A vida é sincronicidade: de uma live de carnaval cheguei aos caiçaras
Dois jovens músicos me levaram às comunidades tradicionais da Reserva Ecológica da Juatinga e suas culturas que valorizam natureza e solidariedade
Apesar do bombardeio de notícias sobre Covid-19, índios e caiçaras ocuparam a minha cabeça no último fim de semana. Índios, por conta das homenagens do dia 19 de abril. Caiçaras, depois de ouvir dois jovens músicos contarem suas vivências na Reserva Ecológica da Juatinga, litoral sul do Rio de janeiro, aqui tão perto de nós.
Me pergunto como é que até hoje nunca visitei essas comunidades caiçaras, já tendo ido tantas vezes à Paraty.
Minha curiosidade sobre o assunto se deu na live que os músicos Thales Browne e Bê Camará fizeram sobre carnaval. Mas o que mais me chamou a atenção foi quando os dois primos, juntos numa “imersão criativa” nessa quarentena, começaram a falar das suas experiências com os povos caiçaras. Tive que ligar pro Thales e pro Bê, claro!
Thales é geógrafo, saxofonista e fundador da Charanga Talismã, morou no Pouso da Cajaíva por dois anos e trabalhou oito anos naquela região. Foi lá que conheceu e fez amizade com mestres griôs, com suas histórias e saberes, passados pela tradição oral, e moradores como Dona Dica e Ticote.
Bê, cantor e compositor da banda Bê e os Botos, exibiu um clipe que ainda vai lançar, chamado “Saco do Mamanguá”, inspirado naquele lugar (no próximo dia 24, em @beeosbotos). Os dois, que ainda não tinham composto juntos, diziam que tinham sido influenciados pelas mesmas vivências caiçaras. “Foi muito forte a experiência e mudou meu jeito de compor, meu jeito de olhar o mundo. Eles usam os recursos naturais pela necessidade e não pelo acúmulo, vivem com acolhimento, solidariedade e senso de comunidade ”, contou Bê Camará.
Como isso tudo me soou atual! Saí daquela conversa com uma vontade danada de pegar o carro e descer a BR-101. Ver como estão se virando aquelas comunidades que vivem entre o mar e a montanha, numa região que considero uma das mais bonitas do Brasil. Preciso conhecer os caiçaras. Visitar de novo esse litoral que abriga mais de 30 localidades, hoje consideradas Patrimônio Mundial da Unesco. São duas terras indígenas, dois territórios quilombolas e 28 comunidades tradicionais caiçaras, um mergulho de tamanha diversidade cultural e ambiental.
Quem quiser se aventurar, o melhor ponto de partida é Paraty, e de lá pega-se um barco em uma viagem de cerca de duas horas até a Praia Grande de Cajaíba, por exemplo, onde vive Dona Dica, mestre da farinha e das artes da cestaria em cipó. Com quase 1 km, é uma das praias mais lindas, com cachoeiras, rios e piscinas naturais. Existem alguns bares que servem comida caiçara, mas, para passar a noite só mesmo alugando a casa de moradores ou acampando. Em Pouso da Cajaíba, na mesma enseada, mora Ticote, mestre griô e fundador do Instituto de Permacultura e Educação Caiçara (IPECA).
Entre lives, leituras, música e muita conversa, vou costurando minha colcha de retalhos. Quem diria que partindo do carnaval eu ia chegar aos povos tradicionais. E por que não? Só mostra que a vida é sincronicidade. Quando essa pandemia passar, vou precisar de muito tempo para conhecer de perto o que a minha memória puder guardar.
PS – Na conversa, Thales me contou que no último carnaval saiu de Bispo do Rosário, meu tema da coluna anterior. É a vida nos levando para um mesmo lugar.
Para saber mais sobre os Caiçaras:
https://www.youtube.com/watch?v=xTF81v7aEEk&feature=youtu.be
https://www.youtube.com/watch?v=UhQlYr3b3WA&feature=youtu.be
Para ver o clipe do Bê, a partir de 24 de abril:
https://www.instagram.com/beeosbotos/