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Redes sociais despertam ansiedade preocupante entre os jovens

Movida por comparações, a busca por sucesso e independência financeira meteórica pode levar a frustração

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Atualizado em 5 mar 2022, 10h46 - Publicado em 3 mar 2022, 12h13
redes sociais
Não curti: com as redes sociais, as comparações se tornaram inevitáveis e a geração que mais a consome é a que mais sente esse reflexo. (Tresnologi/Reprodução)
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Ao iniciar esse tema pensei que talvez pudesse ser injusto com os “não tão jovens”, afinal me parece claro que com a pandemia digital agravada pela original, mais trágica e fisicamente mortal, a Sars COVID 19, o mundo todo, sem distinção de idade, entrou numa espécie de colapso psicológico. Terapeutas e psicólogos nunca ganharam tão bem. Com todo mérito, diga se.

As pessoas se viram pouco, mas brigaram muito. Nunca se viu tanta animosidade e amizades desfeitas em tão pouco tempo. A tal “empatia” virou apenas hashtag de lacração.  Subestimaram uma bela palavra e banalizaram um sentimento tão abstrato quanto especial. Junte-se a isso um governo que deixa o país à deriva, extremamente doente e dividido. Pronto, taí o verdadeiro “caos perfeito”.

Voltando aos jovens, penso que são sempre eles que podem olhar pro atual cenário e fazer algo diferente, pra melhor. Por isso, estou sempre atento a essa turma. Gosto de ajudar, trocar ideias e, principalmente, de aprender com eles.

Conversando com alguns atores, percebo uma ansiedade desproporcional ao estágio na carreira e que vem se tornando comum a quase todos. Nos últimos anos, vim observando de perto e percebi diversos comportamentos preocupantes por parte deles. Posso garantir uma coisa: o Instagram pode até não ser o “mordomo”,  mas suspeito muito dele na maioria dos casos.

Aos 30 anos de idade minha vida profissional caminhava bem, mas ainda distante dos meus objetivos. Entretanto, eu não pensava no tempo ou na idade. Não se tratava de cronologia, pensava apenas em como me tornar o melhor profissional possível e ser reconhecido como um deles. Demorei a ganhar algum dinheiro, pois minha ambição sempre esteve pautada na competência diferenciada e no reconhecimento, e não em contracheques ou comissões. Isso, rapaziada, posso garantir: é consequência.

Com as redes sociais, as comparações se tornaram inevitáveis. E a geração que mais as consome é obviamente  a que mais sente esse reflexo. Como não desejar aquela viagem hollywoodiana da gata sarada com o gato-tanquinho? E aqueles hotéis?! Oh, my God!  Carro TOP, apê transado… agora esse mundo encantado visto nas redes sociais se torna objetivo de vida. Uma pena, porque toda energia, atenção e preparação que deveriam ser empregados num oficio que seja a base de uma independência financeira (e que, salvo raras exceções, é construída a longo prazo) são desviadas para gerar um feed bonito, interessante e huuum, “criativo”.

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Vivemos a era do imediatismo, da impaciência e da busca por atalhos. Áudios acelerados, cobrança por respostas instantâneas nas mensagens e workshops como solução de aprendizado. Ninguém está pronto ou sai formado em nada em 7  ou 15 dias.

Vivemos a era do imediatismo, da impaciência e da busca por atalhos. Áudios acelerados, cobrança por respostas instantâneas nas mensagens, workshops ou cursos rápidos como solução de aprendizado e por aí vai.  Existem ótimos workshops, porém são complementos de estudo. Ninguém sai formado em nada em 7  ou 15 dias.

