã" @mateusaleluia

A post shared by João Cavalcanti (@ojoaocavalcanti) on

Baiana de Salvador, Aiace é uma surpresa e tanto. Filha do compositor Gileno Félix, criou o grupo Sertanília, em 2010, e lançou seu primeiro trabalho solo em 2017, o disco “Dentro Ali”, que traz as participações especiais de Luiz Melodia e Lazzo Matumbi. Com um trabalho muito consistente, Aiace tem influências de um sertão que ela diz ser anterior a Luiz Gonzaga, com cocos e maracatus, já cantado por artistas como Elomar. Fico sabendo também que a moça carrega algumas premiações. “Meu primeiro contato com Aiace foi por causa do Prêmio da Música Brasileira, ano passado, em que ela concorreu e eu era jurado. Fiquei espantado com a qualidade e a voz”, diz João.

Volto à página dele e encontro mais cinco publicações. Caio Prado, do trio Não Recomendados, canta a capella “Não Sou Teu Negro”, e a primeira estrofe bate no peito como a força de tambor: “Não nasci pra te servir, nem te ouvir. Eu sou canto de zumbi, resisti. A desumanização é que faz tua condição, desde a colonização, no meu chão”.

Continua após a publicidade
View this post on Instagram

31 • 05 • 2020 Não nasci pra te servir nem te ouvir Eu sou canto de Zumbi, resisti A desumanização é que faz tua condição Desde a colonização no meu chão Hoje sei do meu valor, negro amor Me levanto junto a voz dos irmãos Pra fazer reparação deve haver na nossa mão A riqueza fruto da nossa dor A conduta dos meus filhos será fogo nos racistas Não tem nota de repúdio nem lamento à nossa morte É o povo preto que se move No grito de libertação Não sou teu negro Eu digo: não sou teu negro #vidasnegramimportam #blacklivesmatter #podernegro #blackpower #blackouttuesday

A post shared by Caio Prado (@ocaioprado) on

“Eu ouço Josyara” apresenta a cantora, compositora e instrumentista nascida em Juazeiro, norte da Bahia, radicada há quatro anos em São Paulo, com seu violão cheio de elementos eletrônicos na música “Virá”, que João reposta no seu perfil. Chego ao clipe “Som Brasil”, com Nego Álvaro cantando “Pernambuco me deu maracatu, é um baque virado feito samba”. No post, o comentário dele, sublinhando “Sejamos sempre #antiracista! Importante dizer que num mercado majoritariamente branco, esse clipe foi escrito, dirigido, filmado e editado por Pretos”. Salve Nego Álvaro, abre a roda pro cateretê!

Completa a série o post “Eu vejo Samuel de Saboya”, e aí o coração explode de emoção. O artista plástico pernambucano, tão jovem, já ganhou mundo com a exuberância do seu talento, mas não tem a mesma visibilidade por aqui. Samuel acabou de estrear sua primeira exposição solo em Zurich, “A Bird Called Innocence”, “uma ode à negritude, vida e sonhos”, segundo ele. “No meio do caos, fico feliz de trazer vida e de continuar a mostrar que somos possíveis”, escreveu no seu perfil, sábado 6, data da estreia.

Continua após a publicidade
View this post on Instagram

Eu vejo @samueldesaboia.

A post shared by João Cavalcanti (@ojoaocavalcanti) on

Fecho minhas incursões pelo perfil do @ojoaocavalcanti com a publicação de “Eu ouço Nilze Carvalho e PC Castilho”, cantando juntos “Pelourinho”, de autoria do PC e Luiz Perequê. “Quanta história tá na mão do tambor”, né, minha gente?

JOAO CAVALCANTI 8 – CREDITO FLORA PIMENTEL
“Eu estou silenciado, sem conseguir compor. Indignado com o absurdo que é essas pessoas não serem vistas e ouvidas” (Foto Flora Pimentel/Divulgação)
Continua após a publicidade

“Estou silenciado, sem conseguir compor. Indignado com o absurdo que é essas pessoas não serem ouvidas. A voz delas é muito mais importante do que as nossas nesse momento”, desabafa João, sob o impacto de tantas notícias pesadas e depois de ter vencido o Covid-19. “Precisamos rumar em direção à equidade, para sempre, porque um dia isso tudo vai ter que mudar”, me diz. Eu sinto a mesma coisa, João!

A timeline @ojoaocavalcanti está dedicada por tempo indeterminado a essa legião de Aiaces, Caios, Negos, Josyaras, Nilces, PCs e Samuels. A ajuda talentosa de Miriam Roya, sua mulher, companheira de trabalho e jornadas diárias com os três filhos, Tom (10), Luna (9) e Martin (3), tem sido decisiva nesses tempos de pandemia. Obrigada, pessoal!

Rita Fernandes é jornalista, escritora, idealizadora do projeto Casabloco, presidente da Sebastiana e pesquisadora de cultura e carnaval.

Publicidade

Essa é uma matéria fechada para assinantes.
Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

Impressa + Digital no App
Impressa + Digital
Impressa + Digital no App

Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

Assinando Veja você recebe mensalmente Veja Rio* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
*Para assinantes da cidade de Rio de Janeiro

a partir de 35,60/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.