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Lu Lacerda

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Jornalista apaixonada pelo Rio

Psi sobre Set. Amarelo: “A vida pede cuidado químico, mas também humano”

"Nunca se falou, com tamanha intensidade, de se usar algum medicamento psiquiátrico ou se realizar terapia"

Por lu.lacerda
Atualizado em 10 set 2025, 18h56 - Publicado em 10 set 2025, 18h20
 (./Divulgação)
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A psiquiatra Maria Francisca Mauro
A psiquiatra Maria Francisca Mauro (./Divulgação)

Seja no almoço de família do domingo, seja no grupo de pais da escola, seja no trabalho, por onde circulamos, uma hora, o assunto sobre saúde mental aparece. Nunca se falou, com tamanha intensidade, de se usar algum medicamento psiquiátrico ou se realizar terapia. Contudo, os índices de satisfação das pessoas não aumentaram na mesma proporção do acompanhamento profissional.

Curioso, não? O esperado seria uma sociedade mais equilibrada quimicamente, e as pessoas mais ponderadas quanto a compreenderem seu lugar na família, bem como na sociedade. Não é o que observamos. Muitos se dizem acuados por não sentirem segurança para expressar opiniões verdadeiras, controlando o que dizem, apreensivos de serem cancelados.

Há uma certa desconfiança coletiva de que os vínculos afetivos se tornaram mais frágeis, e como se pudessem ser descartáveis — um salve-se quem puder, que não é uma questão psiquiátrica, mas um sofrimento social coletivo. Na dura realidade da sobrevivência, nua e crua, roubaram até mesmo a infância, “adultizando” alguns inocentes. O estresse está para todo lado. Ter equilíbrio e suporte nas relações é o verdadeiro privilégio.

No Brasil, entre 2008 e 2022, houve um aumento de 68,35% no número de suicídios na população economicamente ativa (18-65 anos), especialmente entre os homens (1); perdas trágicas com impacto econômico, mas para além disso, com efeitos emocionais negativos em cerca de 135 pessoas (2); um círculo de tristeza, indignação e até mesmo revolta. No silêncio da tragédia, uma parte não compreende a ação de alguém que abre mão do maior milagre, o da existência. E outros, no silêncio de si, flertam com sua vontade de se exterminar.

Há um efeito de contágio na vontade de se matar, principalmente naqueles com ideação suicida, o que acontece, em maior intensidade, nos quadros de depressão, uso descontrolado de álcool e quadros psicóticos. É necessário muito cuidado na comunicação à população sobre o suicídio, ainda mais de uma figura pública. Os mais jovens são os mais vulneráveis. Aos que se sentiram tentados a se matar, com a notícia ou convívio de alguém por suicídio, não deixem de buscar apoio emocional, questionem essa “onda emocional” ruim que está ocorrendo.

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Cuidar do desespero social dos nossos tempos passa por melhorarmos a nossa empatia e humildade de forma coletiva, além do cuidado preciso da saúde mental quando necessário. Nesse sentido, precisamos avançar na compreensão das pessoas quanto ao aspecto biológico dos quadros psiquiátricos. Se, nas doenças cardiovasculares, já avançamos nos cuidados de prevenção, ainda é um tabu analisarmos a carga familiar genética para os quadros psiquiátricos. Sabemos, na ponta língua, os casos de câncer da árvore genealógica, assim como de hipertensão arterial, diabetes ou outra doença que não tenhamos vergonha de assumir.

Quantos ousam olhar na sua história aquela avó que ficava no sofá, por semanas, sem ter forças para reagir, ou aquele irmão que brigava com todo mundo, e ninguém era digno da confiança dele. E, até mesmo, o pai trabalhador que bebia suas garrafas todo dia, se alterava na calada da noite, mas estava de banho tomado e cara amassada no café da manhã; aquele primo que dirigia constantemente completamente bêbado, inconsequente, e sofria “acidentes”, como quem vai para a sorveteria.

Há um medo de olhar para o que incomoda. O estigma relacionado aos quadros psiquiátricos ainda nos faz usarmos termos de julgamento para as pessoas que sofrem emocionalmente. Não é fácil desenvolver tolerância para as diferenças, ainda mais quando se está convivendo com a tensão de alguém em desequilíbrio emocional.

Assim, prevenir o suicídio envolve contribuir para que as pessoas entendam que os quadros psiquiátricos têm solução. Mesmo o pessimismo mais fiel, quando de origem depressiva, pode ganhar tons de uma realidade mais serena com uma prescrição precisa. Aquela encruzilhada da perda do emprego, queda de renda e perda de suporte financeiro não são o fim da linha — representam uma etapa de reposicionamento do padrão de consumo, ou seja, ter consciência financeira. Nem mesmo um luto difícil, a aposentadoria ou um divórcio são uma sentença de desesperança, pois podem significar desenvolver um novo lugar social.

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A vida é feita desses “entraves”, que podem mesmo ser traumáticos em alguns contextos, e romperem com a lógica a que havia se proposto para viver dentro de si. Para toda forma de desamparo, existe uma forma de cuidado, desde o químico até a reorganização da forma de se sentir e comportar.

Por vezes, um comportamento social mais empático já dá um conforto lascado para os que andam por aí, sem acreditar que a vida vale a pena. Foi no sorriso desconhecido, um bom-dia afetuoso, a mensagem do amigo, ou apenas voltar a dar sentido na própria vida, que aumentou a vontade de viver que estava frágil. Exercer laços sociais mais significativos, com dedicação e atenção, precisa estar no radar das nossas rotinas.

Desde 2014, a Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) realiza a campanha “Setembro Amarelo” com o objetivo de informar sobre transtornos psiquiátricos e prevenir o suicídio. Alguns pensamentos, emoções e comportamentos ultrapassam os limites do “dar conta” sozinho, para requererem estratégias de tratamento. Nada mais que se deixar de consumir por problemas, que estão sendo percebidos maiores. Cuidem-se, quando possível. Cuidem.

Onde buscar ajuda:

· CVV – 188 (ligação gratuita, 24 h por dia)

· Procure atendimento psiquiátrico e psicológico

· Converse com familiares e amigos de confiança

 Maria Francisca Mauro, psiquiatra, mestre e doutora em Psiquiatria pela UFRJ, comunicadora sobre saúde mental nas redes sociais. 

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Referências:

1. Dos Santos DP, Chaoubah A, de Oliveira HN. Epidemiology and Economic Burden of Suicide Among Brazilian Workers: Trends, Occupational Disparities, and Gender Differences. Value Health Reg Issues. 2025 Jun 5;49:101143.

2. Cerel, J., Brown, M.M., Maple, M., Singleton, M., van de Venne, J., Moore, M. and Flaherty, C. (2019), How Many People Are Exposed to Suicide? Not Six. Suicide Life Threat Behav, 49: 529-534.

3. Guimarães RM, Monteiro-da-Silva JHC. The effect of premature mortality due to despair on life expectancy in Brazil. Rev Bras Epidemiol. 2025; 28: e250039

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