Teatro, por Claudia Chaves: “Cobras, Lagartos e Minhocas”
A interpretação de Álvaro corresponde às intenções do texto: o trajeto de um homem em busca da sua escolha


É incrível como ditados populares e gírias são capazes de traduzir sentimentos, intenções, diagnósticos — mesmo no que vai pela mente das pessoas. Às vezes, as expressões explicitam o que se faz. Cobras e lagartos é uma delas, pois se refere a criticar duramente ou espalhar maldades, mentiras, sem perdão. Já ter minhocas na cabeça são pensamentos que crescem, meio sem sentido, meio sem imaginação.

A trama da peça “Cobras, Lagartos e Minhocas”, com texto e interpretação de Álvaro Menezes e direção de César Augusto, passeia, justamente, pela metáfora do time de futebol do colégio, no qual os jogadores são divididos pela sua qualidade.
Álvaro faz um itinerário de si próprio, numa engenharia dramatúrgica que apresenta o impacto que uma peça lhe causou em um momento determinado. Como a peça “assistida” é autobiográfica — inicia-se na infância e vai até a vida adulta/presente —, incorpora uma diversidade de personagens: desde as namoradas com nomes de personagens de Nelson Rodrigues, família, amigos; em algum momento, é chamado de Nelson pela mãe.

A direção de César conduz Álvaro a um caminho seguro, a começar pela movimentação dentro do palco, no cenário desenhado como um campo de futebol estilizado. Atacante, goleiro, defesa, meio de campo — Álvaro assume seu lugar em campo de acordo com seu relacionamento com o personagem citado.
A interpretação de Álvaro corresponde às intenções do texto: o trajeto de um homem em busca da sua escolha, dos seus desejos, com episódios divertidos, cruéis, trágicos, doces, amargos, amorosos, confusos. A direção de César contribui decisivamente para que o tom, mesmo em momentos difíceis, seja leve — como se ouvíssemos a confissão de alguém próximo, que emociona, envolve, mas não é nada que nos obrigue a dizer “para de drama!”

Álvaro é bem-sucedido em falar cobras e lagartos de uns, sem exposição, sem rancor; em muitos momentos, de profunda tristeza. No entanto, a peça é o resultado de minhocas, caraminholas — com certeza desde sempre — na cabeça do personagem e na de Álvaro, que consegue superar os obstáculos, driblar a defesa e fazer um gol de placa.
SERVIÇO:
CCBB, no Centro
Até 21 de abril, segunda, quarta, quinta, sexta e sábado, às 19h; domingo, às 18h
