Os 149 anos de Vila Isabel e outras comemorações na Zona Norte
Ilha do Governador, Jacarepaguá e Andaraí também fazem aniversário no mês de setembro
O mês de setembro chega trazendo muitas histórias e importantes comemorações para grande parte dos moradores da Zona Norte. No mesmo período em que a primavera se inicia, com ares de renovação, também é tempo de rememorarmos as boas lembranças do passado.
Começamos o mês lembrando carinhosamente de Aldir Blanc, que completaria seus 75 anos, no dia 2. Brindamos em sua homenagem quando passamos pelo dia 13, Dia Nacional da Cachaça, e terminaremos o mês, aproveitando os dias mais longos propiciados pela primavera, para correr atrás dos doces de São Cosme e São Damião, que começam a ser distribuídos a partir do dia 27.
Mas setembro ainda tem muito mais a nos oferecer. Nesse mesmo mês a Ilha do Governador completou 454 anos no último dia 5 e no dia 12 foi a vez e Jacarepaguá contabilizar seus 427 anos. Nas próximas semanas, ainda teremos os aniversários de 174 anos do Andaraí e 149 anos de Vila Isabel.
Vale lembrar que a história de Vila Isabel e Andaraí se confundem e se integram a muitas regiões do entorno, ajudando a compor uma rede de sociabilidades suburbanas entre as fronteiras com Engenho Novo, Maracanã, Grajaú e Tijuca.
O próprio Aldir Blanc, um tijucano apaixonado, fez questão de publicizar suas memórias da região no livro “Vila Isabel, inventário da infância”, publicado em 1996 pela Relume-Dumara. Além de Aldir, a Vila também foi palco de nomes como Noel Rosa, Luiz Carlos da Vila e Martinho José Ferreira, que também incorporou a Vila ao seu nome.
Em 2010, no ano do centenário de Noel Rosa, o próprio Martinho da Vila fez um samba chamado “Noel a Presença do ‘Poeta da Vila'”, que virou enredo do carnaval da Unidos de Vila Isabel. Um trecho do samba diz: “A sua vida foi de notas musicais seus lindos sambas animavam carnavais. Brincava em blocos com boêmios e mulatas subia morros sem preconceitos sociais.”
Infelizmente as vésperas do seu aniversário o bairro ainda está sem a estátua, criada em 1996 pelo artista Joás Passos, em homenagem a uma de suas grandes referências. O monumento a Noel Rosa, localizado bem na entrada do Boulevard 28 de Setembro, encontra-se vazio desde abril de 2019.
Da mesma forma que muitas das famosas “Calçadas Musicais” do Boulevard estão quebradas ou sem parte de suas pedras portuguesas. O projeto que é uma marca do região foi criado em 1965 pelo arquiteto Orlando Magdalena que teve a ideia de decorar as partituras nas calçadas, tanto em comemoração a tradição musical local como para celebrar o IV Centenário de fundação da Cidade do Rio de Janeiro. São reproduções de canções antológicas, como ‘Linda Morena’, de Lamartine Babo, e ‘Carinhoso’, de Pixinguinha e Braguinha, entre outras.
Assim como Vila Isabel o Andaraí também tem uma forte ligação cultural com a cidade. Nesse ano, um projeto de lei do Vereador Marcio Ribeiro visa instituir o dia 21 de setembro no Calendário Oficial do Rio, como aniversario do bairro do Andaraí. Os professores Marcelo Sant´Anna e Fábio de Carvalho, assim como os integrantes do coletivo “Filhos do Joana”, além de outros moradores e comerciantes da reunião, consideram fundamental o reconhecimento e a institucionalização da data para a maior disseminação da história local.
Fábio nós avisa que: “O Andaraí é um dos bairros mais antigos da cidade. Seu nome provém da composição entre duas palavras indígenas, andyrá, “morcego”, e ‘y, “rio”, significando “rio dos morcegos”, na língua tupi antiga dos índios Tamoios que habitavam a região. O “rio dos morcegos”, hoje, é denominado rio Joana. Ele atravessa o bairro, dividindo as duas pistas da Rua Maxwell. Ocupado por padres jesuítas no século XVI para o cultivo de cana-de-açúcar, o antigo Andarahy era subdividido em Andaraí Grande, composto por Vila Isabel, Grajaú, Aldeia Campista e o atual Andaraí, e Andaraí Pequeno, que contemplava a região da Tijuca. Já no século XIX, o termo “Andaraí Grande” foi abolido, dando origem aos bairros de Vila Isabel, em 1873, Aldeia Campista e Grajaú, em 1912. O Andaraí é citado no livro Helena, de Machado de Assis. A primeira rua aberta no bairro foi a “Estrada do Andarahy”, em 1875, hoje conhecida como rua Barão de Mesquita.
