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Rafael Mattoso

Por Rafael Mattoso, historiador Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Curiosidades sobre o subúrbio carioca

Madureira comemora 407 anos

Um patrimônio da diversidade cultural carioca completa mais um ano de muitas histórias

Por Rafael Mattoso Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO
Atualizado em 27 Maio 2020, 08h48 - Publicado em 25 Maio 2020, 16h16
 (Roberta Mathias/Flightradar24)
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Em 2007, Arlindo Cruz lançava seu álbum “Sambista Perfeito”. A primeira faixa trazia um samba que rapidamente virou uma espécie de hino de Madureira, Meu Lugar, parceria com Mauro Diniz.

Logo na segunda estrofe, a identificação dos moradores suburbanos com a música se estabelece com certa facilidade e orgulho; “O meu lugar/ É cercado de luta e suor/ Esperança num mundo melhor/ E cerveja pra comemorar”.

É fato que o mês de maio é um período que representa muitas lutas, começando pelo Dia do Trabalhador, seguido do ritual simbólico fruto da pressão abolicionista, da luta antimanicomial e terminando com o Dia África, ou da Organização de Unidade Africana na luta anticolonial.  Para aumentar ainda mais a consciência, maio também é o mês dos aniversários do Méier e de Madureira, do nascimento de Lima Barreto, da Fiocruz, do Clube do Samba e, infelizmente, de um ano da morte de Tia Maria do Jongo.

Conversando com a professora da FEBF/Uerj, Ana Paula Alves Ribeiro, especialista que lança nesta segunda, 25 de maio, a versão digital do livro “Memórias, Identidades, Territórios: diálogos entre gerações na Região da Grande Madureira”, recebemos uma bela dica musical para melhor entender Madureira. Além de nos deixar uma playlist, ela disse: “Em uma busca rápida, esbarramos com Madureira cantada e exaltada por compositoras e compositores, que nasceram, viveram, amaram e se encontraram neste bairro do subúrbio, que completa mais um aniversário. Como bairro ou entendido como uma região, sua geografia, afetos, personagens são trazidos em acordes que eternizam o bairro e em grande medida a região”.

Ana enfatiza Madureira como: “lugar de encontro, experiência, convivência, cultura, samba e jongo, compras no Mercadão e espiritualidade. Pode se configurar também como lugar de passagem ou trânsitos, mas nunca apenas”.

Entre as músicas selecionadas pela pesquisadora chama a nossa atenção um maior número de sambas, passando pelo Império Serrano e Portela, que ajudam a construir um imaginário de ‘capital do samba’. Letras de nomes consagrados como Dona Ivone Lara, Marquinhos de Oswaldo Cruz, Fundo de Quintal, Arlindo Cruz e Sombrinha, Clara Nunes, Roberto Ribeiro, João Nogueira, Jorge Ben Jor, Pretinho da Serrinha, Serjão Loroza, entre muitos outros, podem ser ouvidas no link da playlist abaixo, que tem como título Para Celebrar Madureira:

https://open.spotify.com/playlist/01i57HYapYEQH0f4pFPuk5?si=Zx40iTUyTqikMgt-D3j6Pg

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 Já o livro é um dos resultados da reunião de pesquisadores que buscam potencializar o diálogo e chamar novos parceiros para conversar e pensar Madureira. A obra é organizada por Ana Paula Alves Ribeiro, Gabriel da Silva Vidal Cid e Guilherme Ferreira Vargues. A publicação encontra-se para download no site do Museu Afrodigital Rio de Janeiro.

Livro Madureira
(Museu Afrodigital UERJ/Divulgação)

Um amigo suburbano, Reinaldo Ramos, certa vez falou que Madureira é a grande encruzilhada da cidade. Lugar de diversidade religiosa, de intenso comércio, de Samba, Jongo, Charme, Hip Hop, futebol, da Parada LGBT e muito mais. Espaço da afro brasilidade, onde as diásporas se reconfiguram em novas identidades.

Sobre a idade que este grande aniversariante, Madureira, completou nesse dia 24 de maio, muitos vão contestar seus 407 anos. De fato, a escolha administrativa que indica mais de quatro séculos de história deixa brechas para questionamentos. Se partirmos do marco da guerra de fundação da cidade por Estácio de Sá, o Rio de Janeiro teria 455 anos, ou seja, apenas 48 anos após o ano de 1565 as terras do que viria a ser considerada como a atual Madureira já teriam iniciado sua ocupação.

Como historiador sou obrigado a afirmar que as fontes são pouco precisas, porém encontramos alguns indícios de uma primeira chegada dos colonizadores na região, já no início do século XVII, em duas fazendas originarias da concessão de sesmarias jesuíticas, a fazenda do Campinho e da Portella.