Recebo muitos currículos, e a grande maioria possui dezenas desse tipo. São “imersões”, cursos intensivos, mas raramente têm uma formação completa em Artes Cênicas, por exemplo. Teatro? Raridade hoje em dia. A maioria parece acreditar que uma carreira se constrói no TIK TOK. Tudo porque a comparação geralmente é preguiçosa. É mais fácil e cômodo se espelhar nas exceções, naquele youtuber ou na influencer que se deram bem, do que em artistas e profissionais que pavimentaram uma longa e consagrada trajetória em seus ofícios. Não sei não, mas acho que sucesso efêmero e sem estofo é ingresso garantido em quadros como “que fim levou…” ou “por onde anda…”

Nesse processo reparei alguns aspectos curiosos. Muitos jovens que passaram a se autodenominar e atuar como “influencers” não possuem menor aptidão, carisma ou talento como tal. Por outro lado, outros menos pretensiosos são naturalmente divertidos, bons comunicadores e providos de algum talento que talvez possa ser aproveitado de alguma forma. Aliás, sempre achei o termo “influenciador” presunçoso e um tanto chinfrim. Admiro pessoas que realmente inspiram, tanto pelas atitudes e raciocínio, como por suas história de vida. A influência legítima e espontânea é muitas vezes involuntária,  fruto desse tipo de inspiração.

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Não me lembro onde, mas ouvi alguém dizer que “Influenciador” talvez venha a ser reconhecido como profissão. Incrédulo, fiquei um pouco aliviado que tal informação não veio acompanhada de “em breve”, pois espero já ter virado estrelinha se isso acontecer.

Usar as redes sociais como como extensão da profissão é válido e o melhor dos mundos quando bem utilizadas. Principalmente porque hoje, todo o lado comercial e publicitário passa por elas. O problema é que a tal almejada independência financeira não precisa ser resolvida em 2 ou 3 anos. Aqui cabe uma analogia com o esporte, que pratico com disciplina há quase três décadas. A vida não é uma corrida de 5Km, é uma maratona. Portanto, a preparação não deve ser pra chegar mais rápido, mas sim pra se sustentar bem até o final.

Já consagrados e financeiramente bem resolvidos, Simone Biles e Gabriel Medina, jovens e atletas reconhecidos, sinalizaram com a necessidade de cuidar da saúde mental. A pressão atinge todos os extremos. Entretanto, as causas se diferem. No caso dos que ainda estão buscando seu lugar no mercado, sugiro que fiquem longe de comparações, sobretudo nas redes sociais. O que vejo nos bastidores desse Mundo de Alice dava pra escrever um livro, tamanho o nível de paradoxos e irrealidades.

Diante de todo esse cenário, atualmente tem sido cada vez mais constante a necessidade de conversar com alguns atores sobre tempo, carreira e estabilização financeira. As referências atuais que eles possuem são péssimas e sólidas que nem pudim. Proponho sempre que reflitam no que eles podem vir a se tornar, ao invés da obsessão pelo “ter” ou parecer que tem. Uma construção sólida demanda tempo e muita dedicação (olha a maratona aí…).

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Meu primeiro carro (a gente nunca esquece) eu consegui comprar aos 30 anos. Era um Fiat Tipo modelo 1994. E que conquista!  Aliás, a minha primeira viagem a NY deve ter sido nessa época também. Não fui à Disney quando era criança, e nem por isso fui menos feliz que meus colegas abastados da escola. Eles se reuniam no recreio pra mostrar a viagem naqueles pequenos álbuns de foto e ficava nisso, a vida seguia normal.  Hoje, com o Instagram, a criança (ou adolescente) acorda, olha o feed e tem a sensação de que o mundo acordou no Castelo do Mickey, menos ele. Como ser feliz assim, não é mesmo? Já meu apartamento veio entre os 35 e 40 anos. Com calma, pensado e com critério. Nada faraônico, porém do meu jeito e gosto. Naquela altura, estava bem estabilizado para dar tamanho passo.

Hoje percebo jovens de 20 poucos anos ávidos por carro do ano, casa instagramável e viagens trimestrais às Ilhas Virgens, como se isso fosse o verdadeiro sentido de realização.

Claro que os tempos são outros, as oportunidades e caminhos são diversos e as chances aumentaram. Entretanto, nada supera a velha e segura competência.

No mais, é como dizia Dona Maria José:  “Calma na América! Vá estudar, vá trabalhar, Carlos Henrique! Seja alguém de valor, meu filho”.

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Obrigado, vó.

 

Ike Cruz é empresário artístico, fundador e diretor do Actors & Arts

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