A partir de meados do século XIX, o Andaraí tornou-se um bairro industrial, com a instalação da primeira fábrica de tecidos do Rio de Janeiro: a Fábrica São Pedro de Alcântara de Tecidos de Algodão. Em nossa concepção, não se pode falar em bairro antes de um povoamento urbano, e é a partir de 1847 que o Andaraí se tornará um bairro fabril e manterá essa característica durante boa parte do século XX. Foi na data de 28/09/1847 que Diogo Hartley, proprietário da “Fábrica São Pedro de Alcântara de Tecidos de Algodão”, obteve empréstimo do governo imperial para seu empreendimento instalado na Estrada do Andarahy. Ao lado da fábrica, foi fundado o Hospital Militar do Andarahy Grande, onde atualmente é o Batalhão Zenóbio da Costa (1º Batalhão da Polícia do Exército), localizado entre a Rua Barão de Mesquita e a Avenida Maracanã.
Outros estabelecimentos industriais e comerciais estabeleceram-se posteriormente no bairro, como América Fabril (onde atualmente localizam-se a ASBAC, a sede de Compensação Nacional do Banco do Brasil e o Núcleo Habitacional Solaris da Torre mais conhecido por “Tijolinho”), Knoll, Atkinson e a Companhia Hanseática (onde funcionou a Cervejaria Brahma até final da década de 1990, área atual do Supermercado Extra, na rua José Higino), entre outros estabelecimentos menores. Em virtude da intensa industrialização do bairro, vilas operárias foram se formando no entorno das fábricas. Atualmente muitas das moradias dos antigos operários ainda estão preservadas. Já, no século XX, o bairro deixou de lado sua virtude apenas industrial e passou a ser também um bairro residencial, com a construção de inúmeros condomínios e edifícios. Neste século também, estabeleceu-se, no bairro, o estádio do América Football Club, na Rua Barão de São Francisco (onde, em 1996, foi construído o Shopping Iguatemi).
A partir do surgimento do Estado da Guanabara, os limites do Andaraí foram reduzidos e definidos como começando na Praça Lamartine Babo, entrando pela Rua Gonzaga Bastos e subindo em toda a extensão da Rua Teodoro da Silva; dobrando na rua Barão do Bom Retiro, subindo a Rua Borda do Mato até a serra; seguindo por toda a extensão da rua Uruguai até o rio Maracanã, onde se limita com a Tijuca, só não lhe pertencendo a rua Espírito Santo Cardoso. Além disso, nos anos de 1980, a antiga associação de moradores AMARAÍ comemorava na terceira semana de setembro, a partir do dia 21 de setembro a “Semana do Andaraí”, que coincidia com o início da Primavera.”
149 anos de Vila Isabel
Vila Isabel é um dos principais símbolos de modernização da Zona Norte, considerado um dos primeiros bairros projetados da história da cidade. Seu desenvolvimento remonta as terras da Imperial Quinta do Macaco, mais conhecida como Fazenda do Macaco. A propriedade pertenceu a Imperatriz Dona Amélia Augusta Eugênia Napoleão de Beaucharnais, esposa do Imperador D. Pedro I e neta de Josefina de Beauharnais, que foi primeira esposa de Napoleão Bonaparte. Suas terras faziam limites com o rio Joana, o caminho de Cabuçu na atual rua Barão do Bom Retiro, passando pela serra do Engenho Novo.
O grande crescimento urbano de Vila Isabel se deu após uma iniciativa do empresário João Batista Viana Drummond. Ele adquiriu as terras da fazenda do Macaco e como o Barão de Drummond era um conhecido abolicionista seu projeto imobiliário previa ruas em homenagem a nomes ligados à luta pelo fim da escravidão. O principal logradouro, 28 de Setembro, é uma referencia direta data da Lei do Ventre Livre, assinada pela Princesa Isabel e que considerava livre todos os filhos de mulheres escravizadas nascidos após 28 de setembro de 1871.
Oficialmente fundado em três de Janeiro de 1872, o projeto inicial previa a abertura de 13 ruas, batizadas com nomes de personagens da história considerados abolicionistas notáveis, que se conectariam a um boulevard central aos moldes franceses. O arquiteto contratado para o projeto foi Francisco Joaquim Béthencourt da Silva, discípulo do francês Grandjean de Montign.
Em 1875, o bairro ganhou bondes que ligavam Vila ao centro da cidade e a estação de trem do Engenho Novo. A responsável pelo sistema era a Companhia Ferro-Carril de Vila Isabel, empreendimento igualmente criado por Drummond. O mesmo barão que também inaugurou o primeiro jardim zoológico do Brasil e neste mesmo local inventou o jogo do bicho, que ainda é muito popular.
Atualmente a região segue como um grande reduto do samba carioca, carrega muitas histórias além de uma atmosfera residencial e com variadas opções comerciais e boêmias. Tantas histórias e curiosidades que precisaríamos de muitas mais páginas para contar. Aos interessados, fica a dica de dois excelentes livros: “Vila Isabel de rua em rua”, escrito por Lili Rose e publicado em 2005, assim como, “Ganhou, leva! O jogo do bicho no Rio de Janeiro (1890-1960)”, de Marcos Felipe Magalhaes, lançado em 2011.