Imagem Blog

Luciana Brafman

Por Luciana Brafman, jornalista e professora da PUC-Rio Materia seguir SEGUIR Seguindo Materia SEGUINDO
Economia, finanças pessoais e comportamento financeiro até pra quem não gosta
Continua após publicidade

A outra guerra

Tecnologia, conexões globais e sanções econômicas dão novo contorno à invasão da Ucrânia

Por Luciana Brafman
1 mar 2022, 20h22
Bandeira da Ucrânia: país terá desafio de reconstruir economia
Bandeira da Ucrânia: país terá desafio de reconstruir economia (Reprodução da internet/Veja Rio)
Continua após publicidade

“Mãe, vai ter Terceira Guerra Mundial?”  “Não sei, filha, acho que não.”

Ainda que minha resposta carregue uma dose de otimismo materno, realmente não acredito que a invasão da Ucrânia pela Rússia se transforme em uma guerra mundial nos mesmos moldes das duas grandes guerras do século XX.

O planeta hoje é outro, apesar do bombardeio inclemente sobre várias cidades ucranianas, enquanto homens de terno ensaiam um frágil cessar-fogo. Como bem explicou Thomas Friedman em recente análise no New York Times (We Have Never Been Here Before), o mundo não é nem será mais o mesmo.

Temos, sim, no Leste Europeu, um conflito com potencial destruidor de atrasar o mundo, como em séculos passados, mas, simultaneamente, a tecnologia e as conexões nos levam a outro tipo de guerra. É o futuro.

A economia globalizada é parte crucial desta guerra. Há alguns dias, o sistema financeiro do governo Putin foi sufocado com a suspensão da Rússia da rede Swift, Sociedade de Telecomunicações Financeiras Interbancárias Mundiais. O Swift é um sistema de comunicação que possibilita, de modo padronizado, a transferência de recursos entre empresas. O banco central russo sentiu o golpe de asfixia: os juros dispararam, o rublo perdeu valor, e uma corrida aos bancos é a cereja do bolo de um colapso financeiro. “É a economia, estúpido”, diria James Carville.

Continua após a publicidade

Nesse tabuleiro de xadrez, a preponderância das empresas é inegável. Com a hashtag #ukraine, CEOs e marcas vêm tendo mais visibilidade nas redes sociais e influência do que líderes nacionais ou mesmo a ONU, que é um dos filhotes da Segunda Guerra Mundial.

Em decisões ágeis, de cunho político, Apple Pay e Google Pay pararam de funcionar e travaram a compra de bilhetes no metrô russo, certamente gerando um impacto maior do que os monocórdicos discursos no tradicional Conselho de Segurança da ONU.

A intervenção de Elon Musk, que disponibilizou internet via satélite Starlink à Ucrânia, é também algo sem precedentes, capaz de mudar o curso de uma história. Talvez um dos simbolismos desta guerra.

Continua após a publicidade

A cada dia, multinacionais de peso boicotam negócios com a Rússia, de empresas de petróleo a automobilísticas, passando por bancos, companhias de telecomunicações e construção civil. Em outra frente de batalha, o YouTube desmonetizou canais estatais russos. O impacto dessas e de medidas similares sobre a população russa é enorme. A médio e longo prazos, pode ser tão mortal quanto as bombas que atingem inocentes em território ucraniano.

Esse contexto faz com que o assassinato de Francisco Ferdinando pareça ficção em um universo paralelo e distante. E me leva a crer que a Terceira Guerra Mundial, no sentido estrito do termo, à imagem e semelhança das outras, não vai eclodir. Isso não quer dizer que está tudo “safe”, que devemos minimizar riscos nucleares e normalizar as mortes causadas por conflitos, rebeliões e invasões – seja na Ucrânia, sejam nas centenas de guerras espalhadas pelo globo.

Mesmo sem a guerra mundial, o que está por vir não será fácil, ainda que a boa notícia do cessar-fogo chegue logo.

Continua após a publicidade

Dados do Banco Mundial mostram que a Ucrânia tinha 44 milhões de habitantes em 2020. A nação, que já foi chamada de “celeiro do mundo” pela capacidade agrícola, conta com uma forte indústria e tem destaque na produção de minério. O PIB girava em torno de US$ 155 bilhões, mas registrou recuo de 4% devido aos efeitos da pandemia de Covid-19. A inflação é uma preocupação. A guerra agrava exponencialmente tudo isso, em um país cujos gastos militares somam cerca de 4% do PIB. Não é pouco.

Distante mais de 10 mil quilômetros da Ucrânia, o Brasil também sente os efeitos da complexa guerra – e agora não se trata do envio de pracinhas. São consequências humanitárias, diplomáticas e econômicas, estas últimas registradas de imediato nos preços do petróleo. O trigo também ficará mais caro, já que tanto Rússia quanto Ucrânia estão entre os maiores produtores mundiais da commodity. No cenário atual, o aumento das incertezas atinge ainda a cotação do dólar, cuja volatilidade em um ano eleitoral já não é para principiantes.

Ruim por aqui, pior por lá. Sabemos que a Ucrânia, além de destruída territorialmente, com famílias destroçadas, chorando por seus mortos e feridos, terá o desafio adicional de reconstruir sua economia nos próximos anos.

A guerra econômica tá on. Não tem trégua.

Publicidade

Essa é uma matéria fechada para assinantes.
Se você já é assinante clique aqui para ter acesso a esse e outros conteúdos de jornalismo de qualidade.

Semana Black Friday

A melhor notícia da Black Friday

Impressa + Digital no App
Impressa + Digital
Impressa + Digital no App

Informação de qualidade e confiável, a apenas um clique.

Assinando Veja você recebe mensalmente Veja Rio* e tem acesso ilimitado ao site e às edições digitais nos aplicativos de Veja, Veja SP, Veja Rio, Veja Saúde, Claudia, Superinteressante, Quatro Rodas, Você SA e Você RH.
*Para assinantes da cidade de Rio de Janeiro

a partir de 35,60/mês

PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
Fechar

Não vá embora sem ler essa matéria!
Assista um anúncio e leia grátis
CLIQUE AQUI.