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É interessante constatar que a atual Igreja de Nossa da Apresentação do Irajá, originalmente matriz administrativa da Freguesia, ostenta até hoje o ano de 1613 gravado na pedra colonial de sua fachada. Será que na mesma data foi concedida a Dona Maria de Oliveira as terras que, em 1800, passariam às mãos do capitão Francisco Inácio do Canto? Não podemos confirmar exatamente, mas sabemos que esse capitão teria arrendado uma parte da sua propriedade para o boiadeiro de nome Lourenço Madureira, alguns anos após.

Lourenço deteve o imóvel até falecer, em 16 de fevereiro de 1851.  Apenas sete anos após sua morte os trilhos da Estada de Ferro Dom Pedro II, atual Central do Brasil, cruzaram o chão onde, em 1890, seria inaugurada uma estação em homenagem ao seu sobrenome.

Tal como descreve a Revista Rio Ilustrado de 1937, o Largo do Campinho se tornaria um importante ponto de convergência de caminhos que ligavam tanto a estrada de Jacarepaguá, em direção ao Engenho D’Água, como a estrada do Piraquara, seguindo para as fazendas Jesuítas de Santa Cruz, Itacurussá e Itaguaí. Do Campinho também se partia para o porto de Irajá, seguindo a Estrada da Nova Freguezia e logo em seguida pegando a Estrada da Pavuna.

Tempos depois foram surgindo bairros como Oswaldo Cruz, Turiaçu, Vaz Lobo, Cavalcanti, Engenheiro Leal, Cascadura e Campinho e o comercio foi se fortalecendo em torno de Madureira.

Quilombo Agbara Dudu
(Divulgação/Arquivo pessoal)
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Hoje Madureira tem atrativos para todos os gostos. Um belo parque que está entre os maiores da cidade, uma grande rede de transporte que conta com Trens e BRT, um comércio extremamente forte em seu aspecto formal e informal. O centenário Mercadão, o Polo 1, o “Tem Tudo”, o Madureira Shopping e shopping dos peixinhos. Tem cultura de referência no baile Charme do Viaduto Negrão de Lima, na quase centenária Portela e no septuagenário Império Serrano, também podemos citar a Tradição. Tem incríveis exemplos de resistência afro-brasileira como o Centro Cultural Jongo da Serrinha, o Quilombo Urbano Cultural Agbara Dudu/Movimento Negro Unificado e a Central Única das Favelas. Não podemos esquecer o primeiro clube de futebol da região, o Fidalgo Futebol Clube, que mais tarde daria origem ao Madureira Esporte Clube.

Em janeiro de 2019, ainda tivemos a aprovação de um projeto elaborado pelo diretor do Departamento Cultural da Portela, Rogério Rodrigues, sancionado como Lei que cria oficialmente a Área de Especial Interesse Cultural do Perímetro de Oswaldo Cruz.

Crianças Parque
(Roberta Mathias/Arquivo pessoal)

Para terminar gostaria de prestar uma homenagem e fazer dois convites. Primeiro compartilhar algumas linhas que escrevi para externar a dor de uma grande perda, assim como a morte de Dona Ivone Lara, a partida de Tia Maria do Jongo ainda é muito recente e deixa uma saudade gigantesca destas grandes matriarcas de Madureira.

Tia Maria do Jongo

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O Jongo não pode parar, pois representa uma força maior, uma ancestralidade visceral que une muito mais do que dois continentes, que ressignifica uma parte da África no Brasil.

O Jongo não vai parar, pois tem a força dos que lutam como guerreiros, santos e orixás, para resistir a tudo. Para se esquivar do cativeiro, para gingar do açoite e romper os limites das senzalas.

O Jongo tem que continuar, pois é a alma que se liga a todos nós e mantém viva a brasilidade herdada de Vovó Maria Joana, Mestre Darcy e da luz que agora emana ainda mais forte de Tia Maria.

Por hora os tambores cumprem seu luto, com a dignidade de quem reverência a passagem de uma rainha, dos que contemplam a beleza de uma existência de 98 anos de entrega. Sabemos que logo o som voltará a ecoar com o vigor necessário para unir o pé firme e as umbigadas certeiras de quem nos ensinou em vida a seguir sempre lutando.

Gratidão por ter tido o privilégio de aprender e viver os ensinamentos desta estrela em forma de pura alma, de também ter convivido com Luiza Marmello e por saber que a roda está pronta e alegrando todos do Orum.

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Por fim gostaria de convidar a todos para as Lives comemorativas do aniversário de Madureira e da cultura suburbana. Uma será realizada no dia 25 de maio, às 20 h, no canal Papo de Subúrbio do Youtube e a outra no dia 27 de maio, às 21 h, no Canal do Departamento Cultural da Portela.

Salve Madureira!

Aniversário de Madureira
(Nelson Carvalho/Divulgação)

Este texto foi feito em parceria com Ana Paula Alves Ribeiro, Professora Adjunta do Departamento de Formação de Professores e do Programa de Pós-Graduação em Educação, Cultura e Comunicação (PPGECC) da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense/ Universidade do Estado do Rio de Janeiro, e com a jornalista Sandra Crespo.

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