O estresse do isolamento
Para evitar a contaminação na rua, as pessoas estão ficando doentes em casa
Em recente coletiva à imprensa, o governador de Nova York, Andrew Cuomo, apresentou informações surpreendentes sobre a contaminação do coronavírus a partir de dados coletados dos doentes no Estado americano. Ele afirmou que 66% das internações hospitalares correspondem a pacientes que estavam de quarentena em suas casas. E mais: 90% não estavam trabalhando ou o faziam de casa, sem necessidade de pegar transporte público.
Essas informações contradizem muitos argumentos dos que defendem o isolamento absoluto. A interrupção brusca da rotina compromete o funcionamento regular do sistema imunológico. Para além disso, o cérebro humano no confinamento entra em “ebulição”, tomado por medo e incertezas: estresse, ansiedade, insônia, pânico, abuso de álcool, crises hipertensivas e infartos do miocárdio. O fato concreto é que para evitar se contaminarem na rua, as pessoas estão ficando doentes em suas casas.
É inegável que muitos sofrerão de estresse pós-traumático em decorrência da pandemia, seja por perderem entes queridos em suas casas, a caminho de socorro ou internados nos próprios hospitais. O estresse pós-traumático é um distúrbio da ansiedade caracterizado por um conjunto de sinais e sintomas físicos, psíquicos e emocionais em decorrência de o portador ter sido vítima ou testemunha de atos violentos ou de situações traumáticas que, em geral, representaram ameaça à sua vida ou à vida de terceiros.
Como a prevenção é o melhor aliado da saúde, temos trabalhado em nossas clínicas regularmente depois de, claro, adotar todas as medidas de segurança contra o vírus, para os nossos colaboradores e clientes. Isto nos permitiu tabular uma pesquisa feita com os 300 clientes que realizaram seus exames preventivos durante o mês passado. Alguns números chamam a atenção, se compararmos com os dados pré-pandemia: a insônia passou de 23% da população examinada para 35%; níveis estresse elevados, de 65% para 87%; ansiedade saltou de 18% para 36%; a automedicação, de 12% para 29%, hipertensão arterial, de 21% para 29%. Isso se explica pela qualidade de vida no isolamento, período em que as pessoas se tornaram muito sedentárias, têm se alimentado mal e estão com dificuldades para dormir.
Concordo plenamente com o governador de Nova York. Tenho insistido que quando acabar o isolamento, metade ou mais da população estará imunizada. Com regularidade, tenho atendido muitas famílias que apesar de estarem em casa, apresentam os sintomas da doença. O que o governador americano aponta sobre o comportamento lá é o que pode acontecer aqui, por exemplo, com moradores de Copacabana e outros bairros muito populosos e povoados por idosos com comorbidades: de casa direto para o hospital.
Diante desse cenário, a medicina preventiva se impõe. Não há porque alguém se surpreender com uma doença que pode ser diagnosticada precocemente. Em meio à pandemia do coronavírus e em face ao isolamento, cuidar da saúde é ainda mais imprescindível, principalmente em relação a doenças crônicas, que aumentam o risco de a pessoa contaminada ter mais complicações, como diabetes e hipertensão e que atingem, respectivamente, 9,8% e 31,2% da população da cidade do Rio de Janeiro, segundo o Ministério da Saúde.
O mundo tem exigido um olhar atento à saúde. É preciso não descuidar da higiene pessoal, mas também é preciso fortalecer o corpo e a mente: incorporar à rotina hábitos saudáveis e valorizar o tempo em família. Leitura e jogos são exemplos de passatempos simples e que ajudam a ocupar a cabeça.
Estar com o check-up em dia é outro importante aliado, pois traça um perfil detalhado da saúde, indicando as necessidades específicas para cada indivíduo. O ditado “é melhor prevenir do que remediar” nunca se fez tão verdadeiro. Adotar um estilo de vida saudável é uma forma de combater a doença. Se já era uma atitude a ser perseguida em todas as fases da vida, agora ela é uma real necessidade de saúde pública.
Gilberto Ururahy é médico há 40 anos, com longa atuação em Medicina Preventiva. Em 1990, criou a Med Rio Check Up, líder brasileira em check up médico. É detentor da Medalha da Academia Nacional de Medicina da França e autor de três livros: “Como se tornar um bom estressado” (Editora Salamandra), “O cérebro emocional” (Editora Rocco) e “Emoções e saúde” (Editora Rocco).