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Bazar

Leia na crônica de Manoel Carlos

Por Manoel Carlos
Atualizado em 13 ago 2017, 08h00 - Publicado em 13 ago 2017, 08h00
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  • Ninguém sai de um bazar de mãos vazias. Você pode não encontrar o que está procurando, mas alguma outra coisa — qualquer uma! — não procurada, nem mesmo desejada, há de surgir à sua frente, diante dos seus olhos. Meus filhos ficavam malucos! Eu falava:

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    — Cada um escolhe um brinquedinho, um só. Não vale bola, que temos uma dúzia lá em casa! — Eles corriam de um lado para o outro, sem saber o que levar. Dava gosto ver!

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    Raul entrou na conversa:

    — Uma vez minha mulher saiu para ir ao mercado em busca de um frasco de azeite grego e voltou com um par de sandálias Birkenstock, de fabricação alemã.

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    — Posso abrir outra garrafa?

    Era a garçonete. Estávamos no Café Severino, vindo de uma missa de sétimo dia em memória do Zé Antonio.

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    — Afinal, de que ele morreu?

    O Afonso fez aquele gesto universalmente conhecido, que indica o alcoolismo como causa da morte.

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    — Ih, essa é uma história longa e dolorosa — comentou alguém.

    Carla largou o celular em cima da mesa.

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    — Como se come bem naquela cidade!

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    — Que cidade?

    — São Paulo, pô.

    — De que você está falando?

    — Eu falava das cantinas paulistanas.

    — Do bazar!

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    — Do bazar, mas depois das cantinas do Bixiga! Uma melhor que a outra!

    — E o pão com linguiça?

    — De comer rezando!

    E outros assuntos entraram e saíram da roda, numa aparente desordem.

    — Pensei que ele não bebesse mais, que tivesse parado.

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    Parava uma vez por ano, na noite de Natal, quando se vestia de Papai Noel.

    — Caramba, não me lembrava disso!

    — Uma vez quase morreu, quando caiu dentro da caixa-d’água na casa da Nairzinha.

    — Será que eu estou com Alzheimer? Não me lembro de nada! Quem era a Nairzinha? Aquela loirinha que namorava toda a turma?

    — Aquela era a Sandrinha.

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    — Uma gostosura!

    — Já morreu também.

    — Ah, hora da saudade não vale.

    — Alzheimer não aparece assim, de uma hora para outra.

    — Aparece, sim. Com meu avô foi assim. Num dia estava legal, levantou-se da mesa enquanto a família estava almoçando na casa dele… Foi ao banheiro, voltou para a mesa e pronto. Já nem lembrava qual era o nome da minha avó.

    Abrimos uma segunda garrafa de vinho no momento em que uma garçonete colocava na mesa mais pão e mais queijo.

    Ríamos, estávamos felizes, alegres. Era a vitória da saúde sobre a morte.

    — Enterramos mais um da turma!

    O inverno ensolarado se abria sobre nós. Uma pausa para a reflexão, e Raul comentou, num tom sentimental e penoso:

    — Não gosto de estar bebendo e me divertindo com o nosso amigo morto e enterrado.

    — Cremado — falou Afonso.

    E deu uma fungada, levando o lenço ao rosto e enxugando uma lágrima.

    — De que é que estávamos falando?

    — De bazar. De como gostamos de quinquilharias.

    — Dá para mudar de assunto?

    — Claro, é pra já.

    E olhando todos à volta:

    — E o Neymar, hein?

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